Paris O Papa Bento XVI, que é menos visível que seu notável predecessor João Paulo II, reuniu filósofos, teólogos e sábios a portas fechadas nos últimos três dias em sua residência em Castelgandolfo. O objeto dos debates é a teoria da evolução.
Essa teoria foi elaborada por Charles Darwin em 1859 em seu livro "A Origem das Espécies", obra considerada sacrílega e revolucionária à época porque atribuía a transformação das espécies a dois fatores: acaso e seleção natural. Em poucas palavras, ela desconsidera a Bíblia e a interferência de Deus.
A Igreja não ficou nada contente. Foi respaldada no seu combate antidarwinista pelos "criacionistas" defensores de uma leitura literal da Bíblia e inimigos do materialismo. Para estes, o mundo foi criado por Deus, a partir do nada.
Com o passar do tempo, o darwinismo se impôs em toda parte, exceto em algumas regiões dos Estados Unidos que continuam lutando do lado da Bíblia. Ainda em 1925, os criacionistas conseguiram impor uma multa de US$ 100 a um professor, John Scopes, que ousou "falar" de Darwin a seus alunos.
Mais tarde, os antidarwinistas mudaram de tática. Eles forjaram uma nova teoria, a do "design inteligente", ou planejamento inteligente. Nem uma palavra sobre a Bíblia ou Deus. Mas reza essa teoria que estruturas tão complexas como as da vida só poderiam ter sido forjadas por uma "Inteligência", outro nome para Deus, em suma.
Na Europa, a atitude é de escárnio. Idéias como esta só podem aparecer em cérebros obsoletos, obscuros e, de preferência, "texanos". Mas isso não é exato. Por exemplo, existe há dez anos uma "faculdade livre" em Paris (a UEP, Unités dEnseignement Professionnel) que brinda seus alunos com um ensino criacionista ministrado freqüentemente por professores de primeira linha. É bem verdade que essa faculdade recebe um patrocínio da ordem de US$ 1 milhão anual da John Templeton Foundation norte-americana.
O Papa João Paulo II, que foi um vigoroso teólogo, havia tentado distanciar o Vaticano de qualquer associação com antidarwinistas. Em 1996, ele declarou que a "teoria de Darwin é mais que uma hipótese."
Hoje, Bento XVI recoloca o assunto em discussão. Essa reunião de Castelgandolfo, importante e de alto nível, é testemunha disso.
Em abril de 2005, diante dos jovens da Diocese de Roma, ele havia feito "a opção da prioridade da razão criadora no começo de tudo e como princípio de tudo." E rejeitado a idéia segundo a qual "tudo que funciona sobre a terra e em nossas vidas seria apenas ocasional e um produto do irracional."
Alguns concluíram, a partir dessas fórmulas, que o colóquio de Castelgandolfo poderá ser o prenúncio de uma adesão do Vaticano à teoria do "design inteligente". Aguardemos. O Vaticano é uma instituição antiga e poderosa que tem por hábito ir com calma, e conta o tempo em séculos, e não em anos e, menos ainda, em dias. Tudo que nos resta, por enquanto, é captar os rumores que filtrarão pelas paredes do encontro de Castelgandolfo.
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