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A pistola disparou quatro tiros em um bloco de gelatina. Cada bala de 9 mm perfurou profundamente a substância, que imitava a densidade de um corpo humano. Para os especialistas do Ministério do Interior austríaco que realizavam o teste, aquilo foi um sinal claro: tratava-se de uma arma letal.

Mas não era uma pistola qualquer. Os funcionários haviam baixado os esboços digitais da arma pela internet e a "imprimiram" numa impressora 3D, vendida on-line por apenas US$ 1.360. Para produzir a pistola, as autoridades austríacas precisaram de 30 horas e de US$ 68 em polímero plástico, moldado camada a camada.

"Nosso interesse era ver se a fabricação de uma arma funcional usando essa tecnologia seria possível", disse Karl-Heinz Grundböck, do ministério austríaco do Interior. "A resposta foi um ‘sim’ muito claro."

Órgãos policiais de toda a Europa estão em alerta por causa da proliferação na internet de softwares que podem ser usados para produzir armas em impressoras 3D. A polícia teme que seja apenas questão de tempo até que tais armas sejam usadas em episódios de violência.

Em maio, o estudante de direito Cody Wilson, do Texas, publicou na internet seu projeto para uma pistola a ser impressa em 3D. Os arquivos desse projeto foram baixados mais de 100 mil vezes antes que o Departamento de Estado dos EUA exigisse que eles fossem retirados do ar.

A Espanha liderou o ranking de downloads, seguida por Estados Unidos, Brasil, Alemanha e Reino Unido. Uma versão completa da arma, chamada Liberator, foi exibida em setembro no Victoria and Albert Museum, em Londres.

Apesar da tentativa de bloqueio do Departamento de Estado, os modelos do Liberator de Cody continuaram a se espalharam em sites como o Pirate Bay. Houve recentemente relatos de pessoas burlando detectores iguais aos dos aeroportos com armas de plástico impressas em 3D, cujos únicos componentes metálicos são percutores não maiores do que um prego curto comum.

Embora a tecnologia exista como processo industrial desde a década de 1980, só recentemente ela se difundiu, com a chegada de impressoras a preços acessíveis para o consumidor.

Segundo a Wohlers Associates, empresa de pesquisas para impressão 3D com sede em Fort Collins (Colorado), 35.508 impressoras pessoais desse tipo foram vendidas no mundo todo no ano passado, uma alta de quase 50% em relação a 2011.

A maioria foi adquirida por aficionados, adeptos da bricolagem, estudantes de engenharia e instituições educacionais, segundo Terry Wohlers, presidente da empresa.

Os modelos de armas evidentemente melhoram a cada mês. As primeiras versões do Liberator podiam ser disparadas apenas algumas vezes antes que o cano precisasse ser substituído, mas em agosto apareceu no YouTube um vídeo que aparentemente mostra um rifle impresso em 3D, chamado Grizzly 2.0, fazendo dez disparos com sucesso.

A fabricação de armas usando impressoras 3D já é proibida por uma portaria da União Europeia aos países membros. Fiscalizar o cumprimento da regra, no entanto, pode ser algo desafiador.

Muitos adeptos da tecnologia de impressão em 3D estão céticos quanto à real ameaça dessas armas de fogo, no entanto. Uma amostragem dos fóruns de discussão de entusiastas do 3D mostra um cinismo generalizado sobre a capacidade dessas armas.

"Imprimir uma arma ou uma faca em 3D é o mesmo que fabricar um carro de queijo —simplesmente não vai funcionar", escreveu alguém que se identifica como "thejollygrimreaper" no fórum RepRap, uma das maiores comunidades on-line sobre impressão em 3D.

Um membro do fórum RepRap que se identificou como um estudante finlandês de 21 anos, morador de Tampere, disse que conseguiu imprimir uma pistola que funcionava e a estava testando. O chassi da arma "ficou com uma rachadura após um só tiro", afirmou ele. "Nenhuma pessoa sã voltaria a dispará-la novamente."

Talvez não seja necessário.

"Mesmo que essas armas possam disparar apenas um par de tiros, elas mesmo assim podem ter um efeito letal", disse Michael Brzoska, diretor do Instituto de Pesquisas da Paz e da Segurança, da Universidade de Hamburgo.

"E você pode facilmente fabricar várias delas."

Colaborou Christina Hess, de Nova York

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