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O assassinato de dois policiais que estavam sentados num carro-patrulha no Brooklyn, sábado à tarde, mergulhou o prefeito de Nova York, Bill de Blasio, na maior crise de seu governo, que completa um ano em janeiro. No rastro de um inflamado debate nacional sobre policiamento e racismo, a emboscada — cometida por um homem negro que prometera nas redes sociais vingança pelos casos Michael Brown e Eric Garner — elevou a tensão de uma relação que já nasceu complicada e vinha crescendo nas últimas semanas: De Blasio, que fez da reforma da polícia uma de suas principais promessas de campanha, é acusado de não apoiar os agentes durante as manifestações que ainda agitam (embora em menor escala) a cidade.

Na segunda-feira, o prefeito — que visitou a família das vítimas, discursou num almoço na Liga Atlética da Polícia e concedeu uma entrevista coletiva no fim da tarde, sem conter a emoção em diversos momentos — pediu que protestos e debates políticos sejam suspensos até o funeral dos policiais, marcado para sexta-feira e sábado. De Blasio também convocou os cidadãos a denunciarem imediatamente qualquer mensagem com más intenções que vejam na internet, o que, segundo ele, é uma obrigação em tempos de mídias sociais.

— Esse deve ser um tempo para qualquer nova-iorquino pensar nessas famílias. Foquem nessas famílias, coloquem-nas em primeiro lugar. Podemos fazer isso respeitando a sua dor. Peço que os protestos sejam deixados de lado até que esses funerais sejam passado. Vamos focar nas famílias e no que elas perderam — disse, na sede do Departamento de Polícia de Nova York.

Mais cedo, o secretário de polícia, William Bratton, havia afirmado num programa de TV que o assassinato dos policiais é "um resultado direto" das manifestações que transformaram Nova York no epicentro da comoção racial que tomou o país desde que um grande júri optou pelo não indiciamento do agente que deu uma gravata mortal no camelô Eric Garner, em Staten Island, dias depois de o mesmo ter acontecido no caso Michael Brown, em Ferguson, Missouri. As duas vítimas eram negras e estavam desarmadas. Quase sempre pacíficos, os protestos em Nova York foram marcados por fortes xingamentos aos oficiais encarregados de manter a ordem.

PRECAUÇÃO POR PARTE DA POLÍCIA A política de janelas quebradas de Bratton, que consiste em coibir ofensas menores, foi muito criticada nas manifestações (Garner vendia cigarros avulsos ilegalmente na rua ao ser abordado). No calor das manifestações, De Blasio — que durante a campanha à prefeitura saiu em cruzada contra o que considera abusos da polícia na era de seu antecessor, Michael Bloomberg — anunciou o retreinamento de policiais. Antes, havia afrouxado as penas por porte de maconha.

Apesar de reconhecer que o prefeito "perdeu a confiança de alguns oficiais", Bratton defendeu De Blasio, desculpando-o pela crescente ameaça enfrentada pela polícia. Mas a ofensiva não para de crescer. No sábado, dezenas de policiais viraram-se de costas quando o prefeito chegou ao hospital onde estavam as vítimas. No domingo, o líder do principal sindicato da categoria declarou que ele "tem sangue nas mãos". E até o ex-prefeito Rudolph Giuliani, de quem Bratton foi secretário nos anos 1990 — quando a histórica redução de crimes foi creditada em grande parte à sua política de tolerância zero —, o acusou de promover um clima de violência ao "não policiar as manifestações devidamente".

As reprimendas ao fato de o prefeito não ter se posicionado com veemência contra a retórica das ruas já vinham ganhando força mesmo antes do incidente de sábado. Na semana passada, sindicatos comunicaram aos policiais que eles poderiam barrar De Blasio de eventuais funerais de oficiais, em protesto contra o que consideravam falta de apoio à polícia. O prefeito tem elogiado a conduta da corporação, mas também expressa simpatia pelos manifestantes. A gota d'água foram os comentários sobre ter alertado seu filho, um adolescente negro, a tomar "cuidado especial" ao interagir com a polícia.

Desde sábado, a tática da precaução passou a imperar no Departamento de Polícia. Agentes que fazem patrulha a pé foram orientados a trabalhar em duplas. As rondas de assistentes — voluntários desarmados que agem como olhos e ouvidos das autoridades — estão canceladas. E os detetives, que geralmente operam sozinhos ou em pares, passaram a fazê-lo em trios. Aos 28 anos, Ismaaiyl Brinsley, o assassino dos policiais Rafael Ramos, de 40 anos, que estava casado há apenas dois meses, e Wenjian Liu, de 32, pai de um adolescente de 13, atirou contra uma ex-namorada (que sobreviveu) em Baltimore antes de viajar a Nova York e se suicidou numa estação de metrô após atacar os agentes. Nascido no Brooklyn, onde sua mãe mora até hoje, ele tinha um histórico de 20 detenções e uma sentença de prisão por disparar um revólver roubado na rua. Brinsley também sofria de problemas mentais e havia tentado se matar há um ano. Ao embarcar num ônibus rumo a Nova York, ele publicou nas redes sociais que queria matar policiais.

De férias no Havaí, o presidente Barack Obama condenou a tragédia no sábado à noite, dizendo que os homens que servem as suas comunidades merecem respeito e gratidão diariamente.

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