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Ministros de Estado dobram, triplicam seus subsídios com diárias e participações cruzadas em conselhos de estatais

Historicamente, os agentes públicos recebiam seus vencimentos (salários) através de uma parcela fixa (salário-base) e uma parcela variável (abonos, adicionais etc). Essa parcela variável sempre foi um poderoso instrumento de governabilidade. Como regra geral, os governantes optavam por aumentar a parcela variável da remuneração dos agentes públicos e manter a parcela fixa sem reajuste por vários anos. Com isso, conseguiam aumentar os valores recebidos pelo funcionalismo sem se comprometer com o aumento de salário, o que poderia gerar um efeito cascata e afetar o ânimo dos eleitores.

O problema foi que a pressão do funcionalismo por melhores salários jamais arrefeceu e o resultado foi o surgimento de um grande número de rubricas compondo a parcela variável da remuneração, muitas vezes sem um regime jurídico claro, gerando acúmulos e incorporações características de uma casta que no final dos anos 80 veio a ser conhecida como "marajás da República".

No início da década passada, foi instituído no Brasil o regime de subsídio. Por esse regime, o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os ministros de Estado e os secretários estaduais e municipais deixariam de receber a soma entre as parcelas fixa e variável para receber apenas uma parcela única – o subsídio. Juntamente com a instituição do regime de subsídio, foi instituído o teto salarial do funcionalismo. O subsídio do ministro do Supremo Tribunal Federal seria o limite (o teto) para todas as demais carreiras do Estado.

Apesar da necessidade, a remuneração por subsídio e o teto salarial foram rapidamente esquecidos pelas autoridades ordenadoras de despesas das três esferas da Federação e relegados como curiosidade histórica. Trata-se de regime jurídico aplicável a poucas carreiras públicas, entre elas a magistratura federal. Para outras carreiras, a inteligência administrativa conseguiu produzir um híbrido remuneratório: o subsídio, como se fosse a parcela fixa, acrescido de diversas parcelas variáveis, vulgarmente chamados de penduricalhos. Indo além, consagrou-se o entendimento administrativo e jurisprudencial que a soma dos subsídios com os penduricalhos poderia superar o teto salarial. A situação novamente beira o descalabro.

Quando a magistratura federal se uniu para apoiar e saudar a aprovação do regime de subsídio e o teto salarial, estava apoiando e saudando uma conquista do Estado Democrático de Direito, qual seja, a de que os agentes públicos deveriam receber uma parcela salarial única, de modo que todos os contribuintes pudessem efetivamente saber quanto custava cada agente ao poder público, existindo um limite claro para tanto.

A população, no entanto, continua sendo ludibriada. No documento elaborado pela Casa Civil, chamado "Salário de Servidores: Caixa Preta", a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, mostrou à presidenta Dilma que a anarquia remuneratória é regra. Ministros de Estado que dobram, triplicam seus subsídios com diárias e participações cruzadas em conselhos de estatais. Aposentadorias acumuladas indevidamente. Verbas indenizatórias instituídas às dezenas para agentes do Executivo, Legislativo e Judiciário, de auxílio-moradia ao auxílio-combustível, passando até pelo adicional a juízes que realizam audiências na parte da manhã. Some-se a tudo a falta de controle prévio e a demora na censura póstuma.

No calor dos acontecimentos gerados pelo impasse na votação dos projetos de lei que tratam da recomposição monetária dos subsídios dos ministros do STF, a presidente Dilma encarregou a ministra Gleisi de elaborar um projeto de lei a ser enviado pelo Executivo regulamentando o teto salarial. Em muito boa hora, há notícias de que a base desse projeto será o PL n.º 03/2011, apresentado pela senadora Gleisi no início de seu mandato e propondo que ninguém possa receber mais que o teto salarial do serviço público, representado pelo valor nominal do subsídio dos ministros do STF. Será um bem enorme para o país que o regime de subsídios seja transformado em realidade e o teto salarial seja de fato intransponível. Os projetos apresentados vão nessa direção. Caso aprovados, que valham para todos e não apenas para alguns.

Anderson Furlan, doutorando em Ciências Jurídico-Econômicas pela Faculdade de Direito de Lisboa, é juiz federal e presidente da Apajufe.

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