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O transtorno bipolar de Jonathan Stanley foi tratado com lítio em 1988. Seu pai doou uma fortuna para fomentar avanços no tratamento psiquiátrico | Max Reed/The New York Times
O transtorno bipolar de Jonathan Stanley foi tratado com lítio em 1988. Seu pai doou uma fortuna para fomentar avanços no tratamento psiquiátrico| Foto: Max Reed/The New York Times

Certo dia em 1988, Jonathan Stanley abandonou a faculdade e foi passear em Nova York, onde ficou convencido de que agentes do governo o estavam perseguindo.

Durante três dias e noites correu pela cidade e pelos túneis do metrô. Sua fuga acabou em uma lanchonete, onde subiu em uma caixa e tirou a roupa. A polícia o levou para um hospital e ele finalmente recebeu um tratamento eficaz, dois anos depois de ser diagnosticado com transtorno bipolar.

"A vida do meu filho foi salva", afirmou seu pai, Ted Stanley. Quando estava na faculdade, acrescentou, "esses medicamentos ainda não existiam; eu teria passado minha vida toda com um cérebro que não funciona direito".

O velho Stanley, de 84 anos, ganhou uma fortuna vendendo artigos colecionáveis, e criou uma fundação para apoiar a pesquisa psiquiátrica. "Queria comprar esse final feliz para outras pessoas" afirmou.

Em julho deste ano, a Fundação da Família Stanley doou 650 milhões de dólares para o Instituto Broad, do MIT e da Harvard, centro de pesquisa biomédica para o qual ele havia doado 100 milhões anteriormente. Essa foi uma das maiores doações privadas para a pesquisa científica da história. O dinheiro chega em um momento de crise para a pesquisa em doenças mentais. Apesar de décadas de pesquisas caras, os especialistas não aprenderam praticamente nada a respeito das causas de doenças psiquiátricas, nem desenvolveram novos medicamentos.

O Instituto Broad escolheu fazer o anúncio da doação no mesmo momento em que lançou a maior análise já feita a respeito da genética da esquizofrenia. A análise, publicada na revista Nature, identificava mais de 100 regiões do DNA associadas com a doença. Muitas delas contêm genes envolvidos em poucas funções biológicas, como bombear cálcio para os neurônios, e isso pode servir de guia para a busca por novos tratamentos. "Pela primeira vez em muito tempo temos um claro caminho a seguir", afirmou Eric Lander, presidente do Instituto Broad.

Especialistas que não têm ligação com o instituto caracterizaram a pesquisa como o primeiro passo de um longo processo. "Os sinais que encontraram são verdadeiros. Ponto final. E isso é muito encorajador", afirmou David B. Goldstein, geneticista da Universidade Duke, na Carolina do Norte. "Porém, ao mesmo tempo, eles não nos dão nenhuma indicação a respeito do funcionamento concreto da doença, nenhum alvo claro para o desenvolvimento de um medicamento. Isso significa que ainda há muito trabalho a ser feito". Jonathan Stanley, que agora tem 48 anos, não sabe explicar como desenvolveu o transtorno bipolar aos 19 anos de idade. Tudo o que ele sabe é que seu cérebro reagiu bem ao lítio. Com o medicamento, foi capaz de retornar à universidade, se formar em direito e se tornar advogado. "Estamos falando de uma cara que passou de psicótico a uma pessoa normal com um punhado de pílulas", afirmou.

Quando os cientistas descobriram medicamentos psiquiátricos como o lítio em meados do século XX, a maioria das descobertas foi obra do acaso. Durante anos, tentaram descobrir se o funcionamento desses medicamentos indicaria algo sobre a causa das doenças, mas acabaram de mãos vazias. Alguns pesquisadores argumentaram que uma estratégia melhor seria descobrir quais genes estão envolvidos nas doenças psiquiátricas. Essa abordagem criaria novos alvos moleculares para o teste de medicamentos.

O novo artigo da revista Nature representa o apogeu de uma iniciativa do Instituto Broad em parceria com diversos outros grupos de pesquisa. O consórcio analisou 37.000 pessoas com esquizofrenia, além de 114.000 que não apresentavam o transtorno. Ao final, a pesquisa revelou 83 regiões do genoma ligadas à esquizofrenia que não haviam sido identificadas anteriormente, além de confirmar outras 25 regiões que já tinham sido identificadas, levando o total a 108.

Pesquisas recentes revelaram que mutações no mesmo gene são capazes de causar uma série de problemas no cérebro, incluindo autismo, esquizofrenia e epilepsia. "Estamos identificando o mesmo gene por trás de diferentes problemas psiquiátricos", afirmou o Dr. Goldstein. "Não fazemos ideia de por que isso ocorre e a única forma de descobrir é mergulhando de cabeça na biologia para descobrir não apenas quais são os genes mais importantes, mas qual é sua função". O novo estudo publicado pela revista Nature revelou muitas variantes de risco reunidas em torno de algumas funções corporais específicas, como o sistema imunológico e a transmissão de cálcio para os neurônios.

Para compreender a biologia desses processos, os pesquisadores do Instituto Broad planejam desenvolver neurônios com as mutações que descobriram, tentando ver como diferem de células normais. Eles irão modificar geneticamente algumas cobaias para descobrir como os cérebros serão afetados. Os cientistas esperam que esses experimentos levem a hipóteses a respeito da biologia por trás dos transtornos psiquiátricos – que serão testadas por medicamentos que afetem moléculas nos cérebros das cobaias. Esses estudos serão muito caros e é aí que entra a Fundação Stanley. No ano passado, depois da morte de sua esposa, Vada, Ted Stanley começou a pensar sobre o que faria com sua fortuna. Ele concluiu que a primeira doação feita ao Instituto Broad não era suficiente. "Depois que eu morrer", afirmou, "quero que o dinheiro chegue a eles como se eu ainda estivesse vivo".

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