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O narcotráfico está tão enraizado na história do México e nas suas relações geopolíticas que transborda para as produções culturais.
O narcotráfico está tão enraizado na história do México e nas suas relações geopolíticas que transborda para as produções culturais.| Foto: Reprodução Youtube

El Chapo tinha contatos
Com narcos colombianos
E traficava a droga
Da América do Sul
Ao norte do continente
Onde havia mercado

Enormes importações
Detectaram a heroína
Que vinha da Tailândia
Pronta para ser distribuída
Nos países da Europa
E da América Latina

(Tradução livre da composição de Mario Quintero Lara)

Esse trecho faz parte de um “narcocorrido”, um estilo que funciona como tributo musical aos barões das drogas. É a mistura do gênero musical mexicano “corrido”, criado no século 18, com letras que contam histórias de traficantes, às vezes com detalhes que nem os boletins da polícia conhecem.

O narcocorrido citado acima, de Mario Quintero Lara, trata da história do ex-traficante de drogas Joaquín “El Chapo” Guzmán, que, nesta semana, pediu ajuda ao presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, diante do “tormento psicológico” que afirma estar sofrendo na prisão nos Estados Unidos, onde cumpre prisão perpétua.

“El Chapo”, que já foi uma das pessoas mais ricas do mundo, chefiava o cartel do norte do México e se tornou um dos principais fornecedores de drogas para os Estados Unidos. Em 2009, entrou na lista da Forbes das pessoas mais ricas do mundo, na posição 701, com uma fortuna estimada em US$ 1 bilhão.

O ex-chefe do tráfico é acusado de ajudar a transportar toneladas de cocaína para os EUA, de conspirar para produzir e distribuir heroína, metanfetamina e maconha, além de matar e mandar matar pessoas.

Guzmán ficou famoso por fugir duas vezes da prisão no México e conseguir evitar ser preso repetidamente, até que foi detido em 2016 e condenado à prisão perpétua em 2019.

A guerra contra as drogas no México, que coloca autoridades contra traficantes, já matou mais de 100 mil pessoas em uma década e é tema desse subgênero musical do corrido mexicano, cada vez mais popular no país, também chamado de “balada do norte”.

As músicas com letras que descrevem o universo do narcotráfico mexicano ganharam evidência no mundo com as séries de televisão Breaking Bad, Narcos, La Reina del Sur e El Chapo.

O trio Los Cuates de Sinaloa, por exemplo, ganhou notoriedade com o tema Negro y Azul, um narcocorrido em homenagem ao personagem Walter White (Heisenberg), protagonista da série Breaking Bad. A música batiza um capítulo e aparece logo na abertura. O cantante Gabriel Berrelleza conta a história de como “WW” conquistou seu reinado no mundo do narcotráfico. “O cartel está em polvorosa, por causa da falta de respeito/Falam de um tal Heisenberg, que agora controla o mercado/Nada se sabe dele, pois nunca o viram/Da fúria do cartel, ninguém nunca escapou/Esse parça já está morto, mas ainda não o avisaram”, diz a tradução livre de um dos trechos da música.

Cultura do narcotráfico 

O narcotráfico está tão enraizado na história do México e nas suas relações geopolíticas que transborda para as produções culturais.

Além dos narcocorridos, existem outras manifestações sobre o tema. Em novembro do ano passado, o prefeito da cidade natal do traficante mexicano Joaquín “El Chapo” Guzmán revelou considerar abrir um museu do narcotráfico, na esperança de atrair turistas para a área.

O museu, na cidade de Badiraguato, no Estado de Sinaloa, no noroeste do México, poderia contar as histórias de vários líderes do tráfico de drogas que nasceram na região, que é o coração do poderoso Cartel de Sinaloa, segundo informou o jornal mexicano Reforma.

Usar o narcotráfico como tema de manifestações artísticas e turísticas divide opiniões.

“É preciso desmistificar alguns preconceitos. Na verdade estamos falando da produção, da distribuição, da comercialização e do consumo de substâncias entorpecentes que foram consideradas ilícitas em certo contexto histórico-geográfico”, aponta Mariel Muraro, especialista no assunto e professora de Direito Penal do UniCuritiba.

Ela cita a autora Rosa Del Olmo, no livro “A face oculta das drogas”, ao argumentar que a forte presença de imigrantes mexicanos nos Estados Unidos é um dos maiores motivadores das restrições às drogas no país, como pretexto para expulsar de terras americanas os originários do México. Isso teria contribuído para a imagem internacional que se faz do narcotráfico e de sua relação com a América Latina.

Mariel acredita que é importante que a cultura se aproprie do tema, uma vez que “o narcotráfico faz parte da história dos mexicanos e deve ser amplamente debatido pela sociedade em geral”.

Já Robervani Pierin do Prado, também especialista em Direito Penal, professor e coordenador do curso de Direito do Centro Universitário Integrado de Campo Mourão, declara que homenagens culturais ao narcotráfico são incentivo ao crime. “Passa a ideia de que o narcotráfico é algo positivo e que pode agregar à sociedade”, observa.

“Por mais que faça parte da história, continua sendo um crime nefasto e com efeitos deletérios”, destaca Prado. 

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