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Kim e Trump ao deixarem a sala onde assinaram o acordo entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos | KEVIN LIM/AFP
Kim e Trump ao deixarem a sala onde assinaram o acordo entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos| Foto: KEVIN LIM/AFP

Em meio à intensa atenção à histórica reunião de cúpula entre o presidente Donald Trump e o ditador norte-coreano Kim Jong-um, otimistas e céticos tem dúvidas sobre o próximo passo a seguir. Uma coisa é certa: não se espera que a reunião dos dois lideres em Cingapura tivesse um grande avanço. 

O secretário de Estado, Mike Pompeo, disse na semana passada que a administração pretende o estabelecimento de um tratado formal a ser ratificado pelo Senado. Isto tornaria mais difícil para um futuro presidente desistir do acordo, a exemplo do que Trump fez com o acordo nuclear do Irã, assinado pelo presidente Barack Obama. Também daria garantias a Kim de que os Estados Unidos não buscará uma mudança de regime logo que a Coreia do Norte desista do seu arsenal. 

Um tratado também significa um debate mais árduo no estrangeiro e nos Estados Unidos. “Este terá de ser substancial, com quase tudo o que se espera”, disse Alexander Vershbow, ex-embaixador americano na Coreia do Norte. 

O que pode ser entendido como desnuclearização? 

Resoluções das Nações Unidas e diretrizes da política externa pedem uma completa, verificável, irreversível e o desmantelamento do programa nuclear americano. 

Especialistas americanos concordam que Trump deve manter-se firme neste conceito em um acordo que garanta que Kim permaneça no poder e acabe com as sanções econômicas sobre o regime comunista. 

“O presidente não pode sair de um acordo com o Irã e firmar um com a Coreia da Norte que não seja verificável e que não preveja uma desnuclearização irreversível”, disse o tenente-general Jerry Boykin, um ex-subsecretário adjunto de inteligência do Departamento de Defesa. 

“Necessitamos fazer a saber a Kim que consideramos que seu programa nuclear é uma ameaça existencial para os Estados Unidos e estamos dispostos a utilizar todos os meios disponíveis para nos opormos a ele.” 

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Segundo Vershbow, a garantia de que os EUA não apoiará uma mudança no regime norte-coreano pode não ser suficiente. “Muitos acreditam que Kim pode ter o seu momento Deng Xiaoping”, referindo-se ao líder chinês que substituiu o brutal Mao Tse-tung e implantou reformas de mercado enquanto mantinha o autoritarismo.” 

“Mas a ideologia oficial prevê que eles precisam dominar toda a Península Coreana e que o governo do Sul é ilegítimo”, disse Vershbow. “A questão é quão diferente Kim Jong-um será, em comparação a seu pai e avô.” 

Definir desnuclearização pode ser uma grande dificuldade, disse Bruce Klingner, pesquisador sênior sobre temas relacionados ao Noroeste da Ásia da The Heritage Foundation. “Isto precisa incluir mísseis balísticos de pequeno e médio alcance, que ameaça países como a Coreia do Norte e Japão”, disse ele. “A Coreia do Norte demonstrou durante décadas que tem definições muito diferentes de termos como a desnuclearização e inclusive o que compreende a Península Coreana.” 

Que tipo de linguagem é necessária para um acordo de longo prazo? 

“Em qualquer acordo, a Coreia do Norte precisa publicamente, explicitamente e inequivocamente aceitar e comprometer-se a trabalhar de acordo com o que é exigido pelas Nações Unidas”, destaca Kligner. Isto, de acordo com ele, precisaria abranger os programas de armas nucleares, biológicas e químicas. 

“Qualquer acordo com a Coreia do Norte precisa ser especifico e ir além do que já foi feito no passado”, afirmou ele, “Tem de ser algo similar ao texto cuidadosamente elaborado, com requisitos de verificação robustos, dos tratados de controle de armas com a União Soviética e o Pacto de Varsóvia, ao invés do texto vago de acordos anteriores com a Coreia do Norte.” 

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No acordo firmado em setembro de 2005, a Coreia do Norte se comprometeu com a não proliferação de armas nucleares e a entrada na Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).  “A Coreia do Norte se compromete a abandonar todas as armas nucleares e programas nucleares existentes e retornar ao tratado de não proliferação de armas nucleares e às salvaguardas da AIEA”, dizia o acordo. 

Vershbow assumiu a embaixada sul-coreana quando esse acordo se mostrava promissor. Pouco tempo depois, a Coreia do Norte, sob o governo de Kim Jong-il, retrocedeu e reiniciou os testes nucleares. “Já vi este filme antes, mas este acordo pode ter um final diferente. Um que confunda os céticos”, disse ele 

As tropas americanas sairão da Coreia do Sul? 

O regime de Kim quer que os Estados Unidos retirem as suas tropas da Coreia do Sul. “Removê-las não é algo que possa ser aceito de antemão”, disse Boykon. 

Os especialistas apontam que isto criará uma grande preocupação dos aliados americanos na Ásia. O governo Trump deveria chegar a um acordo sobre outros temas antes de pensar em retirar as tropas na Coreia do Sul. 

“Se a Coreia do Norte exigir e os EUA concordar em retirar as tropas da Coreia do Sul, os aliados na Ásia como o Japão e Cingapura questionarão se os Estados Unidos estão comprometidos com esta parte do globo”, disse o advogado Matthew Heiman, que já trabalhou na divisão de segurança nacional do Departamento de Justiça. 

Como funcionará a retirada das sanções da Coreia do Norte? 

O governo Trump aumentou as sanções ao regime de Kim, o que contribuiu para levar a Coreia do Norte à mesa de negociações, apontou Vershbow, um ex-diplomata, “A combinação do medo das ameaças militares de Trump e as sanções mais pesadas despertaram a atenção de Kim.” 

Klingner avalia que nenhuma sanção deve ser levantada a menos que a Coreia do Norte dê um importante passo em direção à desnuclearização total. As atuais sanções contra a Coreia do Norte são uma combinação de resoluções das Nações Unidas e impostas pelos Estados Unidos e outros países. Além disso, a legislação aprovada pelo Congresso americano exige que ações específicas sejam tomadas pela Coreia do Norte antes que os Estados Unidos relaxem as sanções. 

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“Um acordo que preveja a manutenção de Kim no governo norte-coreano deve ser similar àqueles realizados com o Vietnã e Camboja”, disse Heiman. “São países que tem economias abertas e usufruem desses benefícios, mas permanecem com ditaduras comunistas.” 

“O jovem líder norte-coreano talvez perceba que um acordo é necessário para sua sobrevivência no governo”, disse Lester Munson, ex-diretor da equipe do Comitê de Relações Exteriores do Senado. “Claramente, o atual modelo não é sustentável a longo prazo”, afirma ele. 

“O país tem seguido com esse sistema por 65 anos. O padrão de sobrevivência de regimes opressores, como esse, é de 70 anos.” 

O que os Estados Unidos podem esperar em relação aos direitos humanos? 

Autoridades do governo Trump disseram que os direitos humanos não estiveram no foco das primeiras conversas com representantes da Coreia do Norte. Mas especialistas afirmam que este assunto deverá ser abordado antes de um acordo. 

“Por que não defendemos nossos valores em uma negociação como essa e garantimos segurança para um déspota com uma trajetória de fazer coisas terríveis a seu povo?”, enfatizou Munson. “Os direitos humanos têm de ser parte de qualquer acordo. Não se pode fechar os olhos para isso.” 

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Os campos de prisioneiros têm entre 80 mil e 120 mil pessoas, aponta um relatório feito por Olivia Enos, analista de políticas para estudos asiáticos da The Heritage Foundation. “Os Estados Unidos também deveriam estar preparados pedir o completo, verificável e irreversível desmantelamento do amplo sistema de campos de prisioneiros da Coreia do Norte.” 

Trump enfatizou os abusos aos direitos humanos durante discursos na Assembleia Nacional da Coreia do Sul, no Congresso americano e quando se encontra com pessoas que fugiram da Coreia do Norte. 

Qual o papel que a China desempenhará? 

China pode ter um papel construtivo ou destrutivo nas negociações e Kim pode estar gostando de jogar as duas superpotências uma contra a outra. Heiman disse que não dá para comparar o encontro entre Kim e Trump com aquele realizado em 1972, entre o então presidente americano Richard Nixon e o líder chinês Mao Tse-tung. “A China estava rompida com os soviéticos e ficou mais alinhada com os Estados Unidos”, lembra Heiman.

O encontro da terça-feira, segundo ele,  pode deixar a Coreia do Norte mais próxima dos Estados Unidos do que da China. “Para a equipe de Trump, o primeiro objetivo é a desnuclearização da Coreia do Norte. E o segundo, de colocar a China em uma posição desconfortável.”

©2018 Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês

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