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George Beyan curou-se do ebola e ajudou a cuidar de seu filho de 5 anos, também contaminado | Daniel Berehulak para The New York Times
George Beyan curou-se do ebola e ajudou a cuidar de seu filho de 5 anos, também contaminado| Foto: Daniel Berehulak para The New York Times

Depois que seus pais morreram de ebola, Junior Samuel, 8, foi internado em um centro de tratamento. No dia seguinte, suas gengivas começaram a sangrar, um sinal alarmante.

Dez dias depois, chegou Rancy Willie, 9, que acabara de perder sua mãe. Não tardou para que ele também começasse a sangrar.Os meninos partilhavam a mesma ala no centro dirigido pela entidade beneficente americana International Medical Corps.

Ambos receberam os mesmos cuidados.

Todavia, um menino morreu horas antes que o outro, já recuperado, fosse para casa. O destino de um terceiro menino, Williams Beyan, 5, continuava incerto.

Os médicos ficam cada vez mais confusos com as reações divergentes de pacientes cujos casos no início pareciam semelhantes. "Não importa há quanto tempo estejamos por lá, não sabemos como prever isso", disse Steve Whiteley, médico da Califórnia que atua como voluntário na Libéria.

Os médicos estão desconcertados com o que Whiteley denominou de fenômeno da "lâmpada elétrica" —a morte súbita de um paciente que parecia estar melhor. Na falta de mais pesquisas e testes de laboratório, a doença ganha contornos aleatórios.

A Organização Mundial de Saúde declarou que menores de 15 anos constituíram até 13% dos casos nos nove primeiros meses da epidemia, embora representem cerca de 43% da população. Talvez eles fiquem menos expostos a fatores de risco cruciais, como cuidar de parentes doentes.

Junior, que pesava 19 quilos, estava muito abatido quando foi internado. Como os dois meninos com quem dividia a mesma ala, sua carga viral era muito alta, o que é um mau indício. Para combater sua desidratação, ele recebeu um tratamento intravenoso e líquidos com eletrólitos de ingestão oral.

Sua trajetória ao longo dos dias foi anotada. Dia 3 de outubro: internado com febre, vômitos, diarreia, perda de apetite, dificuldade para engolir e dores no abdômen, peito e cabeça. Dia 4 de outubro: sangramento nas gengivas. Só havia outra criança na mesma ala e ela estava "apavorada de estar tão perto de Junior", anotou a enfermeira Audrey Rangel. Dia 5 de outubro: diarreia e vômitos. Dia 7 de outubro: estável e até "saltitante". Dia 10 de outubro: febre de 39 graus Celsius.

Rancy Willie chegou três dias depois, pesando apenas 16 quilos e gravemente desidratado. Quando as enfermeiras seguraram o menino pelos antebraços, sua cabeça meneou como uma bandeira.No dia seguinte, Rancy foi transferido para o quarto de Junior na ala de casos confirmados de ebola. Duas noites depois, Rancy caiu e começou a sangrar muito.

Somente uma hora e meia depois chegou uma enfermeira, pois os membros da equipe estavam ocupados internando novos pacientes.

Junior parou de ter febre e começou a se sentar ao ar livre de dia e a comer novamente. Ele sorria sempre que alguém o cumprimentava e parecia melhor a cada dia.

Na noite de 17 de outubro, a quinta desde sua internação no centro, Rancy ficou gemendo sem parar. A equipe lhe deu um analgésico e um sedativo para ajudá-lo a dormir. Havia sangramento em seu olhos, nariz e boca.

Rancy morreu antes do amanhecer. Segundo seu padrasto, o menino adorava dançar e jogar futebol e queria ser engenheiro civil.

Nessa manhã, após mais de duas semanas no centro, Junior teve alta, pois não tinha mais sinais de ebola no sangue, para ir morar com sua tia e o tio. Ele sorria aliviado e disse que só passou a ter medo quando pessoas ao seu redor começaram a morrer.

Williams continuava internado quando Junior partiu. Seu pai, George Beyan, tivera alta no mesmo dia em que o teste de Williams deu positivo para ebola, e agentes humanitários o estimularam para ajudar a cuidar de seu filho. Beyan ajudou Williams a se sentar, o encorajou para comer e beber, pediu mais um suco para os atendentes e até o amparou para andar até o lado de fora. Eles passaram a noite juntos sob o mesmo cobertor.

A quem perguntasse, Beyan dizia que seu filho estava se restabelecendo gradualmente. Os médicos também queriam acreditar nisso, embora Williams apresentasse febres altas e diarreia constante. Afinal de contas, eles haviam ficado surpresos por Junior e Beyan terem sobrevivido.

No entanto, certa noite Williams começou a gritar, após ter tido febre durante o dia. E então morreu. "Meu menininho", soluçava Beyan, inconsolável.

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