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Beduínos que integram as Forças Reais do Deserto, em Wadi Rum, na Jordânia | Warrick Page/The New York Times
Beduínos que integram as Forças Reais do Deserto, em Wadi Rum, na Jordânia| Foto: Warrick Page/The New York Times
  • Os dirigentes jordanianos forjaram laços com os beduínos, assegurando sua lealdade à monarquia num país que é 80% ocupado por desertos pouco habitados

Amarrados no terreno arenoso ao lado do quartel, perto das picapes e do buggy usado nas dunas, estão outros importantes equipamentos usados na aplicação da lei neste ameaçador vale desértico: oito camelos carrancudos e mastigando interminavelmente.

Seis desses animais altaneiros são selados regularmente e usados pela polícia local no patrulhamento de áreas montanhosas ou em exibições para turistas. Os outros dois são camelos de corrida puro-sangue, machos, mantidos na área para fornecer outro tipo de serviço.

"Qualquer morador que desejar trazer sua camela aqui pode vir", disse o tratador Kayed Nasser. "É um serviço gratuito que fornecemos aos cidadãos."

Esta é a guarnição local das Forças Reais do Deserto da Jordânia, subordinadas à força nacional de polícia. Seus 4.000 homens são responsáveis pelo patrulhamento das áreas desérticas esparsamente povoadas que cobrem quatro quintos desta monarquia do Oriente Médio.

A força descende de um corpo militar com camelos fundado nos anos 1920, quando a Grã-Bretanha, que possuía um mandato para administrar a área, separou a região chamada Transjordânia da Palestina, formando a atual Jordânia. Hoje, as patrulhas a camelo são uma parte pequena, mas importante, dos esforços para apanhar contrabandistas, rastrear carros roubados e evitar que rixas familiares terminem em assassinatos. Os agentes provêm de tribos beduínas da Jordânia, o que significa que sabem como operar no deserto e como transitar pelos intrincados códigos sociais de centenas de milhares de beduínos que vivem nessas áreas.

"O filho da cidade não sabe como interagir com o beduíno que vive no deserto", disse o capitão beduíno Enad al-Jazi, subchefe da guarnição de Wadi Rum. "Nós sabemos", afirmou.

A composição da força também ilustra um fator que tem ajudado a manter a relativa estabilidade da Jordânia. Através de sua história, a monarquia jordaniana não só manteve um bom relacionamento com as tribos do país como também as incorporou na estrutura do Estado, ao recrutar amplamente seus membros para o Exército e os serviços de segurança, segundo analistas.

Isso tem a ver com o passado da Jordânia, que deixou seus oito milhões de cidadãos divididos entre "transjordanianos", ou seja, nativos da Jordânia, como os beduínos, e "cisjordanianos", os descendentes de palestinos deslocados da Cisjordânia pela criação de Israel e suas subsequentes guerras com os vizinhos árabes. Os governantes da Jordânia há muito tempo veem os descendentes de palestinos como uma ameaça demográfica ao seu domínio, segundo Ora Szekely, professor associado de ciência política na Universidade Clark, em Massachusetts, que estuda a Jordânia.

A família reinante preencheu fortemente os serviços de segurança com cidadãos transjordanianos, os quais obtêm regalias como pensões e benefícios educacionais para seus filhos.

A importância desses laços entre as tribos e o Estado se tornou mais clara com a ascensão dos jihadistas do Estado Islâmico no vizinho Iraque. Muitos culparam as políticas discriminatórias do ex-primeiro-ministro iraquiano Nuri Kamal al-Maliki pela revolta e exclusão dos sunitas do país.

"Aqui na Jordânia as tribos são o centro nervoso do Estado", disse Jazi.

Muita coisa mudou, segundo ele, desde a época em que os desertos não tinham estradas nem cobertura telefônica, quando os agentes faziam patrulhas a camelo durante vários dias, carregando somente lentilhas, farinha, manteiga clarificada e leite em pó. Hoje, o Exército da Jordânia mantém equipes na maior parte da fronteira, e Jazi e seus homens trabalham em caminhonetes, ou por celular.

Eles passam pouco tempo no quartel, uma construção quadrada e branca, preferindo beber chá e fofocar com os beduínos que passam para uma visita na tenda vermelha e preta que foi armada no gramado. Os camelos descansam nas imediações. Todos os animais têm nome, bem como números oficiais do governo marcados em seus pescoços.

Os agentes reconhecem que, de modo geral, a tecnologia tornou os camelos desnecessários, mas dizem que a força da tradição os mantém lá. "Eles são a herança transmitida por nossos avós", disse Nasser. "E nós os amamos."

Contribuiu Ranya Kadri

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