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O deputado Daniel Silveira e o presidente Jair Bolsonaro
O deputado Daniel Silveira e o presidente Jair Bolsonaro| Foto: Fotográfo/Agência Brasil

No último dia 29 de abril, os professores universitários Adilson Abreu Dallari, Dircêo Torrecillas Ramos, Fernando Azevedo Fantauzzi, Ivan Sartori, Janaína Conceição Paschoal, Mariane Andreia Cardoso dos Santos, Modesto Carvalhosa, Samantha Ribeiro Meyer-Pflug Marques, Sérgio de Azevedo Redó e eu nos reunimos em meu escritório para examinar a constitucionalidade ou não do decreto presidencial que concedeu indulto (graça) ao deputado federal Daniel Silveira. Depois de três horas de debate chegamos, por unanimidade, à conclusão de que seria constitucional, tendo emitido uma breve nota, veiculada de imediato pela imprensa, na qual analisamos o ato do presidente, exclusivamente do ponto de vista da Carta da República.

Prevaleceu a tese de que o indulto como atribuição privativa do presidente (artigo 84, inciso XII) tem limite apenas na própria Lei Suprema, em seu artigo 5.º, inciso XLIII, que impede sua concessão a condenados pela prática da tortura, do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, do terrorismo e daqueles definidos como crimes hediondos. À ocasião, escrevemos:

“Em razão das discussões acerca da constitucionalidade do decreto do presidente da República que concedeu indulto (graça) ao deputado federal Daniel Silveira, os professores de Direito abaixo relacionados reuniram-se e examinaram o decreto, sem qualquer radicalismo ou viés político, até com o fim de auxiliar a busca da pacificação social e declaram, sob uma perspectiva estritamente jurídica, que o indulto individual ou graça constitui ato soberano do presidente da República, explicitado em sua competência privativa, insculpida no art. 84, inc. XII, combinado com o art. 5, inc. XLIII, da Constituição Federal de 1988.

A graça é instituto clássico no ordenamento jurídico brasileiro, previsto desde a Constituição de 1824. Trata-se de ato de clemência, de que o chefe do Poder Executivo pode lançar mão, em observância ao princípio da separação dos poderes, por meio do sistema de freios e contrapesos.”

Afastamos, durante os debates, a análise da exorbitância da pena superior a oito anos, que evitaria regime aberto, e de outros aspectos da legislação infraconstitucional, pois seria interpretar a Constituição à luz da legislação ordinária. É bem verdade que razoáveis argumentos militavam contra a condenação de manifestação política por meio apenas de palavras pela suprema corte que, por sua vez, em vez de estar sujeita à Lei Maior, levou em consideração a Lei de Segurança Nacional.

Ocorre que a legislação infraconstitucional (no caso, a Lei de Segurança Nacional) interpreta-se à luz da Constituição e não o contrário, até porque o artigo 53 da Lei Maior declara taxativamente que o parlamentar é inviolável por ”quaisquer palavras”, sem nenhuma exceção. Ainda assim, o Pretório Excelso adotou uma limitação que, embora prevista na Lei de Segurança Nacional, não consta na Carta Magna.

Da mesma forma que o Poder Judiciário tem o poder de condenar, mesmo que o faça abusivamente, por ser um intérprete da Lei Maior, o presidente tem o poder sem restrição de indultar, vale dizer, perdoar a pena de alguém condenado pela Justiça. E este ato é de sua competência privativa, absoluta e soberana. Sem restrição, fora a hipótese do artigo 5.º, inciso XLIII, e insuscetível de ser revisto.

Temos de fazer duas ressalvas importantes. A primeira é a de que nenhum dos dez juristas presentes endossou as palavras do deputado Daniel Silveira, que, na opinião de todos, deveria ter sido punido pela Câmara dos Deputados por falta de decoro parlamentar. E, em segundo lugar, como a nota foi escrita antes da nova imposição de pena pelo STF, por força do mesmo processo, a meu ver, por ser pena de natureza criminal, comporta mera extensão do indulto já concedido ou novo indulto.

Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de S.Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1.ª Região, presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomércio-SP e ex-presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

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