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 | ANDREW THOMAS HUANG; ABAIXO, THE NEW YORK TIMEs
| Foto: ANDREW THOMAS HUANG; ABAIXO, THE NEW YORK TIMEs
  • O novo álbum de Björk está mergulhado nas emoções cruas resultantes do fim de sua relação de treze anos com o artista Matthew Barney

REYKJAVIK, Islândia — Não era exatamente um dia para se ir à praia: a manhã de novembro estava fria e úmida, com uma garoa intermitente que se transformou em chuva. Björk se refere ao clima como "tempo de resfriado"; ela e a equipe de filmagens estavam em Grotta, farol localizado em um trecho litorâneo isolado que a estrela costuma alugar quando quer se isolar e compor.

A maré e a luz invernal fugidia lhe deram apenas algumas horas para fazer o vídeo que transformou "Stonemilker", a primeira música de trabalho do novo álbum, "Vulnicura", no grand finale, em imagens panorâmicas em 3D, da retrospectiva sobre a cantora no Museu de Arte Moderna de Nova York, que será inaugurada em oito de março.

Björk se colocou, como muitas vezes o fez ao longo da carreira, no limiar da natureza e da tecnologia, das emoções cruas e do artifício complexo. Ela sempre se autodenomina "artista pop", mas a classificação é, no mínimo, modesta para alguém que, há pelo menos trinta anos, faz experimentos constantes com sons, estruturas e imagens que acompanham a comunicação elemental de sua voz gentil e marcante.

Björk explica em seu site que "Vulnicura" é um álbum de "mágoa total"; as canções falam do afastamento, separação e superação que se seguiram ao fim da relação com o artista Matthew Barney. "Geralmente não falo da minha vida particular, mas não há dúvida sobre esse álbum. Eu me separei durante sua produção, acabei com um relacionamento de treze anos, o que talvez tenha sido a coisa mais difícil que fiz até hoje".

E acrescenta: "É mais ou menos como uma cirurgia de peito aberto, com os bisturis abrindo a carne; fica tudo exposto, há uma urgência, um imediatismo ímpar. Tem que acontecer já, você tem que se expressar. Ao mesmo tempo, sempre sente como se tudo pertencesse a outra força. Não é nada seu, é como se fosse a corrente da energia universal da dor... ponto com que faz você refém", diz ela com uma risada.

Durante toda a carreira, a música de Björk fundiu elementos mundanos e etéreos das formas mais variadas; ela fez álbuns que extrapolaram a batida club dance ("Post"), construídos quase que totalmente em cima de sons vocais ("Medulla") e marcados pelos tons da harpa e das caixinhas de música ("Vespertine"). O trabalho de 2011, "Biophilia", contou com um coral islandês e instrumentos mecânicos inovadores que serão exibidos — e ouvidos — no saguão do MoMA.

A artista é séria, mas também sabe relaxar. Depois de inúmeras tomadas no frio inclemente, Björk convidou a equipe e alguns amigos de Reykjavik para irem à sua casa para a festa de encerramento – que também era de seu 49«aniversário.

Sua casa é aconchegante, com toques surpreendentes de natureza adaptada ao ambiente fechado: um candelabro esférico feito de penas brancas, uma escadaria de pedra cuja balaustrada é feita com ossos de baleia-de-minke (não ameaçada). Do estúdio, no andar superior, dá para ver uma cena marinha: a montanha em forma de cone, a praia de areia escura e o céu islandês, sempre mutante.

Quando estava prestes a tocar uma música no laptop, fez uma pausa. "Olha que nuvem doida! É um triângulo meio embaçado, enquanto todas as outras são bem fofas e definidas". Um pouco como suas novas canções, sons eletrônicos com limites indistintos combinados a um conjunto efervescente e bem definido de cordas e vocais.

As músicas de "Vulnicura" são ao mesmo tempo premeditadas — Björk compõe seus próprios arranjos — e resolutamente desprotegidas, com a voz da cantora aberta e exposta. "Praticamente não mudei nada", informa.

As primeiras seis canções são uma cronologia da separação, desde a suspeita de que a união estava se desgastando até a aceitação do fim. "Na época eu fiquei muito rabugenta, parecia uma adolescente, porque não suportava a ideia da banalidade da coisa. Mas é verdade, quando você passa pela situação, as canções simplesmente fluem".

A música mais sombria e corajosa é "Black Lake", que, segundo o encarte, foi feita "dois meses após o fim". "Minha alma está despedaçada, meu espírito, alquebrado", canta Björk, as cordas por trás dela em acordes escancarados e austeros. Ao fim dos versos, eles se sustentam, durando mais que o canto em um movimento arrepiante e deliberado.

Apesar disso, durante as gravações, "Black Lake" ganhou um formato tecnológico cuidadoso – e junto de "Stonemilker", faz parte do "novo trabalho" da mostra do MoMA. Durante as sessões, cada um dos trinta músicos foi gravado individualmente; o museu está montando uma sala com inúmeros alto-falantes que permitirão ao visitante ouvir cada faixa separadamente, como uma experiência espacial.

Durante a mostra os visitantes devem usar fones de ouvido para explorar cada sala — que corresponde a cada um dos álbuns solo da cantora, com direito às roupas, vídeos e gravações experimentais. O guia também inclui uma narrativa biográfica fictícia.

"Vai ser uma cacofonia e tanto. É claro que assumi alguns riscos, mas se a coisa não for perigosa, não vale a pena ser realizada", conclui Björk.

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