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Plano de um bilhão de dólares para construir um complexo no Grand Canyon põe incorporadores contra ambientalistas | Monica Almeida/The New York Times
Plano de um bilhão de dólares para construir um complexo no Grand Canyon põe incorporadores contra ambientalistas| Foto: Monica Almeida/The New York Times

Renae Yellowhorse estava na beira do Grand Canyon, 42 acidentados quilômetros através do Painted Desert da estrada asfaltada mais próxima, nenhuma civilização à vista. Renae, de 52 anos, que passou toda sua vida nessas terras navajo, apontou para o local onde o rio Colorado e o Little Colorado se encontram, uma deslumbrante explosão de azuis, 900 metros abaixo.

"Este é o lugar onde ficaria o teleférico. Este é o coração da nossa mãe terra. É uma área sagrada. Vai ser uma verdadeira destruição", ela disse.

Renae se referia ao Grand Canyon Escalade, projeto estimado em um bilhão de dólares, um complexo de restaurantes, hotéis boutique, lojas e área para trailers, construído em torno de uma gôndola que levaria os visitantes a um restaurante, um centro cultural dos índios americanos e uma passarela elevada sobre o rio em terras navajo, fora dos limites do Parque Nacional do Grand Canyon. O projeto proposto, em 160 hectares com vista deslumbrante do canyon, é o último de uma longa história de tentativas de incorporadores de construir algo ao lado de um dos pontos de referência nacionais que atrai 4,5 milhões de pessoas por ano.

Mas o Escalade não é o único desafio enfrentando pelo Parque Nacional do Grand Canyon atualmente. Na verdade, esse símbolo do sistema de parques americanos parece estar sendo constantemente atacado.

Um grupo de incorporadores italianos está planejando 279 mil metros quadrados de construções comerciais, além de 2.200 casas, em Tusayan, cidadezinha de apenas 587 habitantes perto da entrada do parque, simbolizando o que funcionários do parque descrevem como uma grande ameaça ao abastecimento de água do Rio de Colorado. E uma passarela aérea terminada em 2007 sobre a borda oeste do Grand Canyon, em terras pertencentes à tribo Hualapai, tornou-se um sucesso, trazendo milhares de visitantes por ano. Alguns tomam um helicóptero até o fundo do canyon, para desespero dos ambientalistas.

"O Grand Canyon é a terra mais protegida do mundo. É Patrimônio Mundial da Unesco. Temos a proteção da Lei de Serviço de Parques Nacionais, que criou o Grand Canyon, e da Lei da Água Limpa", disse David Uberuaga, superintendente do parque.

E completou: "Tantas leis e mesmo assim ainda passo a maior parte do tempo protegendo o lugar, dia e noite. Todos querem ganhar dinheiro com o Canyon".

Essas batalhas acontecem há muito tempo, desde que as primeiras mulas começaram a levar as pessoas lá para baixo; hoje, até mesmo questões sobre a regulamentação de helicópteros que voam sobre o canyon parecem estranhas. E, de fato, muitas propostas ao longo dos anos soam fantasiosas — como uma barragem, o sonho de um desenvolvedor que não conseguiu superar os obstáculos impostos por tribos indígenas ou a devoção da população a tesouros nacionais como esse.

Porém, o sucesso da passarela — que, como o Escalade, foi produto de uma aliança entre uma tribo indígena e um incorporador externo — mostra que esse tipo de projeto é possível e rentável. Alguns dos incorporadores que trabalharam na passarela estão agora trabalhando no Escalade.

"Esse é o desejo de vários investidores que querem ganhar dinheiro com o Grand Canyon ou com os recursos controlados pelos índios", disse Roger Clark, diretor do programa da Grand Canyon Trust, organização que protege o canyon.

R. Lamar Whitmer, o incorporador por trás do Escalade, disse que haveria benefícios para a população indígena e para os turistas que, caso contrário, nunca poderiam desfrutar do isolamento tranquilo no fundo do canyon. "É uma loucura dizer que um teleférico e uma passarela de 335 metros vão estragar o Grand Canyon", disse Whitmer.

E acrescentou: "Esse projeto é muito importante para o povo navajo, não só porque irá criar postos de trabalho bem pagos, mas também porque lhe dará uma oportunidade de mostrar sua cultura ao mundo".

O Escalade e os projetos de Tusayan ilustram as forças complicadas atuando sobre o Grand Canyon: tribo contra tribo, administradores do parque contra incorporadores bem financiados e ambientalistas contra os que querem forçar o acesso a vários lugares para um público maior.

Em Tusayan, o Conselho Municipal, que foi eleito em grande parte com apoio dos incorporadores, aprovou um plano de construção de habitações, hotéis e lojas em torno da cidadezinha. O próximo passo é conseguir a aprovação do Serviço Florestal dos Estados Unidos para construir estradas em terras protegidas.

Greg Bryan, prefeito de Tusayan e gerente de um hotel Best Western, disse que o desenvolvimento era necessário para acomodar os trabalhadores do parque, além de pessoas que podem querer viver perto daqui. Ele disse: "É muito bacana que a comunidade ambientalista de Boston, Chicago ou Los Angeles — que vive em belas casas e pode ir à mercearia da esquina para comprar o que precisa — possa se queixar do que acontece por aqui, sem perceber que os habitantes locais precisam ter alguma qualidade de vida também".

Uberuaga disse que o plano levantou uma série de preocupações: "Céu noturno, ruído, aglomeração, mais aviões chegando ao aeroporto", mas a maior preocupação é que os incorporadores mexam nos aquíferos que abastecem o rio Colorado.

"A construção dessa área suburbana afetaria a força vital do Parque Nacional. É uma ameaça ao fornecimento de água subterrânea do rio Colorado, que foi apontado como o rio mais ameaçado do país há dois anos", disse Bob Irvin, presidente da American Rivers, uma organização sem fins lucrativos.

Entre os desafios recentes, o maior é o Escalade, disseram os funcionários do parque. Do jeito que foi planejado, o complexo seria visível de pontos de observação de borda sul onde os visitantes se reúnem à noite para assistir a exibição hipnótica da mudança de tonalidade nas camadas de rocha quando o sol se põe.

O projeto custaria US$ 1 bilhão, disse Whitmer; sua empresa entraria com US$ 150 milhões para a gôndola e o desenvolvimento na parte inferior, e os navajos seriam responsáveis por US$ 65 milhões para construir estradas e a infraestrutura de energia e água. O resto, segundo ele, viria de incorporadores de dois hotéis boutique e outras instalações propostas. Ele precisa ser aprovado pelo Conselho da Nação Navajo.

Ben Shelly, presidente da Nação Navajo, é um dos maiores defensores do projeto, argumentando que isso traria empregos e receitas para a tribo.

Mas Renae, líder da coligação Save the Confluence, disse que pretende proteger a terra onde os índios vão rezar e honrar o seu passado — particularmente o lugar onde os dois rios se encontram.

"Não queremos que essa área sagrada seja modificada. Não queremos o teleférico. Não queremos ninguém aqui."

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