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La Paz – A Constituição boliviana de 1967, reformada em 1994, foi apontada nos últimos anos como um dos entraves para a estabilidade do país, por não privilegiar o equilíbrio entre os poderes e manter à margem das decisões políticas a imensa maioria indígena e miserável da Bolívia. Hoje, 3.713.315 bolivianos vão às urnas para eleger 255 representantes encarregados de sepultá-la definitivamente e redigir uma nova Carta. Esses mesmos eleitores também serão convocados a dizer "sim" ou "não" à concessão de mais autonomia para os departamentos do país.

Embalado por uma popularidade de aproximadamente 80%, o presidente boliviano, Evo Morales, deve arrastar pelo menos 150 membros de seu partido, o Movimento ao Socialismo

(MAS), à Assembléia Constituinte. Só não obterá uma maioria ainda mais folgada porque a Justiça Eleitoral adotou um mecanismo para garantir a representação de vários partidos na redação da nova Constituição.

Mesmo assim, Evo – admirador dos presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, e de Cuba, Fidel Castro – terá espaço político suficiente na Assembléia para assegurar a redação de uma Constituição que lhe permita realizar mudanças profundas na sociedade do país. O ex-líder sindicalista dos plantadores de coca da região do Chapare, venceu a eleição de 18 de dezembro no primeiro turno com a promessa de "refundar a Bolívia".

"Como o MAS deve conquistar sozinho mais da metade das cadeiras da Assembléia, há o risco de a nova Constituição reforçar ainda mais os poderes do presidente, algo semelhante com o que aconteceu na Venezuela em 1999, quando partidários de Chávez aprovaram uma Carta que lhe deu poderes quase imperais", disse o professor de Ciências Políticas da Universidade Autônoma, Alberto Navajo. "É quase certo, por exemplo, que a próxima Constituição abrirá caminho para que o governo promova a nacionalização total dos recursos naturais e estabeleça regras para a realização de uma reforma agrária ampla."

A popularidade de Evo se deve muito à decisão de nacionalizar as operações de hidrocarbonetos (gás e petróleo) no país em 1.º de maio. A maior prejudicada com a medida foi a brasileira Petrobrás, principal investidora estrangeira no país – no qual injetou US$ 1,5 bilhão nos últimos dez anos. Pelo decreto de nacionalização, a Petrobrás deverá se tornar apenas sócia minoritária da estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolivia (YPFB) – ressuscitada por Evo – nas operações de gás e petróleo.

Cerca de 100 famílias de brasileiros que produzem soja em Santa Cruz também estão na alça de mira de Evo, que pode ganhar com a nova Constituição instrumentos legais para expropriar suas terras para fins de reforma agrária. O ministro da Agricultura, Hugo Salvatierra, já deixou claro que serão confiscadas todas as propriedades cujos documentos contenham irregularidades.

Santa Cruz é também o epicentro do movimento por autonomia. Embora alguns movimentos mais radicais do departamento defendam a criação de um novo Estado independente na região, a autonomia que os crucenhos pretendem aprovar é bem mais modesta. "Tudo o que queremos é gerir nossos recursos e administrar nosso departamento", afirmou o porta-voz do Comitê Cívico Pró-Santa Cruz, Daniel Castro.

Numa demonstração de força, os partidários da autonomia puseram mais de 300 mil pessoas nas ruas de Santa Cruz na quarta-feira. Mas o governo central declarou abertamente seu apoio pelo "não" à autonomia. "Essa autonomia que os oligarcas de Santa Cruz defendem não tem nenhuma outra serventia que não seja a de mantê-los no controle das riquezas do país", discursou Evo, no encerramento da campanha do MAS, na quinta-feira.

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