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A polonesa Marie Curie (1867-1934), que ganhou o Prêmio Nobel de Física em 1903: exceção que confirma a regra | Bettman/Corbis
A polonesa Marie Curie (1867-1934), que ganhou o Prêmio Nobel de Física em 1903: exceção que confirma a regra| Foto: Bettman/Corbis

Um relatório da Associação Ame­­­­ricana de Mulheres no En­­sino Su­­perior constata a baixa representatividade delas nas ciências e na matemática e revela que, em­­bora o sexo feminino te­­nha obtido avanços, estereótipos e julgamentos sociais tendenciosos ainda são obstáculos ao sucesso das mulheres.

O relatório "Por que tão poucas?", financiado pela Fundação Nacional para a Ciência, examinou décadas de pesquisas para reunir recomendações que ajudem a atrair mais mulheres para as áreas de ciência, tecnologia, en­­genharia e matemática, chamadas genericamente de "exatas".

"Vasculhamos a literatura re­­ferente a pesquisas de aplicabilidade imediata", explica Catherine Hill, diretora de pesquisa do instituto responsável pelo relatório e sua principal autora. "Desco­­bri­­mos uma série de pequenas coisas que podem fazer a diferença, como cursos de habilidades espaciais para mulheres ingressando em carreiras de engenharia, ou ensinar as crianças que matemática não é um talento dado, mas resultado de dedicação."

O trabalho roça de leve na polêmica questão sobre se diferenças inatas entre os sexos têm influência na escassez de mulheres nos níveis mais altos das ciências e da matemática.

Discriminação

Cinco anos atrás, Lawrence H. Sum­­mers, então reitor de Har­­vard, provocou uma tormenta ao sugerir que "existem áreas em que vale a competência intrínseca, e particularmente aquelas em que há diferenças de competência" reforçadas por "fatores de menor peso envolvendo socialização e contínua discriminação".

O relatório da associação reconhece diferenças entre os cérebros de homens e mulheres. Mas, afirma Hill, "nenhuma pesquisa é convincente ao relacionar essas diferenças a competências específicas, de modo que não sabemos o que significam quando se fala em habilidades matemáticas".

No nível mais alto da matemática, onde há presença maior de meninos, o relatório revelou que a distância entre os gêneros está encolhendo rapidamente. Entre jovens matemáticos precoces – estudantes da sexta e da sétima séries com pontuação maior do que 700 em testes-padrão da ma­­téria – havia, 30 anos atrás, 13 me­­ninos para uma menina, mas hoje são apenas três para uma.

"Não é a biologia que está em jogo; isso não muda assim tão rá­­pido", observa Hill.

"Mesmo que haja fatores biológicos envolvidos para que aí os meninos sejam mais numerosos do que as meninas, claramente eles não contam a história toda. Há um perigo real em aceitar que diferenças inatas sejam importantes na definição de quem será bem-sucedido, de modo que olhamos para fatores culturais para ver que evidências existem do lado da cultura, na questão natureza ou cultura."

O relatório encontrou ampla comprovação sobre um constante viés de caráter cultural. Um estudo com candidatos a vagas de pós-doutorado, por exemplo, descobriu que as candidatas precisavam ter publicado três artigos a mais em periódicos de prestígio, ou vinte a mais em publicações menos conhecidas, para serem con­­sideradas tão produtivas quan­­to os candidatos homens.

Julgar as habilidades individuais com base no sexo de al­­guém é uma clássica forma de discriminação, afirma Nancy Hopkins, professora de biologia do Mas­­sachusetts Institute of Techno­­logy (MIT). Nos anos noventa, ela criou alvoroço no meio acadêmico ao documentar formas disseminadas, embora em grande parte não-intencionais, de discriminação con­­tra as mulheres na universidade.

Ainda que, em número, os gê­­nios matemáticos do sexo masculino superem os do sexo feminino na proporção de três para uma, calcula Hopkins, seria razoável esperar que houvesse uma professora de matemática para cada três professores homens da matéria em lugares como Harvard e o MIT. "Mas, na verdade, Harvard acaba de admitir sua primeira professora em 375 anos", lembra Hopkins, que ganhou fama por ter abandonado o recinto quando o reitor Summers fazia suas controversas declarações.

Experimento

O relatório da associação das mu­­lheres no ensino superior cita pesquisas mostrando que o de­­sem­­penho das meninas sofre as consequências de qualquer menção a que elas seriam piores em matemática. Num dos experimentos, estudantes universitários com formação sólida e habilidades si­­milares na matéria foram divididos em dois grupos e testados. A um dos grupos foi dito que os ho­­mens se sairiam melhor naquele tipo de teste, enquanto ao outro foi informado que não haveria diferença de performance entre os sexos. Os resultados foram subs­­tancialmente diferentes: no grupo que tinha a informação da superioridade masculina, os homens de fato se saíram melhor, com uma pontuação média de 25 contra 5 das mulheres. No grupo a que fora informado não haver diferença entre os sexos, as mu­­lheres pontuaram, em média, 17 e os homens, 19.

Qualquer sugestão de vantagem baseada no critério de sexo afeta os resultados, mostra a pesquisa, mesmo que não chegue a ser um estereótipo cultural. Por­­tanto, ensinar às meninas que os estereótipos afetam seu desempenho pode minimizar consequências, diz o relatório.

O relatório descobriu que as meninas têm menos confiança em suas habilidades matemáticas do que os meninos, mesmo com notas semelhantes às deles. Como a maioria das pessoas escolhe carreiras nas quais acha que pode se dar bem, afirma o relatório, a confiança menor das meninas em sua própria competência poderia explicar, em parte, por que um nú­­mero menor de mulheres jo­­vens abraça carreiras científicas. Ambas as pesquisas, também a da Bayer, enfatizam a necessidade de haver mais mentoras e inspiradoras nessas carreiras.

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