• Carregando...

A neutralização transitória dos componentes da crise financeira global exigiu a injeção de US$ 300 bilhões no sistema econômico nos meses de julho e agosto de 2007, por parte dos bancos centrais europeus, dos EUA e da Ásia, o que foi considerada a maior intervenção realizada desde os atentados terroristas de setembro de 2001, no afã de impedir o credit crunch (empoçamento de liquidez) acoplado à abrupta desinflação de ativos.

Na seqüência, o Fed reduziu em 0,5 ponto porcentual a taxa de redesconto (empréstimos emergenciais entre os bancos) de 6,25% ao ano para 5,75% a.a. e, mais recentemente, a taxa básica de juros de 5,25% a.a. para 4,75% a.a. Trata-se da primeira redução desde junho de 2003, quando a taxa recuou de 1,25% a.a. para 1% a.a., ficando nesse patamar até junho de 2004, ocasião em que retoma uma trajetória ascendente até julho de 2006, quando atingiu 5,255 a.a. Frise-se que o último declínio de 0,5 ponto porcentual ocorreu em novembro de 2002, quando a taxa passou de 1,75% para 1,25% ao ano.

Ainda existem dúvidas quanto às chances de migração do colapso financeiro do pedaço subprime para as áreas de reduzido risco, ou mesmo de sua propagação para o lado real da economia, ilustrado pela divulgação de resultados de balanços menos favoráveis de gigantes do varejo como Wal-Mart e Home Depot (especializada em artigos para residências).

Porém, em um cenário de funcionamento precário da regulação financeira multilateral (via Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial) e de enfraquecimento dos estados nacionais, o possível contágio sobre outras aplicações e o efeito riqueza às avessas, provocado por prejuízos patrimoniais em imóveis e ações, podem encurtar os níveis de liquidez, através da compressão da oferta das linhas de crédito internacionais ao setor privado, das operações com títulos, das cotações das commodities, e dos níveis de atividades das nações emergentes, e do direcionamento das aplicações para papéis de risco nulo como os do tesouro norte-americano.

Cálculos realizados pelo Commodity Research Bureau (CRB), sediado nos EUA, revelam acomodação e/ou queda dos preços médios internacionais de um grupo de 24 produtos, formado por itens agrícolas e metálicos, depois de terem registrado evolução média de 50,0% entre 2003 e junho de 2007. Desde o começo da crise (julho) até o final de agosto, as cotações declinaram 5,0% para os produtos agrícolas e entre 10,0% e 17,0% para os metais.

O que se pode adiantar é que as economias em desenvolvimento atravessam um estágio diametralmente oposto àquele apresentado durante as crises dos anos 1990, sobretudo entre 1995 e 2002. Depois de articularem, de maneira perigosa, elevados e crescentes endividamento externo e déficits em transações correntes, naquele lapso de tempo, em um panorama de sucessivas instabilidades surgidas na margem do sistema (México, Ásia e Rússia), os emergentes conseguiram construir uma espécie de colchão amortecedor de choques externos, representado pela acumulação de enormes volumes de reservas internacionais. A grande dúvida repousa na capacidade de imunização desses mercados diante de um alvoroço oriundo do núcleo dinâmico.

No caso do Brasil, o avanço dos fundamentos macroeconômicos é visível, com destaque para o declínio, no período 2002–2007 dos seguintes parâmetros: valor da dívida total/exportações de 3,5 para 1,3; reservas cambiais/encargos da dívida de 2,8 para 0,8; e do passivo indexado ao dólar de 60,0% para praticamente zero. Ao mesmo tempo, o país registrou superávits em transações correntes por cinco anos seguidos e o montante de divisas fortes em poder do Banco Central subiu de US$ 16,0 bilhões para mais de US$ 160,0 bilhões, em idêntico intervalo.

O alcance imediato da crise no mercado de capitais pode arrefecer o processo de emissões primárias de ações, por conta da venda de papéis para a compra de dólares destinada à cobertura das perdas incorridas no mercado hipotecário dos EUA, episódio que pode ser potencializado pela ascensão recente do endividamento externo de curto prazo das instituições financeiras atuantes no Brasil.

Gilmar Mendes Lourenço é economista, coordenador do Curso de Ciências Econômicas da Unifae – Centro Universitário Franciscano do Paraná – FAE Business School.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]