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Protesto de dissidentes em Havana: atos de Raúl Castro provocam rumores de abertura política do regime | Desmond Boylan/Reuters
Protesto de dissidentes em Havana: atos de Raúl Castro provocam rumores de abertura política do regime| Foto: Desmond Boylan/Reuters

Lenta e gradual

Desde que Raúl Castro assumiu o poder em Cuba, em 2008, realizou uma série de mudanças

Iniciativas do governo cubano

- Destituição de ocupantes em postos-chaves do regime cubano, como Carlos Lage (secretário do Conselho de Estado), Felipe Pérez Roque (ministro de Relações Exteriores), Otto Rivero (vice-presidente), Jorge Luis Sierra Cruz (vice-presidente e ministro de Transporte) e Luis Manuel Ávila González (ministro do Açúcar).

- Doação de terras estatais a agricultores privados, que podem produzir visando lucratividade. A medida tenta reverter o crescimento de importações de produtos alimentícios.

- Empresas de telecomunicações norte-americanas foram autorizadas a oferecer serviços de telefonia fixa e celular, além de transmitir tevê via satélite e internet para os habitantes de Cuba.

- Libertação de dissidentespresos. Iniciativa do governo norte-americano

- Suspensão de todas as restrições de visitas de cubanos-americanos à Cuba e liberação ao envio de dinheiro para familiares que moram na ilha.

Fonte: Redação

Pai da revolução

Fidel reapareceu para marcar posição, diz analista

Agência Estado

Outra novidade desta semana foi uma aparição na tevê estatal do ex-líder Fidel Castro, discutindo questões de política internacional. Fidel passou o poder para o irmão em fevereiro de 2008, quando precisou se submeter a uma cirurgia de emergência. Desde então, pouco apareceu em público.

"Seguramente, Fidel não quer a abertura e aparece para marcar posição", especula o professor cubano Eusebio Mujal-León, do Departamento de Governo da Universidade Georgetown, em Nova York, mesmo que Fidel não tenha discutido a política interna em sua participação no programa estatal "Mesa Redonda", em que foi o único convidado.

Limitação

Antonio Jorge, professor de Economia Política da Universidade Internacional da Flórida, rechaça também que as libertações em curso sejam novidade. Lista, por exemplo, as liberações de presos políticos ocorridas nos anos 1960, quando foram soltos prisioneiros da fracassada invasão da Baía dos Porcos, e de 1998-99, na época da visita do então papa João Paulo II à ilha."Quando é conveniente por razões políticas, Cuba está disposta a negociar essas libertações", diz Jorge. "Do ponto de vista humano, comemoramos, mas o peso político é pequeno", afirma. "É algo importante para a imagem de Cuba."

Jorge aponta duas outras intenções do regime com as libertações. Uma é conceder um argumento à Espanha, para o país buscar uma revisão na política da União Europeia para a ilha. Além disso, Havana deseja que o governo dos Estados Unidos libere as viagens à Cuba para todos os americanos, o que resultaria em um impulso para a combalida economia local.

  • Detenções em 2003 provocaram condenações internacionais. Confira

O inesperado anúncio da libertação de 52 presos políticos cuba­­nos fez renascer expectativas de que o regime político em vigor desde a Revolução Cubana de 1959 esteja esfarelando, e que a abertura política e comercial é logo ali. Além de surpreender o mundo, o gesto do regime de Raúl Castro livrou da morte o dissidente Guillermo Fariñas, em greve de fome havia 135 dias.Se concretizada por completa, a soltura negociada com o governo da Espanha e a Igreja Católica soma-se à uma série de medidas internas que beliscam o regime comunista instituído desde a Revolução Cubana em 1959."A mensagem que o governo cubano tenta passar ao mundo é que a distensão de seu regime é um caminho necessário para a sua sobrevivência, ainda que se tenha criado uma situação de tamanha pressão que qual­­quer passo de descompressão do regime seja perigosa para a própria permanência das atuais lideranças – o que parece ser um dos objetivos do governo", analisa Daniel Chaves, pesquisador do Laboratório de Estudos do Tem­­po Presente da Univer­­sida­­de Federal do Rio de Janeiro.

Para Tilden Santiago, ex-embaixador do Brasil em Cuba (2003-2006), a libertação dos prisioneiros amplia a expectativa quanto ao futuro político da ilha. "É um sinal muito positivo feito pelo regime cubano", define. "Esse gesto amplia a esperança de que Cuba possa rumar para um regime político mais aberto ao mundo. Acredito que Cuba inaugura a etapa mais importante de sua história desde a re­­volução de 1959", afirma.

Mesmo que a libertação dos prisioneiros seja um gesto inédito na história recente do país, as dúvidas sobre o futuro do regime cubano ainda permanecem. Embora não tenham gerado mu­­danças profundas no contexto político-econômico do país caribenho, as pequenas reformas de Raúl apontam certa pré-disposição em relaxar a economia comunista, mas também pode ser lido como uma cortina de fumaça em tempos de incerteza em torno da sucessão dos irmãos Castro.

"É difícil todo e qualquer diagnóstico sobre a dinâmica interna do regime, pe­­la sua própria característica fechada, quase como uma caixa-preta. Mas, particularmente, não acredito em revisão de conceitos. A situação em Cuba está muito aquém de qualquer prerrogativa de progresso e mudança política", avalia Chaves.

Direitos Humanos

Os presos libertados foram detidos durante a Primavera Negra de Cuba, um levante governista contra dissidentes ocorrido em 2003 e condenado por organizações internacionais. As acusações de violação aos direitos hu­­manos foram amplificadas pelas greves de fome feitas pelo prisioneiro Orlando Zapata Tamayo e, depois, pelo também dissidente Guillermo Fariñas. Tamayo, in­­tegrante de movimentos de oposição em Cuba, foi preso durante a Primavera Negra e condenado a 36 anos de prisão.

Em dezembro do ano passado, o dissidente iniciou a greve de fome exigindo poder usar roupas de cor branca (símbolo do movimento oposicionista) ao invés do uniforme da prisão. Também denunciava as condições do presídio, exigindo que os presos tivessem melhores condições no cárcere. Tamayo morreu após 85 dias de jejum, mas seu ato de desespero sensibilizou a opinião pública.

O clamor foi ecoado por uma outra greve de fome, iniciada um dia após a morte de Tamayo. O psicólogo e jornalista Guil­­lermo Fariñas, no entanto, condicionou o término de sua greve de fome à libertação de 26 presos políticos doentes. A longa agonia de Fariñas, que manteve a greve por 135 dias e esteve perto de morrer, pressionou o governo de Raúl Castro a encontrar uma saída para retirar os holofotes de cima de si. "Depois da morte de Tamayo e do início da greve de fome de Fariñas, houve grande pressão da Euro­­pa, dos Estados Unidos e de ou­­tros países", relata Santiago. "A Igreja Católica, que sempre foi oposição ao regime cubano, teve importância fundamental no processo. O cardeal [Jaime] Or­­tega, líder das negociações, é muito pragmático e hábil na relação com os irmãos Castro", ressalta.

EUA

Toda discussão sobre uma abertura comercial em Cuba passa pelo levante do bloqueio imposto pelos Estados Unidos à ilha em 1961. No ano passado, quando acabou a proibição de viagens e envio de dinheiro à ilha por cubanos-americanos, o go­­verno de Obama parecia estar flertando com a possibilidade de levante do embargo. Mas, des­­de então, gesto algum de aproximação foi feito por ne­­nhum dos dois países.

"A relação entre Cuba e Es­­tados Unidos vem se mantendo a mesma ao longo das décadas, não importa quem seja o presidente americano", percebe Vir­­gílio Arraes, especialista em política externa dos Estados Uni­­dos e professor de História Con­­temporânea da Univer­­sidade de Brasília.

"Estamos diante de um im­­passe. Cuba não vai tomar a iniciativa, porque o regime justifica uma boa parte de seus problemas ao afirmar que tudo é resultado do embargo americano", explica.

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