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Curitiba – Os chilenos enfrentam uma encruzilhada. De um lado da fronteira, bolivianos reivindicam saída para o mar. De outro, os peruanos pedem uma linha de fronteira marítima diferente daquela reconhecida pelo Chile. Um problema que tem pelo menos 120 anos. Fruto da Guerra do Pacífico (1879–1884) em que a vitória chilena levou peruanos e bolivianos a perderem território (veja quadro).

Baseando-se no argumento da vitória histórica, o Chile não tem se mostrado aberto a negociação com os vizinhos, que inclusive em última instância querem levar o caso para a Corte Internacional de Justiça de Haia, explicam os especialistas.

Um acordo sobre o limite marítimo parece estar longe de ser assinado entre Peru e Chile, uma vez que os chilenos alegam que o tema foi encerrado com o Convênio sobre a Zona Especial Marítima (1954) e a Declaração de Santiago (1952). Mas os peruanos dizem que os convênios tratam sobre a pesca e que o Chile nunca assinou um acordo de limites marítimos.

O governo boliviano quer a saída para o Pacífico mas sem dar território em troca, comenta Aldo Durán, cientista político boliviano da Universidade Federal de Uberlândia. "Houve conversas durante a era Pinochet, mas não se chegou ao fim da negociação. Na época, a Bolívia reivindicava 10 quilômetros de território em troca de outro."

Os três países precisam discutir a modificação do quadro fronteiriço, diz Durán. "As negociações não podem ser bilaterais, uma vez que a Bolívia terá que consultar o Peru caso queira levar em frente a questão da saída para o mar. É um problema geopolítico, porque irá influenciar a fronteira das três nações."

Peruanos e bolivianos terão pela frente a missão de abrir diálogo com Michelle Bachelet, presidente chilena, diz. Ao mesmo tempo, lembra Durán, o Chile sempre bloqueou as negociações sobre a redefinição de fronteira. "É uma política de Estado". Do outro lado, o que se vê é a temática da saída para o mar como bandeira de luta permanente na Bolívia, agora reavivada. "Ou seja, o governante que conseguir alcançar uma solução terá popularidade interna garantida".

As relações entre os três países são bastante problemáticas, diz Hugo Eduardo Meza Pinto, professor de macroeconomia do Centro Universitário Positivo (Unicenp). "Mas não acredito que vá ocorrer algum tipo de conflito até porque o Chile tem maior poderio bélico, além dos argumentos históricos."

Tanto Alan García, presidente eleito do Peru, quanto Evo Morales, presidente boliviano, inflamam as questões de fronteira para desviar a atenção dos problemas internos de seus respectivos países, conclamar o patriotismo e ganhar popularidade, considera Meza Pinto. "O Chile nunca aceitaria uma revisão de contrato. Bachelet já enfrenta problemas internos e a questão de fronteira coloca em jogo sua aprovação interna."

A essência da questão é meramente de discurso político, comenta Meza Pinto, e no caso de García, uma tentativa de tirar de foco o péssimo governo que ele fez entre 1985 e 1990.

A perda de território para o Chile na Guerra do Pacífico permanece por gerações e gerações no imaginário de peruanos e bolivianos, comenta René Berardi, especialista chileno em Relações Internacionais da Facinter. "Agora a questão está recrudescida pela visão nacionalista do atual governante da Bolívia Evo Morales, que utiliza o gás como forma de pressão. O gás em troca da saída para o mar."

O Chile está sendo pressionado porque tanto Peru quanto Bolívia estão procurando foros internacionais para que os chilenos rediscutam os limites fronteiriços, diz Berardi. "O Chile se sente acuado por não ter gás natural em seu território. Grande parte da indústria chilena utiliza gás comprado da Argentina – que por sua vez adquire da Bolívia." Outro senão, é que Chile e Bolívia não mantêm relações diplomáticas há 20 anos, lembra Berardi.

O povo chileno não se abre para a possibilidade de negociar, analisa Berardi. "É uma questão interna que mexe com a sustentação política. Ou seja, uma negociação sobre fronteira com Peru e Bolívia custaria a queda de popularidade da atual governante. Em última instância, o Chile terá de se defender no Tribunal de Haia."

Para Francisco Rojas, secretário-geral da Faculdade Latinoamericana de Ciências Sociais (Flacso), com sede na Costa Rica, o Chile quer um diálogo aberto tanto com Bolívia quanto com o Peru desde que se respeitem os tratados internacionais na busca de uma solução. "Cada país tem uma percepção diferente do problema. Para o Chile, não existe razão para a cessão de território uma vez que eles foram delimitados e consumados em tratados após a guerra."

Rojas acredita que esta pode ser uma oportunidade para que os três países além de discutirem este delicado tema, ampliem as negociações em outras áreas.

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