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Num dia de fevereiro, após escurecer, Noemi Álvarez Quillay deu os primeiros passos da viagem de 10 mil quilômetros entre o planalto ao sul do Equador e a cidade de Nova York.

Uma menina tímida e estudiosa, Noemi caminhou 10 minutos por estradas de terra até chegar à rodovia para Quito. Ela carregava uma mala pequena. Seu avô Cipriano Quillay acenou para um ônibus e observou a menina embarcar. Ela tinha 12 anos.

A partir daquele momento, e pelas cinco semanas restantes de sua vida, Noemi ficou na companhia de estranhos, incluindo coiotes – contrabandistas de pessoas, contratados por seus pais em Nova York para trazê-la até eles. Seus pais haviam chegado ilegalmente aos Estados Unidos e se estabelecido em Nova York quando Noemi ainda era bebê.

Para essas crianças, vagar por milhares de quilômetros é uma jornada cansativa e repleta de perigos. A grande maioria vem da América Central.

Em março, um mês após sair de casa, a polícia capturou Noemi e um coiote em Ciudad Juárez, no México. As autoridades a levaram a um abrigo infantil. Disseram que ela chorava descontroladamente. Alguns dias depois, ela foi encontrada enforcada numa haste de cortina no banheiro.

Noemi era parte de uma enxurrada humana que vem crescendo desde 2011: o número de menores desacompanhados pegos entrando nos Estados Unidos deverá atingir 60 mil nos 12 meses terminando em 30 de setembro, afirmou Lisa Raffonelli, do United States Office of Refugee Resettlement (gabinete americano de realocação de refugiados), frente a apenas 6.560 casos em 2011. No México, o número mais do que duplicou.

Nenhum fator isolado explica esses picos, mas na cidade natal de Noemi há dicas sobre as forças em ação. No distrito de El Tambo, na província de Cañar, seus avós maternos, Quillay, de 57 anos, e María Jesús Guamán, de 59, moram numa casa de barro sem água corrente. Há cerca de 15 anos, durante uma crise econômica no Equador, seus filhos adultos começaram a migrar para os Estados Unidos – sem vistos.

"Meus quatro filhos encontraram vidas decentes", afirmou Quillay. "Assim, assumi cinco netos desde quando eles eram pequenos".

Crianças começaram a deixar El Tambo, com ajuda de seus pais no estrangeiro, mas ainda enfrentando jornadas sombrias.

"Agora estamos vendo que os migrantes são crianças pequenas ou adolescentes cujos pais estão mandando buscá-los, correndo o risco de colocá-los nas mãos de coiotes – a quem eles pagam 15, 20, 25 mil dólares", afirmou Magdalena Choglio Zambrano, uma supervisora do colegial.

Pouco se sabe sobre as viagens de Noemi até um mês depois de ela sair de casa. Em 7 de março, em Ciudad Juárez, a polícia viu Domingo Fermas Uves, de 52 anos, urinando ao lado de uma picape. Dentro dela estava Noemi. Fermas disse aos policiais que fazia parte de uma rede de contrabandistas contratada pela família da menina para levá-la aos Estados Unidos. Noemi foi levada ao abrigo para menores mexicanos. Em 11 de março, ao ser chamada para o almoço, Noemi dirigiu-se ao banheiro. Outra menina não conseguia entrar. Um médico e outros funcionários arrombaram a porta e encontraram Noemi.

Os menores vindos da América Central e México são "propelidos pela violência, insegurança e abusos", declarou o alto comissariado para refugiados das Nações Unidas num relatório divulgado no dia seguinte à morte de Noemi. A perspectiva de uma reforma da imigração nos Estados Unidos também é sedutora, afirmou Jorge W. Lopez, autoridade equatoriana em Nova York, devido à crença de que aqueles que já estiverem no país serão autorizados a ficar. O pai de Noemi, José Segundo Alvarez Yupa, trabalhador da construção civil, pouco comenta. "Isso é muito doloroso. Queremos nos recuperar".

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