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Submarino da Marinha Russa transita pelo Mar Negro, em frente à Mesquita Azul de Istambul, na Turquia, em 13 de fevereiro de 2022: exercícios maciços em meio às tensões entre a Rússia e a Ucrânia
Submarino da Marinha Russa transita pelo Mar Negro, em frente à Mesquita Azul de Istambul, na Turquia, em 13 de fevereiro de 2022: exercícios maciços em meio às tensões entre a Rússia e a Ucrânia| Foto: EFE/EPA/ERDEM SAHIN

Desde que colocou as forças nucleares da Rússia em alerta máximo, o presidente Vladimir Putin tem enviado recados ao Ocidente sobre o uso de armas nucleares. Bravata ou não – a verdade é que é difícil prever até onde Putin iria para sair vitorioso do conflito – uma guerra nuclear tem o potencial de atingir gravemente quase 100 milhões de pessoas, somente nas primeiras horas. É o que mostra uma simulação feita por pesquisadores do Programa Ciência e Segurança Global, da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos.

O estudo, de 2019, afirma que um confronto nuclear entre Estados Unidos e Rússia, desencadeado por armas de baixo rendimento, resultaria em 34,1 milhões de mortos e 57,4 milhões de feridos, em poucas horas. Juntos, os dois países detêm mais de 90% dos arsenais mundiais. O total de mortos pode ser bem maior, pensando nas consequências de médio e longo prazo, que incluem precipitação radioativa e resfriamento global.

Mudanças climáticas

Uma guerra nuclear entre Estados Unidos e Rússia mergulharia o planeta em um inverno nuclear, segundo cientistas americanos. Em 2019, Joshua Coupe, Charles G. Bardeen, Alan Robock e Owen B. Toon publicaram um artigo no periódico científico Atmospheres, alertando para uma queda média de quase 10 graus Celsius na temperatura global. A mudança seria decorrente da falta de luz solar atingindo o solo, após explosões nucleares.

O modelo de simulação adotado pelos pesquisadores mostra que por volta de 150 toneladas de fuligem seriam liberadas, caso as duas potências lançassem todas as suas ogivas no território uma da outra. Isso seria suficiente para cobrir de fumaça o Hemisfério Norte em uma semana e a Terra toda em 15 dias. Os níveis de luz na superfície seriam bastante reduzidos e levaria em torno de uma década para voltarem ao normal.

"O uso de armas nucleares dessa maneira pelos Estados Unidos e pela Rússia teria consequências desastrosas globalmente", escreveram os pesquisadores.

Fome

As mudanças radicais no clima e na atmosfera poderiam gerar um efeito cascata, atingindo as plantações, o que mataria bilhões por fome. O risco de que uma guerra nuclear dizime a civilização foi sinalizado há quase dez anos, por um estudo dos vencedores do Prêmio Nobel da Paz Associação Internacional de Médicos para a Prevenção da Guerra Nuclear (IPPNW, em inglês) e Médicos pela Responsabilidade Social (PSR).

Um confronto nuclear hipotético entre Índia e Paquistão teria o potencial de atingir severamente mais de 2,3 bilhões de seres humanos pela fome e insegurança alimentar, em todo o mundo. Foi o que afirmaram os autores do levantamento, em 2013.

"Com uma grande guerra entre Estados Unidos e Rússia, estamos falando da possível – não certa, mas possível – extinção da raça humana", ponderou à época Ira Helfand, um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo.

Levando em conta que as armas nucleares modernas são muito mais potentes do que as bombas americanas que mataram mais de 200 mil pessoas nas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, em 1945, qualquer guerra nuclear atualmente teria “impacto apocalíptico”, na opinião de Helfand.

Rússia lidera posse de ogivas

Um ranking divulgado pela Federação de Cientistas Americanos (FAS, em inglês) afirma que, no início de 2022, nove países possuíam 12.700 ogivas nucleares. A Rússia lidera a lista, com 5.977 armas nucleares. Os EUA aparecem na segunda posição, com 5.428. China (350), França (290), Reino Unido (225), Paquistão (165), Índia (160), Israel (90) e Coreia do Norte (20) vêm na sequência.

O cenário é ainda mais aterrorizante se for levado em consideração que, apesar dos arsenais nucleares estarem diminuindo desde a Guerra Fria (em 1986, havia mais de 70 mil ogivas), o ritmo atual de redução é menor em comparação com o dos últimos 30 anos. E parte dessa diminuição é resultado de Estados Unidos e Rússia se desfazendo de armas antigas que foram aposentadas. A FAS aponta, ainda, para a tendência de que países como China, Índia, Coreia do Norte, Paquistão, Reino Unido, e possivelmente a Rússia, estejam aumentando seus estoques.

Putin apertaria o botão?

Na terça-feira (1), submarinos nucleares russos em exercício militar foram vistos no Mar de Barents, que fica no norte do país, de acordo com a Associated Press. Os testes, justificados pela Rússia como treinos de “manobras em condições de tempestade”, soaram para o Ocidente como uma ameaça do presidente Vladimir Putin.

O chefe da delegação da União Europeia (UE) na Federação Russa, Markus Ederer, afirmou nesta quinta-feira (3) que as autoridades russas estão discutindo a possibilidade de utilizar armas nucleares de forma "tática", com o objetivo de desescalar o conflito causado pela invasão da Ucrânia.

"Nos círculos correspondentes há um debate sobre o uso de armas nucleares táticas, não é o 'armagedom' nuclear, mas para mostrar que se o inimigo continuar seus avanços, as armas nucleares são uma opção", disse Ederer durante um pronunciamento no Subcomitê de Direitos Humanos do Parlamento Europeu. As informações são da agência EFE.

Para o jornalista russo Dmitry Muratov, vencedor do Prêmio Nobel da Paz de 2021 e editor-chefe do jornal independente Novaya Gazeta, "há uma ameaça real de guerra nuclear".

"Nesse discurso de TV (em 24 de fevereiro, quando começou a invasão da Ucrânia), Putin não estava agindo como o dono do Kremlin, mas o dono do planeta; da mesma forma que o dono de um carrão fica se exibindo girando seu chaveiro no dedo, Putin estava girando a bomba nuclear. Ele disse muitas vezes: se não existisse a Rússia, por que precisaríamos do planeta? Ninguém prestou atenção. Mas isso é uma ameaça de que, se a Rússia não for tratada como ele quer, tudo será destruído", analisou Muratov, em reportagem da BBC.

Apesar de ter colocado em "regime especial de serviço" as forças nucleares do país, no dia 27 de fevereiro, o mandatário russo não teria intenção de apertar "o botão vermelho nuclear". É o que garantiu a porta-voz do Ministério das Relações russa, Maria Zakharova, afirmou nesta quarta-feira (2), segundo a agência EFE.

"Partimos do ponto de que este roteiro apocalíptico não será realizado sob nenhum pretexto e sob nenhuma condição", disse a representante russa à emissora colombiana W Radio.

Segundo a doutrina russa de dissuasão nuclear, aprovada por Putin em 2020, que é de natureza defensiva, o Kremlin se reserva o direito de atacar com armas nucleares em caso de agressão externa ou de ameaça à sobrevivência do Estado.

Entre as situações de perigo previstas pelo documento está a utilização pelo inimigo de armas nucleares ou outras armas de destruição em massa contra o território da Rússia ou os seus aliados, além de ações contra instalações estatais ou militares vitais para o país, que o levem a perder o controle sobre o comando nuclear.

A agressão externa com o uso de armamento convencional que ameace "a própria existência do Estado" seria também motivo para uma resposta nuclear. A Rússia também pode recorrer a armas nucleares caso receba informações críveis sobre o lançamento de um míssil balístico contra seu território ou de aliados.

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