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Chhay Yao, 76 anos, com sua medicação antirretroviral. Dezesseis pessoas de sua família foram infectadas com o vírus HIV | Nicolas Axelrod para The New York Times
Chhay Yao, 76 anos, com sua medicação antirretroviral. Dezesseis pessoas de sua família foram infectadas com o vírus HIV| Foto: Nicolas Axelrod para The New York Times

Fragilizada e deprimida depois de receber o diagnóstico, Chem Mao decidiu se enforcar na mangueira em seu quintal, mas ao caminhar lentamente ao lado da casa da família rumo ao pomar, viu os netos brincando e desistiu da ideia.

"Não tinha força para subir na árvore. Quem sabe eu tente de novo mais tarde", disse.

Chem tem 55 anos e é uma das mais de 200 pessoas nesse vilarejo agrícola do oeste do Camboja a receber um resultado positivo do exame de HIV em dezembro. Segundo as autoridades, um médico não qualificado que reutilizou seringas foi quem disseminou a infecção.

As vítimas estão em todos os lugares: nas palafitas, nos arrozais, nos templos budistas à entrada da aldeia e no playground da escola primária. O abade de 82 anos foi infectado, assim como doze crianças. A cinco minutos do templo há um punhado de casas onde 16 membros de uma mesma família foram contaminados.

O que essas pessoas parecem ter em comum é o fato de todas terem sido tratadas por Yem Chrin, médico local acusado de homicídio qualificado, transmissão intencional do vírus e prática da Medicina sem qualificações. Ele aguarda julgamento.

O promotor da província, Nuon San, informou que diversas pessoas já morreram de Aids na região e que as autoridades estão investigando para saber se Chrin seria responsável.

De acordo com a filha, Chrin Reaksa, ele é um dos sete supostos "profissionais" que atendem no vilarejo, mas recebeu treinamento como enfermeiro em um campo de refugiados após a queda do Khmer Vermelho, em 1979. "Quando se mudou para Roka, o pessoal começou a procurá-lo pedindo ajuda, então passou a atender. O governo nunca se preocupou com a falta de qualificação", contou.

Muitos moradores, mesmo os infectados, defendem Chrin, descrevendo-o como um homem gentil que cuidava de todos, inclusive os que não podiam pagar.

"Sinceramente? Não acho que foi o doutor que fez isso, não. Ele era muito limpo. E não é uma pessoa ruim", opinou Chhay Yao, 76 anos, matriarca da família que tem 16 membros doentes.

Seu marido, Prum Em, de 84 anos, só comentou: "É inconcebível que nossa família tenha tamanho azar".

Uma das doentes, Em Seiha, 23 anos, desmaiou ao saber que estava infectada. "Fiquei morrendo de medo que meu marido achasse que eu estava tendo um caso", revelou.

Soeun Sophath, vice-diretor da clínica pública de saúde local, explicou que o primeiro sinal de que havia algo errado veio em agosto, quando uma grávida, em exame de rotina, constatou que estava com Aids. Quando a situação se repetiu em novembro, e também incluiu um idoso e sua nora, os moradores entraram em pânico e foram em massa à clínica para o exame. O resultado de dezenas deu positivo.

"Tinha gente chorando, rastejando no chão, se abraçando. Eu também não parava de chorar. Entrei em estado de choque", relembra Soeun.

A infecção não é mais uma sentença de morte e o governo fornece os antirretrovirais à população gratuitamente.

Apesar de tudo isso, nem todos são condescendentes com Chrin.

"Quero picá-lo em pedacinhos. Quero torturá-lo. A minha vontade é de fazer o mesmo com a família dele para ver o que é bom", diz, furiosa, Chhay Yao.

Agricultores cambojanos foram infectados e o médico que tratava da comunidade foi preso.

Contribuiu Vannarin Neou

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