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Ele engordou 13 kg, teve que raspar parte do cabelo e visitou as regiões do sul dos EUA de passado sombrio, mas o que realmente ajudou David Oyelowo a interpretar Martin Luther King no filme "Selma", que estreia nos EUA em janeiro de 2015, foi ter vivido a juventude na Nigéria e no Reino Unido, bem longe do país em que surgiram, nos anos 60, os levantes contra a opressão aos negros norte-americanos.

"Eu não tenho a bagagem que muitos têm nos EUA, tipo: ‘Meu tio marchou com ele, meu avô o conheceu, minha avó tinha as fotos de JFK, Jesus e de King’; não cresci com esse peso", conta o ator de 38 anos.

E continua: "Isso me ajudou a entendê-lo como homem mais rapidamente e saber que não poderia exagerar em seus momentos mais marcantes. Na verdade, tentei retratá-los da forma mais discreta possível porque, para mim, ele era mais um homem de fé, um marido, um pai."

Dirigido por Ava DuVernay, "Selma" se passa em 1965, quando King confrontou o presidente Lyndon B. Johnson por causa da discriminação dos negros e a necessidade da criação de uma lei que lhes garantisse o direito de voto. Os críticos estão elogiando Oyelowo e o filme, com a indicação ao Globo de Ouro já sinalizando que é possível sonhar com a disputa do Oscar.

Em outubro, o público pôde ver Oyelowo como um dos astronautas de "Interestelar", de Christopher Nolan; ainda este mês ele será um promotor no drama de J. C. Chandor, que se passa na Nova York dos anos 80, "A Most Violent Year".

"Se você é negro, vem para a terra do ‘tudo pode’ e não sofreu o mesmo que os afro-americanos daqui, tipo, ‘você não pode, você não vai, você não tem’, então é bem provável que gere uma combinação explosiva. É o caso do Poitier, do Steve McQueen. Eu sei que eu herdei isso." No filme, King leva uma marcha, muitas vezes sangrenta, de Selma a Montgomery, no Alabama, para destacar a luta pelos direitos de voto dos negros no Sul. O elenco inclui Tom Wilkinson como Johnson; Carmen Ejogo como Coretta Scott King; Tim Roth como o governador do Alabama, George Wallace, e Oprah Winfrey como uma manifestante. "Foi o papel mais difícil que já interpretei", revela, com seu sotaque britânico. E diz ter certeza de que Deus o convocou para encarnar o líder dos direitos civis, assassinado aos 39 anos, em 1968.

"Eu não teria tido forças para batalhar tanto se não sentisse que era um chamado. E agora, veja você, estamos passando por uma época em que esse filme não poderia ser mais relevante", disse ele poucos dias depois da decisão tomada pelo júri de não indiciar Darren Wilson, o policial branco que matou a tiros Michael Brown, um adolescente desarmado, em Ferguson, no Missouri.

Comentando os protestos contra a violência policial e a desigualdade racial nos EUA, ele conta que a diretora estava praticamente editando o filme quando lhe mandou um torpedo que dizia: "Você está vendo o que está passando na TV? Cara, nós filmamos isso há um mês!"

Oyelowo tem formação clássica, tendo estudado na Academia de Música e Artes Dramáticas de Londres, e ficou famoso nos palcos e na TV britânicos antes de se mudar para Los Angeles com a mulher, Jessica, e os dois filhos, em 2007. Desde então a família cresceu e possui mais dois membros enquanto ele conquistou papéis em superproduções como "Lincoln" (como um soldado) e "Histórias Cruzadas" (como um pastor).

Apesar de todo o sucesso, Oyelowo conta que, a princípio, não contou com a aprovação dos pais, um casal de nigerianos que tem uma companhia de táxi em North London. Em busca de mais oportunidades, a família se mudou do Reino Unido, onde o ator nasceu, para Lagos, no período em que ele tinha de seis a treze anos, voltando à capital britânica após um golpe militar. Oyelowo atribui parte de sua atitude confiante ao fato de não ter crescido com uma "mentalidade de minoria" imposta por uma cultura dominante.

Porém, teve que estudar a situação dos negros nos EUA que fez com que King se destacasse a ponto de arriscar a vida para mudar um sistema de castas racista e desumano. "Minha fonte mais preciosa foi Andrew Young", relata.

Young, que marchou ao lado de King e seguiu a carreira de congressista, foi embaixador e prefeito de Atlanta, mas também dirigiu o ativista em imagens, inclusive inéditas, que mostravam uma versão muito mais solta do jovem reverendo.

"Sua cadência era diferente, assim como a estrutura de seu discurso, a forma como usava palavras difíceis. Ele encarnava o negro astuto e digno porque era uma imagem que os EUA não queriam aceitar – como não aceitaram até hoje."

"Acho que há um medo inerente de personagens negros poderosos que têm o controle de seu próprio destino; é um lance subconsciente. Por medo aqui subentenda-se o incômodo de não vê-los no papel de empregados ou escravos, subservientes."

"É até compreensível porque é fato inegável, faz parte da história do negro nos EUA. O que é menos evidente e menos propagado é o fato de que conseguirmos mudar a trajetória do nosso destino", conclui.

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