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A cada mês de 2014 o anúncio da inflação foi causa de polêmicas e declarações conflitantes entre as autoridades e os analistas de mercado. A meta fixada pelo Banco Central (BC) nos últimos anos é de 4,5% com admissão de variação até o teto de 6,5%. Esse teto não é um desejo, mas uma margem de tolerância, que não deve ser aceita passivamente. A insistência da inflação em ficar no teto superior da meta indica a necessidade de medidas para trazê-la aos 4,5% fixados em resolução do Conselho de Política Monetária (Copom).

Medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação fechou 2014 em 6,41% – portanto, 1,89 ponto porcentual acima da meta, batendo no teto. A presidente Dilma vinha declarando sistematicamente que os analistas eram pessimistas e que a inflação ficaria na meta, e o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, passou o ano fazendo previsões otimistas e insistindo que a inflação estava sob controle. Ao fechar em 6,41%, o governo aproveitou para dar estocadas nos críticos dizendo que, mais uma vez, o pessimismo não venceu.

O problema é que as declarações do governo merecem reparos com base naquilo que a presidente Dilma pediu aos críticos. "Olhem os números, olhem a lógica", dizia a presidente. Foi preciso chegar o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para escancarar a realidade da inflação e das contas públicas. A superação da meta central em 1,89 ponto porcentual faz da inflação um problema sério, pois sair de uma meta de 4,5% para 6,41% é grave por si só. Ademais, atingir o teto da meta com o governo segurando artificialmente o reajuste de vários dos preços administrados torna a inflação falsa.

Ao segurar os reajustes das tarifas de transporte público, dos preços dos derivados de petróleo e da energia, o governo ficou abaixo do teto da meta de forma artificial. A inflação somente reflete a realidade da economia nacional quando resulta de preços livres e de preços administrados reajustados de acordo com a própria inflação. Segurar os preços na base da canetada presidencial distorce tudo, como bem demonstra o estrangulamento financeiro da Petrobras, da Eletrobras, das empresas de energia e das empresas do sistema de transportes públicos.

A taxa de inflação próxima de 7% ao ano é alta e danosa ao sistema produtivo, capaz de desorganizar o mecanismo de preços e suficiente para corroer fortemente o poder de compra dos salários. Mais adiante, se o processo continuasse, seria prejudicado o crescimento econômico e o desemprego seria elevado. O problema brasileiro é que o governo foi tão longe em sua irresponsabilidade que a correção das distorções vai custar caro à população, cujo exemplo mais grave é a elevação do preço da energia, como mostrou a Gazeta do Povo em reportagem na edição de domingo e em seu editorial de ontem. Além dos reajustes já feitos no ano passado, estima-se que os novos aumentos na conta de energia podem chegar a até 40%. A necessidade de combater a inflação e consertar as distorções – entre elas, a manipulação que falseou os dados contábeis do governo – já produziu elevação da taxa básica de juros e levou o governo a cortar benefícios sociais, reduzir o orçamento da educação e avisar que vai cortar ainda mais.

Registre-se o detalhe nada desprezível de o governo ter cortado fortemente programas dos trabalhadores privados – como a redução da pensão por morte e no seguro-desemprego – e não ter feito o mesmo com os servidores públicos. Esse tratamento que impõe sacrifícios aos trabalhadores privados enquanto mantém privilégios aos funcionários públicos cria uma divisão de classes que não deveria ser acolhida no Congresso Nacional. No caso específico da redução nas pensões por morte, os parlamentares somente deveriam aprová-la desde que a mesma medida fosse aplicada aos servidores do governo.

Não bastasse o fato de a presidente Dilma ter enganado os eleitores – esbravejando contra o programa econômico de seus adversários, acusando-os de tramar contra os trabalhadores, e depois de eleita ter feito o mesmo que eles fariam –, o governo não admite que o estouro da meta de inflação é grave e não endossa a previsão dos agentes econômicos de que, para corrigir a confusão armada pela própria presidente em seus quatro anos de mandato, a inflação de 2015 vai estourar a meta e pode até mesmo aproximar-se de dois dígitos.

Segundo alguns analistas, a inflação de janeiro pode ficar entre 1% e 1,4%, taxa exageradamente alta e perigosa, inclusive pelos efeitos psicológicos capazes de estimular a remarcação de preços em cadeia. Aí estão os efeitos dos erros do governo.

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