• Carregando...
Jovens apaixonados cruzaram o rio Tigre para realizar o sonho de se casar | Ahmad Al-Rubaye/Agence France-Presse — Getty Images
Jovens apaixonados cruzaram o rio Tigre para realizar o sonho de se casar| Foto: Ahmad Al-Rubaye/Agence France-Presse — Getty Images

Quando Ekhlas Mohammed ficou noiva de um pacato soldado iraquiano, morador do outro lado da cidade de Dhuluiya, ela sonhou com o dia em que usaria um vestido branco e festejaria com música e comida, na companhia de amigos e parentes.

Mas não seria assim tão simples. Combatentes extremistas do Estado Islâmico (EI) se apoderaram da área. Seu noivo e a tribo dele pegaram em armas para expulsá-los, enquanto os vizinhos dela se uniram aos jihadistas, enfrentando-se em uma linha de frente letal que dividiu a cidade e separou o jovem casal.

Apesar das ameaças de morte e dos atentados suicidas, eles acabaram se casando graças a um ousado plano do noivo e da mãe de Ekhlas, que envolvia levar a noiva às escondidas para fora da cidade, de barco, pelo rio Tigre.

"Nossa história foi como um filme romântico", disse Ekhlas, 21. "Fui ameaçada por vilões e fugi com o homem que está até agora lutando contra eles."

Confrontos irrompem diariamente em Dhuluiya, cidade ribeirinha situada 80 km ao norte de Bagdá —uma das muitas comunidades iraquianas divididas neste ano pela invasão do EI.

Muitos dos exuberantes laranjais e bosques de tamareiras da cidade se tornaram perigosos por causa dos franco-atiradores e dos disparos de morteiros.

Embora parte da cidade tenha expulsado os jihadistas, seus moradores permanecem praticamente cercados, sem acesso ao centro comercial, a repartições públicas ou mesmo a um cemitério onde possam enterrar seus mortos.

Sua única ligação com o mundo externo é uma frota de precários barcos que percorrem o Tigre no trecho entre essa comunidade sunita e uma cidade xiita nas proximidades, Balad. As embarcações trazem comida, combustível, munição e combatentes. Elas também servem como ambulâncias para os feridos, já que os jihadistas controlam o hospital.

Dhuluiya ainda estava inteira quando Ali Amer, um soldado de 23 anos do Exército iraquiano, decidiu se casar. Um parente que conhecia Ekhlas sugeriu que ele fosse vê-la. Eles se encontraram na casa dela em maio. Amer a achou bonita e com "bons preceitos morais". A moça o considerou um cavalheiro e gostou de ter o aval dele para concluir seus estudos. Os dois anunciaram o noivado alguns dias depois, e então Amer retornou à sua base no Exército. Eles conversavam frequentemente por telefone e começaram a falar sobre a data do casamento.

Mas, em junho, o EI e outros grupos armados sunitas assumiram o controle de Mosul, a segunda maior cidade iraquiana. Boa parte do Exército iraquiano fugiu, e os extremistas avançaram em direção a Dhuluiya. Os jihadistas ameaçaram Ekhlas dizendo que ela teria de romper o noivado, do contrário seria morta.

Os telefonemas dela se tornaram mais ansiosos. "Ela dizia: ‘Me tire daqui!’", conta Amer.

Os jihadistas depois passaram a ameaçar de morte a família dela, por isso Amer e a mãe de Ekhlas elaboraram um plano para tirá-la de lá. Antes de executarem-no, porém, os jihadistas enviaram um homem-bomba num jipe para cometer um ataque numa rua comercial, matando 20 pessoas, incluindo um primo de Amer.

Depois de um longo desvio para contornar as linhas de combate, Mohammed e sua mãe entraram num barco para cruzar o rio em direção à parte sul de Dhuluiya, onde Amer esperava na margem.

"Quando eu vi Ali de longe, compreendi que meu sonho estava se tornando realidade", disse Ekhlas. Em 22 de setembro, ela pôs um vestido branco e se encontrou com Amer em Balad. Eles posaram para fotos e depois pegaram um barco para casa, onde fizeram uma refeição com a família dele. A maior parte dos parentes da noiva não compareceu por causa da dificuldade de atravessar as linhas de combate.

Ainda assim, Ekhlas ficou contente. "Foi o dia mais lindo da minha vida", disse ela. "Estou muito feliz por ter Ali a meu lado."

Mas Amer, que retornou à luta apenas quatro dias depois do casamento, estava quase taciturno. "Não houve lua-de-mel", disse ele.

"Foi um mês de tristeza, um mês de tiros."

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]