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| Foto: Andrea Comas/Reuters

“O pino da granada de mão já foi retirado: não há volta.” A frase dita por Iñaki Gabilondo, um respeitado jornalista espanhol, ilustra o impacto político e as consequências do movimento independentista catalão, cujo eleitorado vai às urnas neste sábado (26), em clima de plebiscito. Nestas eleições regionais, se a frente independentista cumprir as previsões e alcançar a maioria absoluta, mesmo que em número de deputados, e não de votos, Artur Mas, atual presidente catalão, afirma que colocará em andamento, ao longo dos próximos 18 meses, seu programa de independência unilateral da Catalunha.

Mesmo se não for assim, será impossível, concordam analistas políticos, manter o status quo. Cresce a tensão entre a Catalunha e o Estado espanhol, assim como a incredulidade a respeito de um diálogo entre o atual governo central, do Partido Popular, e o autônomo.

— Uma democracia não pode fazer ouvidos surdos ao clamor de parte da população por mudanças. As consequências destas eleições serão significativas, qualquer que seja o resultado — opina o cientista político Joan Antón Mellón, professor da Universidade de Barcelona.

Junts pel Sí (Juntos pelo sim), a coalizão liderada por Mas, que, no entanto, é a quarta da lista, conseguiu manter uma forte mobilização em torno da secessão. Seu projeto, que causa ceticismo entre os analistas políticos, é, caso sua coalizão consiga maioria absoluta no Parlamento regional (68 das 135 cadeiras), constituir um governo — não se sabe quem seria o presidente — por um ano e meio, que culminaria com eleições constituintes.

Apostar pelo “tudo ou nada” foi uma hábil estratégia da coligação de Mas, segundo Cesareo Rodríguez-Aguilera, professor de Ciências Políticas da Universidade de Barcelona:

— Conseguiram não avaliar os últimos anos do seu governo, cujo partido (Convergência e União), envolvido em escândalos de corrupção, aplicou políticas duríssimas de privatização e de cortes. O PP acabou entrando no jogo, para não ter que falar, também, de seus casos de corrupção e de suas medidas de austeridade.

Distribuição de taxas está no centro da crise

Se as previsões acertam, a efetividade da campanha de Junts pel Sí estará provada. O partido não nacionalista Ciutadans (Cidadãos) se transformaria na segunda força política da região, seguido de Catalunya Sí que es Pot (a versão catalã do lema de Obama “Yes we can”), uma coalizão, da qual Podemos faz parte. Ela reúne federalistas e secessionistas contrários à declaração unilateral de independência. Em quarto lugar estaria o Partido Socialista, seguido do Partido Popular. A CUP, partido independentista de esquerda, deverá ser a chave para a maioria absoluta, caso Junts pel Sí não alcance as 68 cadeiras.

As eleições regionais poderão servir para mostrar a força do independentismo, mas não terão valor de plebiscito. Além da impossibilidade de comparar o número de deputados com o de votos, carece de validez jurídica e política. Uma consulta popular não vinculante sobre a independência teria que ser convocada pelo governo central, que rejeita esta possibilidade.

Artur Mas realizou, em novembro do ano passado, uma consulta simbólica, da qual participaram 2,3 milhões de pessoas (33% de um censo orientativo), contrariando as determinações do Tribunal Constitucional. O crescimento do independentismo, no entanto, é comprovado com pesquisas, como a do Centro de Investigações Sociológicas, que mostra um aumento de cinco pontos nos três últimos anos. Hoje, é de 46%. O estudo aponta as nuances do sentimento nacionalista na Catalunha: 21,6% se sentem somente catalães enquanto 25,1% se dizem mais catalães do que espanhóis; e 42,1%, tão espanhóis quanto catalães.

A principal reclamação dos independentistas é econômica. Afirmam ser vítimas de um espólio fiscal perpetrado por Madri. A Agência Tributária da Catalunha (ATC) arrecada 5% dos impostos gerados dentro da comunidade autônoma. Este é um dos focos do conflito com Madri, que vem rejeitando renegociar o modelo de financiamento autônomo.

De fato, 27% dos catalães acreditam que o movimento só melhorará um pouco isso, segundo uma pesquisa do Instituto Feedback para o jornal catalão “La Vanguardia”. Só 20% pensam que o plano de Mas levará à independência, e 32% opinam que as consequências destas eleições serão um enfrentamento permanente entre as administrações central e regional.

— Não há dúvida de que o panorama será de muito conflito e tensão — opina o cientista político Julián de Santamaría Ossorio, ex-presidente do Centro de Investigações Sociológicas.

O ambiente já é de hostilidade. O plano de Artur Mas chega às urnas acurralado pelo governo central. Graças a sua maioria absoluta, o PP iniciou, sozinho, uma reforma do Tribunal Constitucional, rejeitada por todas as siglas, que acusaram o partido de Mariano Rajoy de fazer uso eleitoral e antidemocrático das instituições. Com a reforma, o próximo presidente da Catalunha poderia ser afastado, sem a necessidade de nenhum procedimento parlamentar, caso não aborte o plano secessionista.

Internacionalmente, também não tem recebido apoio, um dos objetivos mais perseguidos por Artur Mas desde que, em 2012, passou a empunhar a bandeira da independência. A chanceler alemã, Angela Merkel; o primeiro-ministro britânico, David Cameron; o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker; além da Assembleia das Regiões Europeias, composta por mais de 300 membros, foram refratários à saída da Catalunha da UE, um assunto que os líderes independentistas procuram contradizer.

O panorama seria de isolamento internacional, segundo o estudo “As consequências jurídicas da independência”, elaborado por juristas para a Fundação Alternativas, vinculada ao Partido Socialista. A Catalunha estaria fora do espaço Schengen, da ONU, do FMI, da Otan e do G20. Nos EUA o presidente Barack Obama declarou ao rei Felipe VI o compromisso de manter relações com “uma Espanha forte e unida”.

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