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Propaganda do candidato oposicionista Kemal Kilicdaroglu em Istambul, maior cidade da Turquia
Propaganda do candidato oposicionista Kemal Kilicdaroglu em Istambul, maior cidade da Turquia| Foto: EFE/EPA/SEDAT SUNA

A inflação e a escalada autoritária do governo do presidente Recep Erdogan estão entre as principais preocupações que a população da Turquia terá em mente ao ir às urnas no segundo turno da eleição presidencial, neste domingo (28).

Erdogan, que está no poder há 20 anos, tem como adversário o líder oposicionista Kemal Kilicdaroglu. Para o resto do mundo, a votação deste domingo traz consigo uma grande questão: como ficarão as relações da Turquia com a Rússia e o grande antagonista desta, o Ocidente?

Apesar de fazer parte da OTAN, o governo turco causou indignação entre os companheiros de aliança militar ao comprar armas da Rússia antes da guerra da Ucrânia, e as relações ambíguas de Erdogan com o presidente russo, Vladimir Putin, geram desconfiança.

O governo turco enviou ajuda militar à Ucrânia e condenou no ano passado a anexação russa de quatro regiões ucranianas, mas ao mesmo tempo Erdogan defende ter uma “relação especial” com Putin e tenta manter uma posição de intermediador entre Kyiv e Moscou: foi o mediador para acordos de trocas de prisioneiros e para o compromisso que permitiu a retomada da exportação de grãos ucranianos pelo Mar Negro.

Apesar da pressão do Ocidente, Erdogan se negou a impor sanções à Rússia. “Não estamos em uma posição para impor sanções à Rússia como o Ocidente fez. Não estamos sujeitos às sanções do Ocidente”, disse Erdogan, em entrevista recente à CNN. “Somos um Estado forte e temos uma relação positiva com a Rússia.”

A postura ambígua foi destacada em um comunicado de outubro do Parlamento Europeu, que apontou que a Turquia, embora seja membro da OTAN e candidata à adesão à União Europeia, se recusa a adotar sanções contra Moscou e “se tornou um ‘hub logístico’ para a Rússia, permitindo a ela contornar o bloqueio econômico. Isso também envolve operações de transporte rodoviário, com a carga de cerca de 250 navios [russos] sendo descarregada em 3 mil caminhões todos os meses no porto de Mersin”.

“Um grande número de empresas russas abriu filiais na Turquia e está cooperando com contrapartes turcas, que fornecem fachada para suas atividades de importação. O número de empresas de capital russo localizadas na Turquia quadruplicou nos primeiros oito meses de 2022, com as exportações para a Rússia crescendo 43% e as importações cerca de 125%”, relatou o documento.

A resistência turca em permitir a adesão de Finlândia (que só ocorreu após exigências de Ancara serem atendidas) e Suécia (a resistência turca permanece) à OTAN após a invasão russa à Ucrânia também serviu para aumentar a desconfiança do Ocidente sobre as reais intenções de Erdogan.

Kilicdaroglu, por sua vez, disse que pretende manter “boas relações” com a Rússia, mas afirmou “não aceitar” a invasão da Ucrânia.

Também disse que, caso saia vitorioso, as relações de Ancara com Moscou serão diferentes do relacionamento pessoal de Erdogan e Putin e mais “orientadas em nível de Estado”. Porém, pouco antes do primeiro turno, Kilicdaroglu freou um pouco essas intenções pragmáticas e acusou a Rússia de interferência na eleição turca.

“Queridos amigos russos, vocês estão por trás das montagens, conspirações, conteúdos deepfake e gravações que foram expostos neste país”, escreveu no Twitter. “Se vocês desejam que nossa amizade continue depois de 15 de maio [dia seguinte ao primeiro turno], tirem as mãos do Estado turco”, acrescentou.

Kilicdaroglu defende uma aproximação maior da Turquia com o Ocidente, mas equilibrar essa intenção e as relações com a Rússia não será um desafio fácil caso seja o vencedor neste domingo.

Em entrevista ao site Ukraine World, Yuliya Tarasiuk, professora assistente da Universidade Nacional Mechnikov de Odessa, afirmou que as relações entre Turquia e Rússia, independentemente de quem vencer a eleição, serão mais influenciadas pelo impacto russo na economia turca “e não por relações pessoais entre líderes específicos”.

“Por exemplo, a Turquia depende da Rússia para o fornecimento de 40% do gás consumido pelo país. A participação da Rússia nas áreas de energia nuclear, turismo e agroindústria do país também tem um forte impacto na economia turca”, explicou Tarasiuk, que, destacou, entretanto, que a continuidade de um comportamento ambíguo também pode beneficiar a Ucrânia.

“Erdogan fechou os estreitos [entre os mares Negro e Mediterrâneo] para navios de guerra russos, mediou o acordo de grãos e intermediou trocas de prisioneiros. Seu governo também entregou drones Bayraktar [para a Ucrânia], e ele tem uma comunicação eficaz com Putin”, analisou a professora.

Por outro lado, apontou Tarasiuk, o desejo de Kilicdaroglu de se aproximar mais do Ocidente também pode ajudar a Ucrânia indiretamente, como, por exemplo, numa eventual facilitação da entrada da Suécia na OTAN. Ou seja: não importa o vencedor, o enigma turco nessa questão está longe de ter solução fácil e assim deve permanecer.

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