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 | lynsey addario para the New York Times
| Foto: lynsey addario para the New York Times

A noiva era muito jovem e tímida; ela passou a festa de noivado camuflada em um casaco com capuz que engolia seu corpo esguio, mas não conseguiu esconder o vestido rosa com babados que a família do noivo havia alugado para ela.

As mulheres sírias celebravam seu futuro casamento com um primo de 18 anos de idade, e tagarelavam ao seu redor no campo de refugiados de Zaatari, enquanto ela ficava em um canto, lendo mensagens em seu celular. A garota, Rahaf Yousef, tem 13 anos.

Ela declarou-se "indiferente" ao casamento, e diz que ele irá interromper sua educação. Mas parecia que ninguém estava ouvindo.

Para muitos sírios presos em miseráveis e por vezes perigosos campos de refugiados na Jordânia, casar as filhas cada vez mais jovens tem sido visto como uma necessidade — uma maneira de aliviar os encargos financeiros em famílias com pouca ou nenhuma renda e aliviar temores de estupro e assédio sexual em campos improvisados, onde é mais difícil fazer cumprir a lei. Como resultado, diz a Unicef, o número de casamentos envolvendo meninas com menos de 18 anos aumentou dramaticamente.

"Os pais acham que um homem pode proteger" suas filhas, disse Ola Tebawi, oficial da Jordan Health Aid Society, organização sem fins lucrativos que presta cuidados de saúde para refugiados.

Mas grupos de ajuda e de defesa das mulheres dizem que os sírios estão trocando perigos imediatos por outros de longo prazo, tais como violência doméstica, gravidez em idade vulnerável a complicações ou interrupção da educação.

Nos primeiros seis meses deste ano, 32 por cento dos casamentos registrados de refugiados sírios na Jordânia envolveram uma garota menor de 18 anos, de acordo com o governo jordaniano. Essa porcentagem é mais do que o dobro de 13 por cento dos casamentos na Síria antes da guerra que incluíam meninas menores, de acordo com a Unicef.

A maioria das meninas sírias se casam com membros de famílias jordanianas, relatou a Unicef, garantindo um lugar na Jordânia fora dos campos de refugiados e um novo país em longo prazo.

A lei jordaniana permite casamentos de meninas e meninos de 15 a 18 anos de idade, mas exige que um juiz de tribunal islâmico determine se todos os lados concordam.

O governo da Jordânia — que tem lutado para acomodar mais de 600.000 dos 3 milhões de sírios que fugiram de seu país — abriu um tribunal da Sharia no campo de Zaatari. Mas o ministro do desenvolvimento social, Reem Abu Hassan, disse que era difícil para os juízes dizer não aos casamentos. "Temos de ser práticos e ver os desafios que os sírios enfrentam", disse ela.

Defensores dos direitos humanos dizem que muitas mulheres chegaram à Jordânia apavoradas porque, como as Nações Unidas têm relatado, a violência sexual tornou-se uma "característica persistente da guerra na Síria".

Outour al Khasara, de 45 anos, refugiada que vive em uma fazenda perto do campo de Zaatari, disse saber muito bem que contar com o casamento como proteção pode ser uma ilusão.

Ela casou sua filha de 15 anos de idade, Jazia al Barhoum, no ano passado, com um primo distante para protegê-la da "incerteza que continua a assolar nosso futuro".

Vinte dias depois do casamento, Jazia disse, o marido começou a bater nela. Jazia rapidamente o deixou, mas retornou a pedido dos membros da família do marido. "Ele prometeu à minha família que iria me tratar bem", ela disse, "mas ele não mudou". No fim, o pai acabou levando-a para casa.

Outra jovem, Yasmeen Ritaj, de 16 anos, disse também apanhar do novo marido. "Eu imaginava que seria o paraíso", ela disse, "mas a primeira vez que ele me bateu, eu sabia que não havia nenhum futuro e que aquilo era o inferno". Ela voltou para sua família após oito meses de casamento.

Agências de ajuda e organizações estão alarmadas devido ao aumento no número desse tipo de casamento e por isso começaram a realizar campanhas de sensibilização.

Mesmo para quem acaba em casamentos tranquilos, os riscos podem ser graves. Hana Mohammad, de 16 anos, casou-se na Síria com um homem cuja família planejava deixar o país. Quando foram embora, ela estava grávida de oito meses. Logo depois que chegaram ao campo de Zaatari, seus problemas começaram. "Ela teve convulsões", disse o marido, Mohammad Ghazawi, de 26 anos.

Não se sabe se a jornada pelo deserto causou o colapso e o coma que se seguiram, mas a gravidez de adolescentes é considerada de risco, com maior probabilidade de ocorrência do que ela teve: eclâmpsia. O bebê nasceu bem, mas Hana continua a ter convulsões.

"Eu quase perdi minha esposa", disse Ghazawi. "Ela pagou o preço por engravidar tão cedo".

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