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 | FOTOGRAPHÍAS DE ian willms para The New York Times
| Foto: FOTOGRAPHÍAS DE ian willms para The New York Times
  • A prevenção e o tratamento do cólera custam pouco, mas o esforço para frear a doença no Haiti perdeu força. Josilia Fils-Aime, 11, à esquerda, sobreviveu a uma contaminação por morar perto de clínica. Acima, jovem pesca em rio com água contaminada

Nas clínicas médicas, faltam os soros de reidratação oral necessários para tratar a diarreia que acompanha a doença.

Alguns centros de tratamento foram fechados quando grupos humanitários deixaram o país para prestar assistência em outras crises. E um número crescente de pacientes morre depois de chegar a hospitais, segundo as Nações Unidas.

Josilia Fils-Aime, 11, mora no vilarejo de Chapoteau, perto do rio Artibonite, onde a epidemia começou, a conhece todas essas falhas bem demais.

Os comprimidos de purificação de água de sua família tinham acabado, então ela bebeu água de um riacho que devia estar contaminado. "Senti enjoo e tontura", contou a menina, que começou a ter vômito e diarreia repentinos. Médicos disseram que era o cólera.

A situação dela se multiplica em todo o país, que há três anos seguidos é o país com o maior número de casos da doença em todo o mundo.

As Nações Unidas ainda não levantaram os US$ 5 milhões (R$ 11,2 milhões) necessários para vacinar 600 mil crianças em situação vulnerável.

Da mesma forma, não obteve os US$ 2 bilhões (R$ 4,48 bilhões) que prometeu levantar junto a países ricos para construir a infraestrutura de água e saneamento haitiana, que especialistas em saúde pública dizem ser vital para livrar o país da epidemia de cólera.

Pedro Medrano Rios, enviado do secretário-geral da ONU para o surto do cólera, atribuiu a falta de verbas à "fadiga de doação" global. "Não é caro", ele disse. "Ninguém deveria estar morrendo por causa da doença."

Desde que a epidemia começou, em outubro de 2010, 8.562 pessoas morreram de cólera no Haiti. Os casos novos diminuíram, seguindo a trajetória típica de uma epidemia, de um pico de mais de 350 mil casos em 2011 para pouco mais de 50 mil em 2013.

Como é o caso de muitas das instituições nacionais desde o terremoto de janeiro de 2010, o sistema de saúde haitiano continua caótico. Faltam água potável e saneamento básico.

E, na medida em que as ONGs de assistência vão embora, o número de centros de tratamento do cólera caiu de 120 para 40. Os espaços são operados pelas entidades com apoio do governo.

O que talvez seja mais preocupante é a porcentagem crescente de pacientes que morrem nos centros de tratamento que ainda existem no país.

Josilia Fils-Aime sobreviveu provavelmente porque a organização sem fins lucrativos Partners in Health, que atua no Haiti há anos, abriu uma clínica perto da casa dela. Para chegar ao outro centro mais próximo ela afirma ter caminhado por duas horas.

Epidemia de cólera resiste a ações da ONU no Haiti

"Em qualquer outro país, teria sido declarado desastre humanitário", comentou a médica Louise Ivers, da Partners in Health. "O que vai acontecer quando a estação das chuvas começar?"

Segundo Medrano, até 40 mil pessoas podem ser infectadas quando o nível dos rios subir.

A epidemia haitiana de cólera já se espalhou para a República Dominicana, Cuba e México. Os índices de fatalidade são muito mais baixos nesses países, que possuem sistemas de saúde pública muito melhores.

Estudos forenses concluíram que a bactéria encontrada no Haiti é uma linhagem asiática comum no Nepal, de onde vieram centenas de soldados das forças de paz da ONU que estão no país.

A ONU mantém silêncio total sobre sua possível responsabilidade pela importação da doença ao Haiti, onde o cólera não tinha sido registrado antes.

Enquanto isso, o número de crianças subnutridas, as mais suscetíveis ao cólera devido à sua imunidade baixa, aumentou no ano passado. Menos de dois terços da população conta com água limpa para beber.

Jislaine Marc, 15, foi levada ao hospital geral de Porto Príncipe há algumas semanas. Sua família disse que a garota começou a ter vômito e diarreia violentos, de repente —sinais do cólera.

Se ela tivesse chegado a tempo no hospital, poderia ter se salvado com um dos remédios mais simples: os sais de reidratação oral.

Mas Jislaine não chegou. Ela morreu. O hospital não fez um exame para detectar cólera. Apenas mandou a família levar o corpo da menina para casa.

Pouco depois, outro familiar teve os mesmos sintomas e foi levada às pressas para uma clínica operada pela organização Médicos Sem Fronteiras, que despachou agentes de saúde à casa de Jislaine, pulverizou a casa com desinfetante e mandou o Ministério da Saúde remover o corpo.

"Foi tão de repente", disse a tia da adolescente morta. "Ela era apenas uma menina normal, que ia à escola e à igreja."

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