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Casa cercada por pântano em Terrebonne Parish; desde o Katrina, um dos piores desastres da história americana, a estabilização de áreas erodidas ao redor de Nova Orleans é prioridade | William Widmer/The New York Times
Casa cercada por pântano em Terrebonne Parish; desde o Katrina, um dos piores desastres da história americana, a estabilização de áreas erodidas ao redor de Nova Orleans é prioridade| Foto: William Widmer/The New York Times

Dez anos atrás, o bairro próximo ao canal da Rua 17 ficou submerso. As ondas levantadas pelo furacão Katrina invadiram o canal e romperam seus muros contra enchentes. Grande parte de Nova Orleans permaneceu coberta de lama durante semanas, até que a cidade pudesse ser drenada.

Depois disso, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma verba de US$ 14 bilhões para se erguer um anel de proteção de 560 quilômetros ao redor da cidade, com diques maiores e mais fortes, portões gigantescos que podem ser fechados contra tempestades e uma espetacular “Grande Muralha do Lago Borgne” de 3,2 quilômetros, que pode isolar o canal que devastou a área de Lower Ninth Ward quando seus diques caíram. Mais trabalho está sendo feito, incluindo estações de bombeamento que impedirão que os três principais canais de drenagem da cidade sejam novamente inundados durante tempestades.

O elaborado sistema de muros, bombas e portões ainda não é tudo que a cidade precisa, porém. Falta um longo caminho para se cumprir uma promessa das autoridades federais e estaduais de que o tipo de destruição generalizada causada pelo Katrina, um dos piores desastres da história dos EUA, não acontecerá de novo.

Enquanto o governo federal construía o anel protetor em torno de Nova Orleans, as autoridades estaduais elaboravam um plano para cuidar de outras áreas vulneráveis do Estado, como parte de um plano-mestre de US$ 50 bilhões, com prazo de 50 anos. Ele combina estruturas como diques com “infraestrutura verde”, como pântanos restaurados e ilhas-barreiras reforçadas, para atenuar o golpe das tempestades e fornecer abrigo para a vida silvestre.

As lições do furacão Katrina, gravadas em concreto, aço, terra, pântano e no ambicioso plano-mestre, estão sendo observadas com interesse. Autoridades de todo o mundo vieram ver o que está surgindo. Ricky Boyett, do Corpo de Engenheiros do Exército dos EUA, disse que em 2010 ele e seus colegas conduziram mais de 400 visitas de delegações do Congresso e autoridades de mais de 20 países, incluindo Bangladesh, República Tcheca e Holanda. Com o tempo, disse ele, “paramos de contar”.

Os visitantes veem na Louisiana um pouco de seu próprio futuro, já que a mudança climática provoca a elevação dos mares e ameaça comunidades costeiras de todo o mundo. Porém, como a Louisiana lida com o desafio adicional do afundamento da terra, há perguntas sobre se esse empreendimento é um exercício inútil.

“Estamos na vanguarda no que diz respeito a obras que respondem à mudança climática”, disse Chip Kline, a principal autoridade costeira do Estado.

Nos últimos 80 anos, a Louisiana perdeu 4.900 quilômetros quadrados de pântanos costeiros. Isso aconteceu em grande parte por causa das barragens ao longo do rio Mississipi, que isolaram o delta dos sedimentos que o reabasteciam, e de operações de petróleo e gás que o cortaram com oleodutos e canais de navegação que permitiram que a água salgada subisse, matando delicados pântanos.

Equipe retira amostras de solo em área de inundaçãoWilliam Widmer/The New York Times

Os danos obscureceram as medidas que estão sendo tomadas para restaurar a terra.

O Estado tem mais de 150 projetos de seu plano-mestre em andamento ou concluídos. Mais de US$ 11 bilhões em verbas públicas foram gastos na redução de riscos dos furacões, com mais de US$ 2 bilhões destinados à restauração do ecossistema. A Louisiana está construindo ilhas-barreiras contra a erosão e promontórios, restaurando suas praias, dunas e pântanos. Está trazendo a terra de volta para áreas úmidas que se degradaram com a inundação.

Cada projeto tem seu próprio quebra-cabeça: o promontório de Caminada está recebendo areia trazida por barcaças e encanamentos de um banco de areia a 48 quilômetros da costa, no golfo do México. O promontório protege a indústria de estaleiros no vizinho Port Fourchon e a Rodovia 1, ligação vital e rota de fuga de furacões.

Em Bayou Dupont, centenas de hectares de terra, já com pastagens brotando, surgiram nos últimos meses em locais inundados, por causa de um cano de 21 quilômetros que traz areia retirada do fundo do rio Mississípi.

Esforços de restauração como esses fornecem proteção contra os poderosos furacões, disse Reggie Dupre, do Distrito de Conservação e Barragens de Terrebonne. “Qualquer coisa que você coloque entre o golfo do México e onde você mora remove um pouco dessa energia”, diz ele.

A dragagem pode acumular terra rapidamente, mas é cara. Como as forças que estão desgastando a Louisiana não vão desaparecer, o trabalho terá de ser repetido. Autoridades dizem que gostariam de ver um sistema que se reabastecesse, e que isso envolverá reverter, mesmo que só um pouco, uma das maiores realizações de engenharia da história americana.

Depois que o Congresso ordenou que o Corpo de Engenheiros murasse o Mississipi, após as enchentes desastrosas de 1927, a região ficou mais segura para se viver. Mas essas barragens cortaram o suprimento de areia e sedimentos que formavam a terra e a mantinham acima da água. Agora a Louisiana quer sua terra de volta, fluindo por cortes na margem do rio conhecidos como desvios.

Davis Pond, desvio de água doce a 24 quilômetros de Nova Orleans, rio acima, construído pelo Corpo de Engenheiros e o Departamento de Recursos Naturais do Estado, mostra o que um projeto desses pode fazer. A estrutura de concreto e aço permite que água, nutrientes e sedimentos suspensos escoem para pântanos e estuários próximos. Futuros desvios —quatro planejados e dois sob avaliação— vão canalizar a areia mais pesada para formar terra mais rapidamente.

Os desvios são controversos entre alguns pescadores e coletores de ostras, que dizem que enviar água doce para áreas pantanosas vai perturbar seu ganha-pão. Grupos ambientais são a favor dos desvios, porém, e as autoridades insistem que eles são um remédio para um Estado que afunda.

“O rio Mississipi é a salvação para a crise que enfrentamos”, disse Kline, a autoridade costeira do Estado. “Vamos deixar o rio fazer o trabalho.”

Restaurar o litoral será caro, mas não agir seria ainda mais, segundo Mark S. Davis, da Escola de Direito da Universidade Tulane, em Nova Orleans. Ele disse que o país pagou de uma maneira ou de outra, e os mais de US$ 100 bilhões que foram gastos na recuperação simplesmente estão substituindo o que o furacão Katrina destruiu.

No entanto, tudo o que foi planejado poderá não ser suficiente, disse Oliver Houck, também da Universidade Tulane. Para ele, é essencial deslocar os moradores das áreas mais arriscadas.

Chuck Perrodin, porta-voz da autoridade costeira, considerou o que acontecerá quando vier o próximo furacão. Sua previsão foi crua: “Vai estragar tudo isto”. Mesmo assim, acrescentou: “Desde que estejamos dando dois ou três passos à frente para cada passo atrás, teremos um ganho líquido. Antigamente dávamos um passo à frente e dois para trás”.

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