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 | JOSH COCHRAN
| Foto: JOSH COCHRAN

Numa noite recente, no Brooklyn, 12 pessoas na casa dos 20 e 30 anos foram a um espaço comunitário onde um xamã colombiano as esperava. Elas assinaram um termo de responsabilidade e receberam grandes recipientes de plástico para vômito.

Em seguida, cada pessoa se levantou para receber uma xícara de líquido espesso e amarronzado, com sabor de ervas.

Era o chá de ayahuasca, infusão alucinógena amazônica que os participantes esperavam que lhes proporcionasse iluminações pessoais, por meio de alucinações óticas e auditivas.

Depois de beber o chá, aguardaram no escuro, à luz de uma vela. O xamã tocou instrumentos tradicionais de cordas e sopros e entoou melodias rituais.

Uma participante se acomodou para a "viagem", que duraria a noite inteira e para a qual havia pago US$ 150.

Seguindo instruções recebidas por e-mail, ela tinha passado vários dias sem álcool, carne vermelha, alimentos condimentados, queijo forte e televisão. Tinha se abstido de sexo e não estava tomando antidepressivos.

Seria sua segunda experiência com a ayahuasca desde fevereiro, um mês após a morte de seu marido, que era peruano. A participante tinha tomado o chá em Lima alguns anos atrás. Ela pediu anonimato para não prejudicar seu trabalho como professora universitária em Nova York.

"Este é um momento de transição para mim, e quero me manter aberta", tinha dito na noite anterior. "Para mim, a ayahuasca é uma viagem de purificação psicológica."

Ela não é um caso isolado. Em um mundo cada vez mais dominado pelo tempo passado diante de telas, não pelo tempo de sonho, muitas das mesmas pessoas que praticam ioga e meditação há anos procuram um catalisador mais dramático para seu crescimento interior.

Mas aquelas que atestam a utilidade da ayahuasca (muitas dizem que é como fazer dez anos de terapia em uma noite apenas) também avisam que o chá precisa ser tratado com seriedade. Descrevem as experiências que vivem sob a influência dele como "trabalho" porque, além de fazê-las vomitar e às vezes ter diarreia, podem ser assustadoras.

"A ayahuasca precisa ser usada com cuidado, mas promove uma boa conexão mente-corpo", disse Rick Doblin, da Associação Multidisciplinar de Estudos Psicodélicos, em Santa Cruz, Califórnia, e doutor em política pública pela Universidade Harvard. "Você tem uma sensação de iluminação interior no cérebro."

Ou, como disse William Burroughs em carta a Allen Ginsberg incluída no livro "The Yage Letters", sobre sua experiência com ayahuasca no Panamá, em 1953, "tive primeiro uma sensação de sabedoria serena, de modo que me contentei em ficar sentado ali por tempo indeterminado".

A julgar por sites na internet, livros e conferências, o interesse pela ayahuasca —um chá feito com a mistura de duas plantas amazônicas, uma delas um cipó e outra uma folha— vem crescendo. Juntas, as duas plantas contêm DMT e inibidores da monoamina oxidase, que promovem visões psicodélicas e euforia.

Ayahuasca ganha popularidade nos Estados Unidos

Pesquisadores estudam se a ayahuasca poderia ser usada para ajudar pessoas a se libertar da dependência de muitas substâncias, desde cigarros e álcool até metanfetaminas. A ibogaína (substância derivada da casca de uma árvore africana, com propriedades psicoativas e proibida nos Estados Unidos), é usada em outros países, entre eles Canadá, México e Nova Zelândia, para combater a dependência de heroína.

"Trata-se de um composto fascinante. Há muito a ser aprendido com seus efeitos", disse o psiquiatra Charles Grob, do Centro Médico Harbor-U.C.L.A., na Califórnia, que ajudou um estudo realizado no Brasil na década de 1990 que vinculou transformações positivas entre dependentes de álcool e drogas com o uso da ayahuasca. Mas ele se apressa a citar os perigos do chá ao lado de seus aspectos positivos.

"Quando é usada com antidepressivos, gera um excesso de serotonina no sistema nervoso central, podendo provocar confusão e tremores", disse ele. "E pode afetar a função cardiovascular de pessoas que já têm problemas cardíacos." Também há riscos de efeitos adversos entre pessoas com problemas psicológicos como bipolaridade ou esquizofrenia.

"Tudo depende da preparação e do ambiente", disse Grob. "Se o indivíduo está preparado, tendo seguido as restrições médicas e alimentares prévias, e tem a experiência com a ajuda de um facilitador informado sobre a ayahuasca, como um xamã tradicional, ela é relativamente segura."

A popularidade crescente da ayahuasca vem aumentando a cobiça e os problemas. Muitos turistas vão à região amazônica brasileira e peruana, onde a ayahuasca é vista como um remédio tradicional e legal, para participar de cerimônias. A maioria destas é promovida em retiros na floresta conduzidos por xamãs legítimos que fazem uma avaliação prévia da estabilidade física e mental dos candidatos e têm experiência em lidar com reações psicológicas graves.

Mas, cada vez mais, escreveu Kelly Hearn em 2013 no "Men’s Journal", uma visita de turistas da ayahuasca à Amazônia pode virar um pesadelo, e "alguns deles nem chegam a voltar para casa". Além da avaliação insuficiente de problemas médicos preexistentes, infusões mal misturadas ou o uso de outra planta mais perigosa, o toé (datura), vêm contribuindo para as reações graves. Também já houve casos de abuso sexual.

Os efeitos benéficos do uso da ayahuasca podem ser profundos. O psiquiatra Eduardo Gastelumendi, de Lima, recorda o que ouviu de um paciente que tinha uma reação problemática e distante com seu pai. Sob o efeito do alucinógeno, o paciente teve uma visão em que o abraçava. Alguns dias depois, ele bateu na porta de seu pai, o abraçou, e eles se reconciliaram, entre lágrimas.

"[O chá] lhe abriu as portas para uma experiência transformadora", disse Gastelumendi, que também é psicanalista. "Com a ayahuasca, a empatia é intensificada e você enxerga as coisas sob nova luz."

Na cerimônia com ayahuasca no Brooklyn, depois de tomar uma segunda dose da infusão e de regurgitar violentamente (algo frequentemente descrito como a expurgação), a mulher que tinha perdido o marido recentemente estava começando a ter visões.

"Foi como uma colagem ou um quebra-cabeça de palavras, tão brilhante quanto um letreiro LED na Times Square", contou no dia seguinte. "Foi muito belo, mas as únicas palavras que consegui decifrar foram ‘desfrute a vida’." Ela achou que podia ser uma mensagem de seu marido morto. Pouco depois disso, o xamã a despertou, junto com o resto do grupo, e já era manhã no Brooklyn. A mulher recebeu um abraço ritual e compartilhou experiências alucinógenas com outras pessoas.

Um homem no grupo parecia desorientado, falando da descoberta de que tudo o que está escrito no papel é mentira. Outros falaram de visões e insights mais suaves. Então a mulher voltou para Manhattan com duas amigas que a tinham acompanhado.

Uma das amigas não tinha muita certeza do que tinha acabado de vivenciar. "Foi bacana, mas o que eu aprendi com isso?", perguntou.

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