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| Foto: MATTHEW WOODSon

"Nova York não era uma simples cidade", escreveu Joan Didion em seu famoso ensaio de 1967, "Goodbye to All That" ("Adeus a tudo aquilo", em tradução livre), explicando por que abandonou seu lar adotivo em Nova York, aparentemente para sempre, aos 29 anos. "Ela era mais uma ideia infinitamente romântica, o nexo misterioso de todo o amor, dinheiro e poder, o próprio sonho brilhante e perecível".

Didion, que era originalmente da Califórnia, fez mais do que apenas capturar, e explodir, a permanente imagem da jovem escritora apostando tudo para ter sucesso em Nova York. Ela criou um novo clichê literário: o escritor já nem tão jovem batendo em retirada da cidade, mas transformando a rendição em um triunfo literário com um ensaio "Adeus a Tudo Aquilo, De Novo".

Desde que Didion definiu o padrão, o ensaio "Adeus a New York" tornou-se um popular passo na carreira para aspirantes a escritores.

O ensaio ganhou nova vida nos últimos tempos, conforme uma nova geração de escritores desvenda seu relacionamento de amor e ódio com a cidade de forma pública. Recentemente, formadores de opinião como Andrew Sullivan e David Byrne redigiram ensaios bastante debatidos sobre o tema "Nova York acabou"; escritores da geração Y vêm lançando despedidas sem muito afeto à cidade em blogs como Gawker e The Cut; e mais de uma dúzia de escritores publicou elegias a sua ambivalência sobre Nova York em "Goodbye to All That: Writers on Loving and Leaving New York" (Adeus a tudo isso: escritores entre o amor e a partida de Nova York, em tradução livre), antologia publicada em outubro passado.

"Se conseguir dar certo aqui, você o conseguirá em qualquer lugar, diz a canção", escreveu Sullivan em uma coluna do jornal "Sunday Times" de Londres, explicando sua decisão de deixar Nova York após apenas um ano. "Mas por que alguém quereria dar certo aqui? Os seres humanos ficam amontoados uns sobre os outros em enormes torres, que criam cavernas estreitas e sombrias entre elas. O tráfego engarrafado compete com todo ruído concebível e toda variação imaginável sobre o tema da raiva e impaciência humanas".

À primeira vista, os textos contemporâneos do gênero costumam seguir o mesmo arco do ensaio de Didion. Basicamente, são histórias clássicas de femme (ou homme) fatale, com Nova York como substituta do amor. "Nenhum homem podia competir, em minha mente, com a sedução de uma noite de verão em Greenwich Village", escreveu Hope Edelman em "You Are Here", sua contribuição à antologia.

Ao enquadrar o relacionamento como um caso de amor, o livro faz a inevitável separação com a capital literária parecer menos um fracasso de carreira, e mais um amadurecimento após uma paixão juvenil.

"Em meus vinte e poucos anos, eu achava que minha vida podia ser um grande experimento, e mais perto dos trinta estou me acostumando com o fato de que não, minha vida é na verdade a minha vida", escreveu Chloe Caldwell.

Colocando dessa forma, Caldwell ecoou a descrição de Didion sobre como ela racionalizou a mudança que ela e o marido fizeram para Los Angeles: "Falo sobre como seria difícil ‘arcarmos’ com a vida em Nova York atualmente, sobre quanto ‘espaço’ precisamos. No entanto, o que quero dizer é que eu era muito jovem em Nova York, e que em algum ponto o encanto se quebrou, e já não sou mais tão jovem".

Para Didion, em outras palavras, dinheiro era apenas uma desculpa. A realidade era que, na Nova York relativamente barata da década de 1960, até mesmo um funcionário júnior da "Vogue" conseguia pagar por um apartamento em Manhattan com vista para a ponte, e pagar por táxis e festas onde seria possível ver "novas caras". Claro, os primeiros dias eram difíceis, mas no geral, ela conseguiu se bancar por tempo suficiente para determinar quando havia permanecido por "tempo demais na Feira".

O mesmo não se aplica aos atuais candidatos a Didion. Na sua Nova York, os apartamentos com vista para a ponte costumam ficar com os operadores de ações. E o dinheiro não está apenas afastando os escritores; ele está mitigando ideias, de acordo com Sullivan. "Se acha que encontrará estímulo intelectual, você está imaginando outros tempos", escreveu ele.

Com os aluguéis aumentando, adiantamentos de livros encolhendo e revistas fechando, Nova York pode não mais ser um destino necessário para o jovem escritor, reconheceu Sari Botton, que editou a antologia.

Em uma era mais inocente, ao que parece, os escritores escolhiam o momento na vida em que estavam prontos para entregar à cidade sua carta "Querido John". Hoje em dia, a probabilidade é que Nova York os expulse antes disso.

Talvez a próxima antologia se chame simplesmente "Já Vai Tarde".

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