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Diversas pessoas que se identificam como representantes da Al Qaeda operam livremente em Doha, capital do Qatar | Yoan Valat/European Pressphoto Agency
Diversas pessoas que se identificam como representantes da Al Qaeda operam livremente em Doha, capital do Qatar| Foto: Yoan Valat/European Pressphoto Agency

De pé à frente do salão de conferências em Doha, o xeque visitante disse à plateia de ricos qatarianos que para ajudar os moradores sofridos da Síria eles não deveriam se incomodar em fazer doações para programas humanitários ou para o Exército Livre Sírio, apoiado pelo Ocidente.

"Deem seu dinheiro para os que o gastarão na jihad [guerra santa], e não em ajuda", implorou o xeque Hajaj al-Ajmi, recentemente identificado pelos Estados Unidos como um angariador de fundos para a Frente al-Nusra, a filial síria da Al Qaeda.

O Qatar é uma pequena monarquia do golfo Pérsico, rica em petróleo, onde os EUA têm sua maior base militar no Oriente Médio. Mas durante anos ela consentiu tacitamente com a captação de fundos pelo xeque Ajmi e outros como ele.

Depois de seu pedido, que ele gravou em 2012, um locutor esportivo da rede Al Jazeera, propriedade do governo do Qatar, o elogiou.

"O xeque Ajmi sabe o que diz sobre ajudar os sírios", declarou o locutor Mohamed Sadoun el-Kawary, no mesmo palco.

A carreira do xeque Ajmi como angariador de fundos é um exemplo de como o Qatar há muitos anos ajuda a apoiar um leque de grupos islâmicos em toda a região, oferecendo abrigo, mediação diplomática, ajuda financeira e, em certos casos, armas.

O xeque Ajmi e pelo menos meia dúzia de outros identificados pelos EUA como captadores de fundos privados para a franquia síria da Al Qaeda operam livremente em Doha, muitas vezes falando em mesquitas de propriedade do Estado e até ocasionalmente aparecendo na Al Jazeera.

O próprio Estado forneceu pelo menos alguma forma de assistência —seja abrigo, mídia, dinheiro ou armas— para o Taleban do Afeganistão, o Hamas de Gaza, rebeldes da Síria, milícias na Líbia e aliados da Irmandade Muçulmana em toda a região.

Agora, porém, o Qatar está se vendo sob forte ataque de um alinhamento de interesses improvável, que inclui a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Egito e Israel, todos os quais tentaram retratá-lo como padrinho de terroristas em toda parte.

Algumas pessoas em Washington o acusaram de apoiar diretamente o Estado Islâmico (EI) —facção extremista tão sanguinária que a Al Qaeda a condenou—, acusação que autoridades ocidentais, analistas independentes e diplomatas árabes críticos ao Qatar chamam de implausível e sem fundamento.

"Isso é apenas desinformação", disse Michael Stephens, um pesquisador baseado em Doha para o Instituto Real de Serviços Unidos, um centro de pesquisas britânico. "Eu não vou desculpar o que o Qatar fez: ele foi grosseiramente irresponsável em relação ao conflito sírio, como muitos outros países", disse.

"Mas dizer que o Qatar está por trás do EI é apenas retórica; é a política atrapalhando o rumo das coisas, e ela cega as pessoas para as soluções reais."

Impulsionando a enxurrada de acusações contra o Qatar há uma disputa de poder regional em que monarquias concorrentes do golfo Pérsico apoiaram representantes opostos em lugares disputados como Gaza, Líbia e especialmente Egito.

No Egito, o Qatar e a rede Al Jazeera apoiaram o antigo governo liderado por políticos da Irmandade Muçulmana. Outras monarquias do Golfo há muito tempo desprezam a Irmandade por considerá-la uma força organizada que poderia ameaçar seu poder interno, e apoiaram o golpe militar que depôs o presidente pró-islâmico.

Qatar é dificilmente a única monarquia do Golfo que permite a captação de fundos por xeques que o governo americano relaciona à franquia síria da rede terrorista Al Qaeda, a Frente al-Nusra.

O xeque Ajmi e a maioria dos outros estão baseados no Kuait e atraem facilmente doadores da Arábia Saudita, às vezes até fazendo suas propostas em redes de televisão de propriedade saudita e kuaitiana.

Autoridades do Tesouro dos EUA destacaram os dois emirados como "jurisdições permissivas" para a captação de fundos para grupos terroristas.

Em muitos casos, segundo vários analistas, o Qatar tentou equilibrar a aposta no futuro do islamismo político como força regional com o desejo de não alienar o Ocidente.

Ele voltou um olhar cego para a captação de fundos privados para grupos ligados à Al Qaeda para comprar armas na Síria, por exemplo, mas não forneceu financiamento ou armas diretamente pelo governo.

O Qatar diz que se opõe a todos os "grupos extremistas", incluindo o Estado Islâmico. "Rejeitamos suas opiniões, seus métodos violentos e suas ambições", disse recentemente o ministro das Relações Exteriores do Qatar, Khalid al-Attiyah.

Mas postagens na mídia social e aparições na televisão mostram que pelo menos meia dúzia de captadores de fundos para terroristas listados pelos EUA, alguns há vários anos, continuam frequentando Doha.

Em 2011, Harith al-Dari, um xeque iraquiano e líder tribal designado como captador terrorista em 2008, apareceu na Al Jazeera rezando na inauguração de uma mesquita estatal em Doha, a poucos passos do príncipe herdeiro do Qatar e atual regente do emirado, xeque Tamin Hamad bin Hamad al-Thani .

"Os países árabes não nos deixam discutir coisas com eles e nos queixarmos a eles —exceto um ou dois", disse o xeque Dari em uma entrevista na televisão em janeiro.

Ele falou na rede Al Jazeera do Qatar, emirado que evidentemente estava entre esses "um ou dois" países.

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