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A transparente análise da situação dos municípios revela que estão sendo submetidos a um processo de espoliação fiscal e de enfraquecimento, que, não enfrentados com firmeza e determinação, contribuirão para a legitimação do atraso.

É importante ressaltar que a situação atinge as raias do abuso, escancara as portas da desigualdade e inviabiliza, em muitos casos, o próprio desenvolvimento de políticas públicas.

Nos últimos anos, em especial após o advento da Constituição Federal de 1988, operou-se a chamada municipalização de serviços, situação em que os governos federal e estadual transferiram incumbências ao municípios, sob a promessa de repasse de recursos financeiros, necessários para o cumprimento dessa nova situação. Na prática, contudo, isso não ocorreu de forma completa, tendo a conta ficado para o contribuinte das cidades. Para um quadro orçamentário difícil e apertado, em decorrência das sabidas dificuldades de geração de receitas municipais, a conseqüência foi o agravamento das finanças, deterioração da oferta de serviços, gerando reclamações por parte da comunidade e deixando os prefeitos em dificuldades na operacionalização da gestão pública.

Ademais, é sabido que o sistema tributário brasileiro, projetado ainda em 1966, é essencialmente concentrador e injusto, pois expressiva parcela da arrecadação de impostos fica de posse da União, à luz da velha e inconsistente falácia da uniformização do planejamento nacional. Dentro de uma formulação ortodoxa, prefere-se a centralização para, depois, devolver parte aos estados e municípios, através de cálculos nem sempre com a transparência exigida.

Nesse sentido, na década de 90, os municípios ficavam com 20% da arrecadação. Atualmente, restam-lhes, apenas, 14,5%, destinando-se aos estados 24,5% e à União, 61%, numa flagrante confirmação da descapitalização e do desrespeito.

Deveras, basta mencionar que, em 2004, os impostos partilhados com os municípios e que formam o Fundo de Participação, decorrentes do Imposto sobre Produtos Industrializados e do Imposto sobre a Renda, totalizaram R$ 123 bilhões, enquanto que as contribuições originárias da CPMF, Cofins, do Lucro Liquido das Empresas e outras menores, atingiram a vultosa cifra de R$ 147 bilhões. Nestas últimas, por sinal, os municípios não têm qualquer participação, o que revela um paradoxo insustentável e a vulnerabilidade das cidades.

Em que pese o esforço de seus dirigentes, materializado em marchas a Brasília, trabalho junto aos representantes parlamentares e quadros dirigentes da Nação, os municípios não conseguem o retorno necessário, pois é concreta a interposição de óbices nas transferências de recursos e na própria divisão do bolo tributário.

No caso das cidades em que a base da remuneração é o salário-mínimo, especialmente as pequenas, seus orçamentos ficam comprometidos, em se considerando que o custeio da máquina pública cresce geometricamente. Agregue-se, ainda, o pagamento de precatórios, inativos, previdência e dívidas, que exigem gestão financeira apertada e vinculada à economicidade.

O governo federal sinaliza, atualmente, com a proposta de Emenda Constitucional que altera o funcionamento da educação pública no Brasil, substituindo um dos mais vitoriosos instrumentos de educação do país, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que tem a marca da mudança, coerência e transformação dos conteúdos educacionais, pelo Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Numa primeira avaliação, esse novo Fundo reduz o somatório de recursos dos municípios, além de excluir o aporte de dotações para creches e pré-escola, o que já provocou a recriminação do Ministério Público Estadual, da Associação dos Municípios do Paraná e da Assembléia Legislativa, instituições comprometidas com a verdade dos fatos e defensoras da inclusão social.

De outro lado, torna-se necessário e urgente incluir a merenda escolar nos gastos com educação. Os dispêndios canalizados para essa área são expressivos e importantes, na merenda em que evitam o fenômeno da evasão escolar e se constituem em mecanismo de distribuição de renda.

Na verdade, é necessário repensar a participação dos municípios na federação e rever o instituto da centralização tributária. Se nada for feito, corre-se o risco da completa deterioração dos projetos de desenvolvimento da área municipal. É preciso definir caminhos para a salvação das células municipais e ter mais respeito com essas unidades, que representam a infra-estrutura básica do crescimento e do atendimento das demandas da coletividade. Max Weber, em seu clássico a Política como Vocação, informa as qualidades que julga básicas para um político: paixão, sentido de responsabilidade e senso de proporções. Os prefeitos municipais, com raríssimas exceções, têm esses predicados, principalmente pelo fato de que devem ter um olhar, permanentemente fixo, na despesa, e outro, na receita, subordinados à lógica de que só é possível gastar o que for arrecadado. No entanto, dependentes de decisões de outros níveis de governo, continuarão a encontrar dificuldades para executar políticas públicas consistentes e a enfrentar a desmotivação cívica dos cidadãos.

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