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 | Hugo Harada/Gazeta do Povo
| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

Não queremos que no Estado do Paraná ocorram situações trágicas como as vivenciadas na cracolândia no Estado de São Paulo, amplamente divulgadas pela mídia. Para que isso não aconteça temos que tomar medidas de efetiva prevenção, essa é a palavra de ordem.

Mas para se fazer prevenção não haverá uma política pública eficiente se não agirmos irmanados num esforço comum. Isto significa que todos os setores públicos e a sociedade devem se envolver na temática da drogadição. O problema não é de um, é de todos, pois de uma forma ou de outra atinge a toda sociedade, difícil existir uma família que não tenha uma ocorrência com drogas.

O Brasil tornou-se um dos principais mercados de substâncias psicoativas legais e ilegais. Sendo o álcool, maconha, crack, as drogas de maior consumo e prejuízo para saúde.

A dependência de álcool atinge 12% dos adultos brasileiros e responde por 90% das mortes associadas ao uso de outras drogas.

Estados da Região Sul estão entre os que registram maior índice de consumo de álcool, e a publicidade na mídia cada vez mais o estimula. Sequer se respeita horário de propaganda, porque a indústria cervejeira conseguiu implantar na lei 9.294/96, que cerveja não é considerada bebida alcoólica, para fins de regras de publicidade, aquelas com teor alcoólico acima de 13º Gay Lussac.

Assim, as famílias também acabam consumindo mais e dando exemplos de normalidade de consumo aos filhos. Sugerindo até como remédio, pois quando os pais chegam em casa cansados, tomam uma cerveja ou vinho ou outro destilado para relaxar. Pelo mau exemplo crianças aprendem a consumir e a família, nesse caso representaria um fator de risco, quando deveria ser um fator de proteção.

Na medida em que o consumo aumenta também aumenta a depressão e esta tem levado à morte muita gente. Revista de ampla divulgação recentemente divulgou que todos os dias, 32 brasileiros tiram a própria vida. Todos os dias também, mais de 20 mil pessoas cometem suicídio ao redor do planeta. Quase 1 milhão de pessoas se matam por ano, uma a cada 40 segundos, são mais vítimas que todas as guerras, homicídios e conflitos civis somados.

E segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde) o suicídio é a segunda causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos. De acordo com a mesma OMS 90% das pessoas que se suicidam apresentavam algum desequilíbrio, como depressão, transtorno bipolar, dependência de substâncias e esquizofrenia. Ainda assim, a OMS defende que 90% dos suicídios poderiam ser evitados. O desafio é cuidar das doenças mentais como cuidamos das outras doenças.

Mas nós vivemos num país em que sobejam preconceitos e estigmas sobre os usuários e dependentes químicos, inclusive dos próprios profissionais da saúde. Não é só isso. Não há um verdadeiro cuidado no tratamento com a temática da drogadição. Sequer um olhar perspicaz para a origem do consumo. Não há investimento em prevenção, em tratamento, em reinserção social, que poderiam ao menos reduzir o caótico quadro dos muitas vezes trágicos efeitos das substancias psicoativas.

A dependência química deveria ser tratada como tabaco, doenças crônicas como AIDS e o câncer de mama, cujas campanhas de prevenção foram fundamentais para diminuir a incidência das doenças. Em contraste não se faz campanhas de prevenção a dependência química.

Muito se fala que a política de guerra às drogas é uma política falida e que a questão da drogadição seria somente da área de saúde. Na realidade tanto segurança quanto saúde são final do ciclo, representam a ineficiência de uma política pública efetiva que possa no início de tudo garantir condições mínimas das pessoas se estruturarem. Precisamos, na base, de investimento na educação, na assistência social, na atividade laboral, enfim, uma verdadeira política pública alicerçada na melhoria da qualidade de vida e bem estar da população.

O problema da drogadição começa antes de vermos crianças, jovens, adultos e idosos se encontrarem em estado de vulnerabilidade e ausência de dignidade. Inicia-se antes do ser humano se anestesiar com drogas e perder seus valores, seus sonhos, projetos de vida e sua própria identidade. Fácil nessa condição consumir drogas, sejam lícitas ou ilícitas. A humanidade está perdendo a referência do ser. Falta-lhe uma razão para viver, falta-lhe espiritualidade, um significado para a própria vida, que se dirá com relação a vida de seu semelhante.

Falamos aqui de valores imateriais, falamos de respeito, de honestidade, de coragem, de amor, de amor ao próximo, de estar junto sem interferência de internet, de celulares, de jogos, de drogas.

Chamamos atenção para os valores que independem de dinheiro, independem de ter e de consumir, falamos de valores meritórios que devem ser plantados desde cedo na educação familiar e escolar para preparar os pequenos a dispensar as drogas.

Sejamos honestos com eles, drogas sempre existiram. Como o ser humano lida com elas é a grande questão. Deve-se dar a informação correta, baseada em evidências científicas e atualizadas, por exemplo, dizer que maconha é uma droga leve, é mentira, pois não se está mais diante de uma droga com até 1,5% de THC dos anos 70, substância responsável pelos efeitos alucinógenos, hoje a concentração dessa substância é equivalente a mais de 25%, equivalente à droga pesada, potencialmente forte para causar danos cerebrais.

Além do que não existe maconha medicinal, apenas uma das cerca de 500 substâncias encontradas na planta, ou seja, do CBD, ou Canabidiol, que pode ser considerada medicinal por ter propriedades que podem ajudar a diminuir os efeitos negativos da epilepsia e de crises convulsivas. Porém não é a planta inteira que é medicinal. Este discurso falacioso foi usado nos Estados Unidos e possibilitou a legalização da droga.

Vale ressaltar que a literatura médica e pesquisa científica comprovam que em geral a maconha faz mal à saúde

Perda de memória, alterações nas funções de atenção e concentração, alterações endócrinas, lesões pré-cancerosas na laringe e nos pulmões, esquizofrenia são algumas das consequências mais citadas.

Não podemos esquecer que o Brasil é o País mais cobiçado na América Latina para legalização de todas as drogas, por ser importante ponto de trânsito de drogas para os grandes mercados consumidores, os Estados Unidos e Europa. Porém, ao mesmo tempo registra um notável aumento do consumo, por pessoas cada vez mais jovens, num território populoso, 202 milhões de habitantes, faz fronteiras com dez países, sendo quatro grandes produtores de cocaína: Colômbia, Venezuela, Peru e Bolívia- e um, de maconha: o Paraguai. Por isso grande mobilização está ocorrendo pela legalização de todas as drogas.

O grande alvo dos traficantes é o publico mais jovem, porque terão um público fiel, já que a droga consumida antes dos 18 anos altera o cérebro, que está em face de desenvolvimento até 23 a 25 anos. Portanto, consumir antes é garantir a construção de um dependente químico no futuro.

Indaga-se: Porque o consumo aumentou tanto, se droga sempre existiu e nunca tivemos uma epidemia de doenças resultantes? O Relatório Mundial sobre drogas de 2017, da ONU, e divulgado no dia 26 de junho, dia internacional contra o abuso e o tráfico ilícito de drogas, anuncia que o consumo aumentou. Constatou que em 2015 cerca de 250 milhões de pessoas usavam drogas e 29,5 milhões apresentaram transtornos relacionados ao consumo, incluindo a dependência.

A quem interessa o avanço desse quadro? Com certeza a quem ganha muito dinheiro com isso às custas de vidas humanas, grande parte ceifadas muito jovens e no rastro vão as famílias. Necessário cuidado e atenção de todos, necessário envolvimento verdadeiro e efetivo das autoridades para o enfrentamento da drogadição, com conhecimento de causa, conhecimento da legislação que não manda prender usuário ou dependente químico pelo uso próprio, os operadores de direito também devem ser melhor capacitados e os gestores públicos devem entender, de fato, da temática da drogadição.

Para tudo é preciso ação e comprometimento. “Ser feliz não é ter uma vida perfeita, mas deixar de ser vítima dos problemas e se tornar o autor da própria história”, como já disse Abraham Lincoln.

Diana de Lima e Silva é advogada e jornalista, Presidente do Conselho Estadual de Políticas Públicas sobre Drogas – CONESD/PR, em seu discurso de abertura na Semana Previda – Semana Estadual de Prevenção ao Uso Indevido de Drogas Lícitas e Ilícitas (de 26 a 30/06/2017).
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