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O ditador venezuelano, Nicolás Maduro, durante visita a Brasília no final de maio
O ditador venezuelano, Nicolás Maduro, durante visita a Brasília no final de maio| Foto: EFE/André Borges

A prisão de 33 homens na sauna Avalon Club, realizada em julho pela polícia da cidade de Valencia, capital do estado de Carabobo, no norte da Venezuela, é apenas um dos diversos casos de repressão e perseguição do regime socialista de Nicolás Maduro contra a comunidade LGBT venezuelana.

A arbitrariedade, que afeta praticamente todos os cidadãos que vivem no país, principalmente os que se opõem ao regime chavista, atingiu desta vez homens que participavam de uma festa privada.

Segundo informações de ONGs que acompanham o caso, no momento da prisão, os homens foram acusados de atentado ao pudor, aglomeração e poluição sonora. Eles foram levados sob custódia e tiveram ainda suas fotos divulgadas nas redes sociais, o que acabou expondo-os ao escárnio público e colocando em risco sua integridade física e psicológica.

Os homens foram liberados após pagar fiança, mas ainda teriam que se apresentar à Justiça periodicamente. O dono do local e os dois massagistas, inclusos nas detenções, foram liberados após também pagar uma fiança.

Um dos presos, Iván Valera, disse em entrevista à agência de notícias France-Presse que estava apenas conversando com um amigo quando foi abordado pelos policiais.

“Em nenhum momento eles nos contaram o que estava acontecendo, o que nos disseram é que estávamos em flagrante de um crime”, afirmou.

No começo deste mês, mais de 130 ONGs da Venezuela e de todo o mundo lançaram um apelo conjunto, demandando “justiça e liberdade plena” para os 33 homens que foram presos. Sob a bandeira "ser LGBTIQ+ não é crime", essas ONGs enfatizaram a importância da proteção dos direitos e da integridade dos detidos.

Em uma carta dirigida ao regime de Nicolás Maduro, as organizações exigiram o arquivamento do processo criminal que está em curso contra os homens, a garantia da segurança “física e psicológica” deles e uma “investigação transparente sobre o papel do Ministério Público, juiz e policiais” envolvidos no caso.

As organizações consideraram as prisões arbitrárias e reiteraram sua oposição à criminalização da orientação sexual, sob o argumento de que tal medida vai contra os princípios estabelecidos na Constituição da Venezuela e nos tratados internacionais de direitos humanos que foram ratificados pelo país.

As ONGs ainda condenaram veementemente a crescente política de “homofobia estatal” e destacaram a necessidade de “proteção para a comunidade LGBTIQ+” na Venezuela.

Os 33 homens ainda enfrentam acusações que incluem os crimes de “injúrias indecentes”, “formação de quadrilha” e “poluição sonora".

No último dia 3, a Aliança Nacional LGBTI+ e a Rede GayLatino lançaram uma nota conjunta condenando as prisões que ocorreram na Venezuela. As organizações afirmaram que “este caso pode indicar uma intensificação da perseguição a pessoas LGBTI+ e a espaços que servem para esta comunidade, sem previsão legal e por meio de medidas arbitrárias”.

As duas entidades informaram que enviariam um ofício ao Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos, ao UNAIDS, ao Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, à Terceira Comissão da Assembleia Geral, que trata de temas sociais, ao Instituto em Políticas Públicas em Direitos Humanos do Mercosul e ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil para pedir explicações sobre o caso, e que ainda pretendiam “pedir uma audiência na Organização dos Estados Americanos para discutir o aumento das violências” contra os LGBTs na Venezuela.

Em depoimentos à rádio WTC Valencia, dois dos homens que foram liberados relataram terem sido vítimas de assédio e abuso por parte da Polícia Nacional Bolivariana (PNB) durante os três dias em que estiveram detidos.

Além do caso de Carabobo

Este não foi o primeiro caso de invasão policial em locais frequentados pela comunidade LGBT na Venezuela. Segundo a organização Observatório de Violências LGBTIQ+, uma ONG que monitora as violações de direitos dessa população, houve pelo menos outros quatro casos semelhantes desde 2021, na capital Caracas, em Maracaibo e Mérida.

Em alguns desses casos, os policiais teriam extorquido dinheiro das vítimas para não levá-las à delegacia ou acusá-las de “atentado ao pudor”.

Apesar de a Venezuela ser o lar de uma ampla comunidade LGBT, a homofobia e a discriminação ainda são problemas considerados graves no país. O regime socialista de Nicolás Maduro não reconhece legalmente as uniões entre pessoas do mesmo sexo. Além disso, há frequentes relatos de violência física e verbal contra pessoas LGBT por parte de grupos paramilitares e coletivos armados que são ligados ao regime venezuelano.

A Anistia Internacional, organização que defende os direitos humanos, condenou as prisões que ocorreram em Carabobo e afirmou que elas “evidenciam a falta de liberdade e a homofobia de Estado na Venezuela”.

“Trinta e três pessoas são difamadas, 33 pessoas sem auxílio jurídico, 33 pessoas sofrendo campanhas de ódio, 33 pessoas presas arbitrariamente, 33 pessoas capturadas em um local gay, 33 pessoas que evidenciam a falta de liberdade, 33 pessoas acusadas de homossexualidade”, escreveu a organização em seu perfil no X, novo nome do Twitter.

Ainda segundo informações da organização, as pessoas que se identificam como LGBTs na Venezuela são frequentemente alvo das forças de segurança e também submetidas a prisões arbitrárias, tortura, maus-tratos e até violência sexual. A organização documentou o assassinato de uma mulher trans por grupos paramilitares na fronteira do país com a Colômbia em 2019.

Visando fugir da repressão e insegurança, muitos LGBTs venezuelanos buscam refúgio em países vizinhos, como Colômbia e Peru.

Uma pesquisa divulgada pela Anistia Internacional em 2022, conduzida pela ONG Unión Afirmativa, revelou que dos 163 participantes do levantamento, 48,1% relataram ter sofrido algum tipo de abuso ou violência, muitas vezes perpetrados por autoridades do regime venezuelano.

Os dados revelam uma variedade de formas de violência, com 21,9% relatando violência física e 4,6% denunciando violência sexual. Além disso, a violência psicológica afetou 34,7% dos entrevistados, enquanto 26,9% foram vítimas de violência simbólica - que inclui mensagens e símbolos que perpetuam relações desiguais e discriminatórias.

Cerca de 76,9% dos entrevistados relataram terem sido vítimas de atos discriminatórios devido à sua orientação sexual ou identidade de gênero no país. Os números mostram uma disparidade ainda mais profunda quando são analisados os diferentes grupos dentro da comunidade: 97,1% dos homens gays, 95,2% das mulheres bissexuais e 90,0% das pessoas não-binárias enfrentaram discriminação. Mulheres trans e lésbicas também relataram altas taxas, com 85,7% e 82,6%, respectivamente.

Em 2020, a ONG Observatório Venezuelano de Violência afirmou que registrou na Venezuela uma taxa de 45,6 mortes violentas de pessoas trans para cada 100 mil habitantes, índice sete vezes maior que a média mundial. Outras organizações que cobrem a causa LGBT na Venezuela também vem alertando que as pessoas trans que vivem no país ainda sofrem com a falta de acesso à saúde, educação, emprego e documentação legal que reconheça sua identidade de gênero.

Atualmente, sob o regime de Nicolás Maduro, acusado de violar os direitos humanos, reprimir a oposição e fraudar as eleições, a Venezuela vive uma grave crise política, econômica e social, com escassez de alimentos, medicamentos e combustíveis, além de uma hiperinflação que empobreceu a maioria da população, o que intensificou a saída dos venezuelanos para outros países, iniciada com a ascensão do chavismo em 1999.

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