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Edifício arruinado pela guerra entre Gaza e Israel, no ano passado; moradores perdem a esperança cidade seja reconstruída | Wissam Nassar/The New York Times
Edifício arruinado pela guerra entre Gaza e Israel, no ano passado; moradores perdem a esperança cidade seja reconstruída| Foto: Wissam Nassar/The New York Times

Em uma rua lotada de roupas brilhantes e lojas de eletrônicos, Mahmoud Matar folheava o bloco de notas de sua loja de equipamentos domésticos: sua única venda naquele dia foi uma chaleira de US$ 7. Ele deixou claro quem culpava pelas vendas fracas: o governo do Hamas.

“Eles deveriam desistir e ir para casa”, disse com raiva Matar, um fumante inveterado de 31 anos. “Eles não deviam se chamar de governo.”

As esperanças de que as potências globais iriam intervir para reconstruir o enclave costeiro arrasado pela guerra de 50 dias, no ano passado, entre Israel e o governo do Hamas em Gaza diminuíram.

A afirmação do Hamas de que ele venceu a guerra simplesmente por ter sobrevivido é sobreposta pelas dificuldades de manter em pé um território onde o padrão de vida de 1,8 milhão de habitantes só piora.

Recentemente, o Hamas adotou novas taxas de importação na tentativa de cobrir os salários de cerca de 40 mil empregados que não recebem há meses, aumentando os preços nos mercados.

O quilo de carne subiu US$ 0,50, o da pimenta preta US$ 1,50 e o xampu US$ 0,25, um golpe nos palestinos que já penam para viver.

Com a deterioração da economia, os habitantes de Gaza estão ficando cada vez mais frustrados pelo impasse entre o Hamas e seu partido rival, o Fatah, liderado pelo presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas.

“O cidadão está no meio”, disse o economista Omar Shaban. “Ramallah não se importa”, disse ele, referindo-se ao governo de Abbas na Cisjordânia. “Eles têm interesse em deixar Gaza deste jeito.”

Nos destroços de Shejaiya, bairro no leste da cidade de Gaza, um homem empunhou sua marreta para mostrar como pulveriza o concreto, que vende para ser misturado ao cimento vendido pelo mercado paralelo, o que lhe vale US$ 15 por dia.

Alguns moradores voltaram a viver nas casas destruídas, sem esperança de vê-las reparadas. Outros receberam pequenas quantidades de cimento doado para consertar casas menos danificadas. Milhares de pessoas sem teto ainda vivem nas escolas dirigidas pela ONU.

Muitos dos novos desempregados são ex-operários da construção civil que estão desesperados para encontrar trabalho.

Em um dia recente no porto de Gaza, homens empurravam crianças em carros de brinquedo enfeitados com brilhos e flores, cobrando US$ 0,50 por passeio.

Os meninos também trabalham, substituindo pais ausentes, doentes ou mortos. Mohammad al-Ahi, 13, vende balões por US$ 0,25.

Israel impõe restrições severas à importação de materiais de construção, dizendo que eles são usados para construir túneis para realizar ataques a Israel.

O governo egípcio adotou medidas extraordinárias para fechar os túneis que eram a linha vital da economia de Gaza.

O Egito abriu sua fronteira apenas cinco vezes neste ano, parte de uma política mais ampla de punir o Hamas, que se alinhou à Irmandade Muçulmana, que governava o país até a queda do presidente Mohammed Mursi. Os túneis eram a principal fonte de renda do Hamas.

Muitas crianças ainda carregam o trauma infligido durante o conflito.

Hamada Zaim, 4, já viveu duas guerras curtas, em 2012 e 2014.

Ele molha a cama e acorda gritando, disse sua mãe, Reem.

Entre as guerras, o menino ficou calvo e sua cabeça começou a inchar. Antes que o Egito endurecesse a movimentação na fronteira, sua mãe o levou para ver especialistas. Eles não puderam dar um diagnóstico e lhe disseram para voltar, mas agora isso é quase impossível.

O índice de desemprego em Gaza aumentou para 44%, o maior do mundo, segundo o Banco Mundial. Muitos trabalhadores estão sem receber, e dezenas de milhares de empregados que foram contratados pelo governo de Abbas, quando o Fatah controlava o território, são pagos para ficar em casa em vez de trabalhar para o Hamas.

“Não é lógico”, disse Ashraf al-Qedra, porta-voz do Ministério da Saúde de Gaza. “O que fica sentado em casa é pago, mas se tiver um problema vai a um hospital ser tratado por um médico que não recebe salário.”

No mal-estar do pós-guerra, alguns jovens parecem zumbis.

Alguns são viciados em analgésicos fortes que prometem horas de escape nebuloso de um lugar de onde não podem fugir.

“É o desemprego, a insegurança, a pressão, o bloqueio. Imagine esperar meses para sair de Gaza”, disse um ex-usuário de 24 anos, sob a condição do anonimato. “Imagine esperar e esperar.”

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