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U Htein Lin diz que fez suas melhores obras de arte na prisão | Minzayar para The New York Times
U Htein Lin diz que fez suas melhores obras de arte na prisão| Foto: Minzayar para The New York Times

Quando U Htein Lin pensa nos anos em que foi prisioneiro político, se lembra de um lugar escuro e úmido, de ser vendado e espancado pelos guardas. Hoje, apesar de livre, há algo que o levou de volta para lá.

Htein Lin retornou duas vezes ao presídio para ministrar um curso de dez dias de meditação budista. Ele diz que se voluntariou por considerar a tarefa um dever cívico – afinal, foi a meditação que o ajudou a sobreviver o período de reclusão e queria transmitir seus conhecimentos aos guardas e aos presos.

Mas ele também queria se reconectar com a sensação de confinamento. Como artista, o tempo que passou ali resultou em seus melhores trabalhos.

"Penso na minha vida, nos altos e baixos, e a considero uma história; olho para trás e percebo que os problemas e as crises são parte importante dela. É por isso que eu quis voltar", explica.

Htein Lin foi condenado pelo governo militar por ajudar a organizar um protesto pró-democracia, motivo comum pelo qual a junta, paranoica na época, costumava trancafiar as pessoas.

Ao contrário da maioria dos prisioneiros políticos, porém, depois de seis anos de detenção, Htein Lin saiu com muita coisa para mostrar. Enquanto estava na cadeia, conseguiu criar cerca de 300 pinturas e esculturas.

Os uniformes antigos viraram telas e as seringas e pedras de isqueiro, pincéis. Em cores vibrantes, ele registrou imagens abstratas de prisioneiros magérrimos e mutilados, as paredes imundas, os cadeados e os rostos atormentados. Nas barras de sabão, esculpiu os homens apertados nas celas.

"Fiquei completamente apartado dos críticos e do público. Fazia o que queria. Na cela, acabei encontrando a liberdade. Foi a época mais importante para a minha carreira", conta ele em seu apartamento.

Enquanto esteve preso, a mulher o abandonou e o pai morreu; demorou dois meses para receber as notícias.

Htein Lin sobreviveu graças à meditação, à arte e ao desafio inabalável aos seus captores. "Nunca aceitei a forma como fui tratado. É preciso se manter em luta constante", afirma ele.

Depois de solto, em 2004, conheceu a embaixatriz britânica Vicky Bowman, que conseguiu enviar alguns de seus trabalhos para fora do país no malote diplomático. Eles se apaixonaram e se casaram.

Quando Htein Lin voltou pela primeira vez ao presídio, em março, se deparou com quase cem guardas, a maioria forçada a fazer o curso por causa de problemas disciplinares ou com a bebida. "É fácil corrigir os presos, mas com os guardas o negócio é mais complicado; eles estão acostumados a dar ordens, e não a recebê-las", explica U Maung Maung Lwin, empresário aposentado que gerencia o curso de meditação.

Htein Lin, ex-presidiário, de repente se tornou o executor. Ao passar os olhos pela sala, encarou U Ko Ko Naing, um de seus antigos guardas.

"Ele me reconheceu. Eu disse: ‘Sim, estou aqui e vou ajudá-lo, mas seria muito bom se você seguisse as minhas instruções’", conta ele.

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