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Entra em vigor hoje, 1.º de julho de 2007, a Lei Geral da Micro e da Pequena Empresa, uma das mais importantes que já se fez no Brasil. Antes de qualquer coisa, a nova lei é uma promessa de libertação para os mais de 5 milhões de empresários e quase 10 milhões de empreendedores em geral que existem no país. Digo que é uma promessa pois as leis nunca – ou quase nunca – têm nelas mesmas a capacidade de promover modificações dramáticas apenas por existirem; a Lei Áurea original, a de 1888, que "libertou os escravos", é uma prova amarga dessa afirmação. Mas a simples existência de um arcabouço jurídico próprio para proteger e estimular a atividade dos pequenos empresários já tem um valor, tanto simbólico como prático, incalculável.

O pequeno empresário brasileiro é, tal qual o sertanejo de Euclides da Cunha, acima de tudo um forte. Só um forte é capaz de perseverar na disposição de abrir um pequeno negócio quando sabe que será obrigado a perambular de uma burocracia pública para outra, de Herodes para Pilatos, juntando dezenas de documentos que lhe consumirão, em média, 75 dias apenas para ter o direito de nascer. Só um forte se dispõe a empreender em um país que, mesmo com os avanços trazidos pelo Simples, e agora pelo Supersimples, o fará trabalhar mais de 120 dias por ano apenas para permanecer quites com as obrigações fiscais, parafiscais e previdenciárias.

Em um país em que o grande capitalismo sempre foi alvo de proteção aberta ou disfarçada dos governantes, pode-se dizer que as pequenas e as microempresas brasileiras, que representam mais de 99% do total e empregam mais de 55% da mão-de-obra, atuam em uma verdadeira economia de mercado, darwinista, inclemente, na qual só sobrevivem os mais aptos e os mais adaptáveis. Portanto, não é de estranhar que quase 60% dos pequenos empresários fechem as portas antes que sua empresa complete quatro anos de vida. É uma pena que isso aconteça, pois as pequenas e a microempresas têm um papel estratégico que transcende em muito o sonho dos empreendedores. Diversamente do que se pensa, essas empresas não se caracterizam necessariamente pela rusticidade, pela falta de sofisticação tecnológica e criativa. Não são, como muitos pensam, empresinhas de fundo de quintal; ao contrário, as pesquisas mostram que a grande capacidade inovadora e renovadora da economia se concentra nelas. É principalmente nas pequenas e microempresas que se opera aquilo que Joseph Schumpeter chama de "destruição criativa", em que novos produtos, novos processos, novas técnicas e novas idéias estão permanentemente surgindo, "destruindo" os que existiam antes e fazendo a economia avançar. Caso a atividade de pequeno porte seja facilitada, desonerada, apoiada gerencialmente por órgãos como o Sebrae e por uma maior abertura das universidades e centros de pesquisa às questões concretas da produção e da tecnologia, veremos florescer no Brasil uma economia imaginativa, diversificada, múltipla, como a que celebrizou os italianos. A Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas é a carta de alforria para que isso ocorra.

Nos Estados Unidos, a pátria por excelência do grande capitalismo, 40% das empresas que fazem parte do ranking das mais inovadoras são de pequeno porte e 39% dos cientistas e especialistas em tecnologias sofisticadas trabalham em empresas que têm 50 empregados ou menos. A explicação é simples: está mais do que provado que quando uma empresa inovadora começa a crescer, começa também a desenvolver os vícios da burocratização interna e recebe o beijo da morte em sua capacidade de ousar, criar e arriscar. A iniciativa individual cede lugar às decisões colegiadas dos comitês e à repressão das individualidades, a disposição de assumir riscos é substituída pela cautela excessiva e pelo comodismo, a ousadia para mudar continuamente se transforma em complacência e preguiça para enfrentar o desconhecido.

Michael Bloomberg, o magnata das informações eletrônicas a respeito da economia e dos negócios, afugenta esses fantasmas em sua empresa com uma frase inspirada: "Quando alguém vem me contar que esquiou o dia inteiro e não caiu, eu sugiro que ele mude de montanha!". O pequeno empresário é alguém que está sempre mudando de montanha porque quem escolhe os lugares para esquiar não é ele, são seus concorrentes, é o governo, que vive inventando novas maneiras de atrapalhar sua vida, ou um obscuro empresário chinês doido para invadir seu mercado com produtos mais baratos.

Belmiro Valverde Jobim Castor é autor de "Tamanho não é documento: estratégias para a pequena e a microempresa brasileira". www.belmirovalverde.com.br

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