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Venezuelanos atravessam a Ponte Internacional Simon Bolívar na fronteira entre a cidade colombiana de Cúcuta e a cidade venezuelana de Tachira, 5 de fevereiro |  RAUL ARBOLEDA / AFP
Venezuelanos atravessam a Ponte Internacional Simon Bolívar na fronteira entre a cidade colombiana de Cúcuta e a cidade venezuelana de Tachira, 5 de fevereiro| Foto:  RAUL ARBOLEDA / AFP

O mundo foi pego de surpresa há algumas semanas, quando manifestantes inundaram as ruas da Venezuela. Mas a verdade é que isso não foi uma surpresa – os sistemas político e econômico da Venezuela entraram em colapso nos últimos quatro anos. Como resultado, 3 milhões de pessoas – quase 10% da população – deixaram o que já foi o país mais rico da América do Sul. Isso é o triplo do número de refugiados sírios que fugiram para a Europa e maior do que qualquer outra crise de refugiados que acontece hoje.

Notavelmente, a vizinha Colômbia abriu suas fronteiras para recebê-las – a uma taxa de quase 40.000 por dia. A maioria compra alimentos ou medicamentos e volta para a Venezuela, mas todos os dias, 5.000 decidem ficar na Colômbia ou em outros países sul-americanos. Enquanto mais de um milhão de venezuelanos cruzaram para outros países, o maior número – aproximadamente 1,2 milhão – agora vive na Colômbia, que já tem 7 milhões de deslocados internos, o número mais alto do mundo, resultado de uma guerra civil com décadas de duração. 

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Ao longo desta crise, há algo que as manchetes não captaram: uma geração inteira de crianças está enfrentando traumas graves. Uma das tragédias do êxodo venezuelano é que o número de separações familiares – pais separados dos filhos – é cinco vezes maior do que na maioria das situações de refugiados. Se quisermos evitar uma espiral descendente contínua, é hora de a comunidade internacional fazer com que as crianças – sua educação, saúde e segurança – sejam parte de sua primeira resposta em todas as crises humanitárias. A Colômbia é o lugar para começar. 

Ao abrir suas fronteiras, a Colômbia proporcionou aos refugiados venezuelanos acesso a seus sistemas de saúde e educação. No entanto, os números são grandes demais para que as comunidades colombianas possam enfrentar esse desafio sozinhas. O compromisso exemplar da Colômbia merece reconhecimento global. Mais importante, representa uma oportunidade única para a comunidade internacional de doadores aumentar seu apoio a uma abordagem integrada para crianças e famílias que irá salvar vidas e ter impacto de longo prazo. 

Múltiplos traumas

Durante nossa visita à cidade fronteiriça de Cúcuta há duas semanas, tivemos a oportunidade de conversar com crianças e famílias que participam dos programas humanitários do Comitê Internacional de Resgate. As crianças que conhecemos estão passando por múltiplos traumas. Elas estão com fome e com medo. Elas estão frequentemente doentes e desnutridas. Muitas foram separadas de suas famílias e perderam meses ou anos de escola. 

Apesar das políticas generosas da Colômbia, cerca de metade das crianças venezuelanas que vivem no país não está na escola. A Colômbia simplesmente não consegue lidar com os grandes números de pessoas que atravessam a fronteira. Nós falamos com autoridades locais que estão implorando por ajuda. Os professores precisam de recursos adicionais para integrar tantos novos alunos, e os pais que têm a sorte de encontrar uma sala de aula para seus filhos não podem pagar por uniformes, suprimentos e transporte. Crianças venezuelanas contaram que são vítimas de bullying por estudantes colombianos – e mesmo assim querem ir à escola porque sabem que a educação é sua única chance de uma vida melhor. 

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O poder da educação para proteger as crianças e ajudá-las a se recuperar durante uma crise é bem documentado. As pesquisas mostram que, quando as crianças experimentam uma adversidade severa e prolongada, o desenvolvimento de seu cérebro é interrompido, tornando mais difícil para eles aprender e crescer para serem membros produtivos da sociedade. 

Menina venezuelana brinca em acampamento informal de migrantes em Bogotá, Colômbia, setembro de 2018 Nicolo Filippo Rosso / Bloomberg

Pesquisas também mostram que as crianças são resilientes. Elas podem se recuperar quando têm um ambiente estável e seguro. As escolas são frequentemente o único lugar onde as crianças refugiadas estão seguras e podem ter esperança. E essas crianças estão desesperadas pela chance de aprender. Como Urimare, de 15 anos, nos disse: "Não é fácil, mas eu estou indo para a escola com todo o esforço do mundo". 

Apesar do fato de a educação ser um direito humano fundamental, segundo as Nações Unidas, ela raramente é uma prioridade humanitária. Apenas 2% da assistência humanitária em todo o mundo vai para a educação – na Colômbia, o montante é inferior a 1%, menos do que qualquer outro setor. Isso deve mudar. 

A educação é uma tábua de salvação, não um luxo. Não podemos continuar a sacrificar gerações de crianças enquanto esperamos por soluções políticas para conflitos intratáveis. Na Colômbia, temos a chance de acertar isso. Trabalhando com comunidades na Colômbia, a comunidade humanitária internacional pode criar um modelo para assistência futura, um sistema em que refugiados e crianças locais – colombianos e venezuelanos – possam aprender e crescer juntos para construir um futuro próspero para a América Latina. 

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Caroline Kennedy é superintendente do Comitê Internacional de Resgate (IRC). Sarah Smith é diretora sênior de educação do IRC.

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