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Dar a uma minoria a benesse de aposentadoria tão vultosa, quando o trabalhador comum precisa contribuir por 35 anos para receber valores muitas vezes insuficientes para manter seu padrão de vida, constitui um desrespeito aos princípios da moralidade e da impessoalidade

Uma decisão do desembargador Antonio Loyola Vieira, do Tribunal de Justiça do Paraná, trouxe de volta uma questão polêmica: devem os ex-governadores do estado manter o direito a uma pensão vitalícia após terem concluído o mandato? Vieira determinou que o ex-governador Roberto Requião volte a receber a aposentadoria de quase R$ 25 mil, pagamento que havia sido suspenso por ato do atual governador, Beto Richa. Atingidos também pelo mesmo ato foram todos os demais governadores que exerceram seus mandatos após a promulgação da Constituição Federal de 1988, mas o privilégio foi mantido para os anteriores e para as viúvas destes.

A decisão de Vieira beneficia apenas Requião, mas o ex-governador Orlando Pessuti também aguarda julgamento de uma ação impetrada por ele e que tenta reverter a supressão de seu suposto direito. Em 17 de julho, o Órgão Especial do TJ começou a analisar o mandado de segurança; seis dos seus 25 membros já haviam se pronunciado contra a pretensão do ex-governador e quatro a seu favor quando um pedido de vista interrompeu o julgamento, que ainda não tem data para ser retomado. Daí deve emergir o entendimento definitivo do Judiciário paranaense extensivo aos demais interessados – isto é, aos três outros ex-governadores que ocuparam o Palácio Iguaçu após a vigência da atual Constituição: Mario Pereira, Jaime Lerner (ambos com demandas idênticas na Justiça) e o próprio Roberto Requião.

Embora seja o Judiciário o caminho republicano a solver a questão segundo o entendimento que extrai dos ditames legais, há aspectos éticos e morais que escapam das frias letras da lei a serem examinados. Ainda que o julgamento reconheça o direito supostamente cerceado aos ex-governadores, manter-se-á sempre presente a dúvida sobre a legitimidade do direito pleiteado: é justo, ético e moral que o contribuinte arque vitaliciamente com dispêndio de consideráveis importâncias para subsidiar o que, na prática, se traduz em uma aposentadoria à qual não correspondeu prévia contribuição previdenciária?

Não é o que ocorre com o trabalhador comum, obrigado a comprovar contribuições ao longo de 35 anos para garantir o direito a proventos de aposentadoria que não ultrapassam valores que lhes assegurem na velhice sequer a manutenção do mesmo padrão de vida. Logo, se à maioria se impõem tais custosas exigências, dar a uma minoria a benesse de aposentadoria tão vultosa constitui um desrespeito aos princípios da moralidade e da impessoalidade também presentes na Constituição. É sob este aspecto que o privilégio pleiteado pelos ex-governadores deve ser combatido.

Entretanto, se reconhecida a imoralidade do privilégio para os governadores pós-1988, é obrigatório que tenhamos o mesmo entendimento em relação também aos mandatários que exerceram o governo anteriormente à atual Constituição. Nesse caso, o parecer que embasou a decisão do governador Beto Richa, que preservou as aposentadorias mais antigas e a pensão de suas viúvas, pecaria pelo mesmo mal da imoralidade – tese, aliás, que defende a Ordem dos Advogados do Brasil na Ação de Declaração de Inconstitucionalidade (Adin) que impetrou no Supremo Tribunal Federal. Foi justamente a demora do STF na análise da Adin que o desembargador Vieira usou como argumento para decidir que Requião deveria voltar a receber o benefício. Quando o Supremo finalmente se pronunciar sobre o assunto, será possível saber se o governo do estado acabou tomando uma atitude polêmica e duvidosa ao manter as aposentadorias de uns e cortar as de outros, ou se, de forma sábia, antecipou-se à decisão da corte.

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