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‘‘Brokeback Mountain’’ foi convertido em ópera | Javier del Real/Teatro Real
‘‘Brokeback Mountain’’ foi convertido em ópera| Foto: Javier del Real/Teatro Real

No aclamado filme "O Segredo de Brokeback Mountain", de 2005, baseado num conto de Annie Proulx, Heath Ledger representou Ennis Del Mar, vaqueiro do Wyoming que vive um caso furtivo de amor gay, ao longo de décadas. Ele falava em voz baixa e pouco clara, com poucas palavras, como se estivesse bloqueado por uma vida inteira de segredos. Era uma voz poderosamente comovente nos close-ups quietos possíveis no cinema, mas que não seria ouvida no ambiente grandioso de um teatro de ópera.

Quando um homem mal consegue falar, como você o faz cantar? Foi essa uma das perguntas básicas enfrentadas pelo compositor Charles Wuorinen quando ele começou a adaptar a história para uma ópera, com libreto de Proulx, que ficará em cartaz até 11 de fevereiro no Teatro Real, em Madri.

"Ele começa na ópera quase sem falar", disse Wuorinen, 75, falando do personagem Ennis na ópera. "Ele não consegue falar. Faz sinal de ‘sim’ com a cabeça. Quando é cutucado, grita."

Wuorinen recorreu ao Sprechstimme, técnica a meio caminho entre o canto e a fala. Ele fez do impulsivo e descontraído Jack Twist um tenor (Tom Randle, na produção madrilenha), enquanto Ennis (o baixo-barítono Daniel Okulitch) é mais profundo e impassível, pelo menos no início.

"Com o passar do tempo, ele deixa de fazer tanto Sprechstimme e começa a cantar mais", disse Wuorinen. "É um processo gradual que vai se desenrolando ao longo da ópera, até que no final, quando está sozinho e perdeu tudo, ele consegue se expressar. Mas já é tarde."

Dirigido por Ang Lee e tendo Heath Ledger e Jake Gyllenhaal como protagonistas, o filme saiu na cúspide de uma nova era dos direitos dos gays. Os criadores da ópera deixam claro que a história e a ópera são distintas do trabalho de Lee.

"O filme foi mais comovente e emocional", disse Annie Proulx. "E acho que isso se deveu em boa parte à música, que foi perfeitamente apropriada ao filme."

O oeste americano das obras de Proulx nunca é idílico. Em outro conto da autora, um vaqueiro morre de frio. Algumas pessoas acham que "O Segredo de Brokeback Mountain" deixou a história e o ambiente em que ela acontece mais "bonitinhos" e superficiais do que deveriam ser.

"A questão da paisagem daquele lugar é que ela é mortífera", disse Wuorinen. "Não é amigável. Ela é magnífica, mas, se você marcar bobeira, terá problemas."

Wuorinen assistiu a "Brokeback Mountain" no cinema e imediatamente enxergou o potencial operístico da história. "Achei que era um tema, um tópico, uma questão que tem ressonância hoje", explicou, "diferentemente dos temas operísticos do passado, que, me parece, são completamente destituídos de interesse dentro do contexto social de hoje."

Proulx disse que não pensou uma vez no filme quando trabalhava sobre a ópera. Mas, embora o teor poético tenha sido intensificado —"ele me acalma, me toca, ele cura minha solidão", Ennis canta—, o libreto lembra o roteiro premiado com o Oscar, que ampliou o foco do conto original, incluindo mais sobre o relacionamento dos dois homens com suas mulheres.

A trilha é complexa, mas o dó sustenido tende a ser associado a Ennis, enquanto o si natural é ligado a Jack. A montanha possui sua própria nota, um subterrâneo dó natural —"a nota da morte", como Wuorinen a descreveu—, num esforço para restaurar algo do clima intransigente e sombrio do conto original.

"A montanha representa a liberdade deles, sua capacidade de se mostrar um ao outro", explicou o compositor. "Mas é também um lugar muito ameaçador, um lugar que lança uma sombra. Na música e na produção da ópera, ela será uma presença o tempo todo."

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