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As escavadeiras começaram este ano a toda no sul do Japão, dando início a um frenesi de construções – e uma sensação de déjà vu.

As placas de "em construção" ao longo das estradas e hidrovias de Saga são praticamente a única mudança visível trazida pela "abenomia", o muito elogiado plano do primeiro-ministro, Shinzo Abe, para recolocar o país no caminho do crescimento. Os moradores da região afirmam que a construção efervescente remete à problemática década de 1990 no Japão, quando várias regiões da nação apelam à construção como forma de retomar a prosperidade.

Existe o temor de que, a exemplo das tentativas anteriores, o crescimento não dure.

"Quanto tempo vai demorar até isso perder o ritmo?", indagou Masataka Matsuo, operário da construção civil, enquanto reforçava um canal de irrigação nos arredores do centro da cidade. "Essa pergunta está na cabeça de todo mundo."

Neste ano, o crescimento japonês superou em grande medida o de muitos países industrializados, graças às políticas audaciosas que estão erguendo a economia depois de anos de deflação. A aposta de Abe de injetar dinheiro nos bancos japoneses, em conjunto com as promessas de reformas no mercado, chamou boa parte da atenção dos investidores.

Porém, economistas afirmam que a recuperação do Japão se tornou perigosamente dependente dos gastos com obras públicas, lembradas aqui por elevar o fardo da dívida pública e lotar o país com estradas, pontes e represas pouco usadas.

Recentemente, o governo anunciou novos gastos visando ao estímulo de 5,5 trilhões de ienes, numa aposta para contrabalançar a reação negativa ao futuro aumento nos impostos das vendas nacionais.

Mesmo assim, alertam economistas, injetar dinheiro em projetos de infraestrutura terá pouca consequência em elevar o crescimento potencial do país a longo prazo. E com provas limitadas de que a maior facilidade monetária esteja realmente ajudando a economia real, o crescimento "corre o risco de despencar de uma ribanceira", quando esfriarem os gastos públicos, disse Chotaro Morita, diretor de estratégia da SMBC Nikko Securities, de Tóquio.

No trimestre encerrado em setembro, o consumo cresceu 0,2 por cento em relação a igual período anterior e o investimento de capital não se alterou, apesar do dinheiro disponível com a política monetária japonesa. A exportação líquida caiu 0,6 por cento.

O crescimento do mercado acionário, de 50 por cento desde o começo do ano, não ajudou as pessoas comuns a gastarem mais.

Em vez disso, o gasto público em obras estimulou o crescimento, num aumento de 6,5 por cento em relação ao trimestre anterior, segundo as estatísticas mais recentes divulgadas. No geral, o crescimento do trimestre foi revisado para 0,3 por cento em relação aos três meses anteriores, contra uma análise inicial de 0,5 por cento.

"O motor do crescimento japonês tem sido o gigantesco gasto do governo", afirmou em comunicado Ryutaro Kono, economista do BNP Paribas.

Província pequena com aproximadamente 850 mil habitantes, Saga conhece bem a generosidade do governo. A construção era abundante por aqui durante a década perdida de 1990, enquanto o Japão tentava repelir a recessão com obras públicas que em alguns anos superaram todo o orçamento militar dos Estados Unidos.

Saga construiu um aeroporto, represou quase todos os sistemas fluviais e abriu um parque de 80 hectares com centro de visitantes e quase cem prédios históricos.

Entretanto, desde o começo do novo século, um primeiro-ministro reformista começou a reduzir os gastos, deixando regiões como Saga na mão. Em 2012, o investimento público chegou a um terço do ponto máximo de 1998. Quase um quinto das construtoras de Saga fecharam as portas.

Abe voltou a abrir as torneiras. Menos de duas semanas após sua posse em dezembro do ano passado, ele anunciou um pacote emergencial de estímulo de mais de dez trilhões de ienes (US$ 110 bilhões) centrado em obras públicas.

A Assembleia Legislativa de Saga aprovou um pacote de estímulo de 28 bilhões de ienes, dos quais quatro quintos serão destinados à infraestrutura.

Os contratos de obras públicas em Saga subiram durante os seis meses seguintes. Em âmbito nacional, os projetos de obras públicas atingiram o ponto máximo em uma década, com quase quatro trilhões de ienes gastos nos três primeiros trimestres.

Mesmo assim, até as construtoras estão relutantes em contratar ou investir.

"Existe muito trabalho, mas é arriscado demais voltar a crescer", afirmou Tsuyoshi Kishimoto, presidente da Kishimoto Gumi, uma das maiores empreiteiras de Saga. "O governo é muito volúvel."

Em Karatsu, na provincial de Saga, existe a aposta de se utilizar outro aspecto do plano econômico de Abe: reduzir a burocracia que inibe a abertura e o crescimento das empresas.

Capitaneado pela Bloom, empresa local que realiza testes em cosméticos importados, um projeto regional busca reunir produtores rurais e oficinas para produzir cosméticos e perfumes.

O programa faz pressão para Saga ser nomeada "zona econômica especial", designação que poderia resultar em impostos e outras medidas favoráveis às empresas.

As autoridades de Saga afirmam ter em especial a grande esperança de reformar o setor agrícola, fazendo os produtores rurais cultivarem ingredientes valiosos para cosméticos, tais como ervas.

"A ideia é criar algo novo em Saga", declarou Shinji Yamasaki, executivo principal da Bloom. "Para crescer, é preciso ter ideias novas."

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