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As pessoas mais velhas têm mais es­­ta tentação, de pensar que sabem mais do que as crianças e os jovens

Gaston Bachelard é um filósofo francês, dono de uma personalidade acolhedora e nada convencional. Nosso interesse por esse autor é devido à importância que atribuía à educação. Uma de suas teses foi a de que uma filosofia científica deve ser essencialmente uma pedagogia científica e chamava a atenção dos pais e dos professores sobre o abuso de seu saber e de seu poder.

Ele dizia num de seus livros, O Raciona­­lismo Aplicado, que frequentemente os pais abusam ainda mais do seu saber do que do seu poder. A onisciência dos pais logo seguida em todos os níveis da instrução pela onisciência dos professores instala um dogmatismo que é a negação da cultura. Pretende se apoiar sobre uma experiência de vida para prever a experiência da vida. Quando atacado pelas loucas experiências da juventude, torna-se profético. Ora, as condições do progresso doravante são tão móveis, que a experiência da vida passada – se é que uma sabedoria pode resumi-la – é quase fatalmente um obstáculo a ultrapassar, desde que se queira dirigir a vida presente.

Considerei precioso esse comentário, tanto para os pais quanto para os professores, porque é muito comum eles pensarem que podem ensinar alguma coisa às crianças e aos jovens com base em sua própria experiência de vida. Esquecemo-nos de que a vida é outra, nós somos diferentes a cada momento, os tempos são outros e, principalmente, cada pessoa tem a sua vida, não existindo comparações possíveis. Essa é a primeira ilusão que nosso autor parece ajudar-nos a reformar.

Se ele pretende ajudar-nos a reformar nossas ilusões, então não admite que possamos destruí-las. Isso é maravilhoso! Minha frase preferida, de autoria de Bachelard, é a seguinte: "O conhecimento científico é sempre a reforma de uma ilusão". Acostumada a trabalhar a vida in­­teira com o conhecimento enquanto ob­­jeto do trabalho pedagógico, lutando para transformar o conhecimento sistematizado nos livros e outros produtos culturais em um processo carregado de vida, deparei-me muito cedo com o aspecto emocional da aprendizagem e com o mundo das ilusões.

Gostei de fazer assim o meu trabalho. A onisciência de que falava meu amigo parecia insuportável. Onisciente é o que tudo sabe ou o que pensa que tudo sabe, porque é claro que isso não existe. As pessoas mais velhas têm mais esta tentação, de pensar que sabem mais do que as crianças e os jovens.

E sabem mesmo, somente pelo tempo que tiveram a mais e somente se esse tempo foi de aprendizagem, daquela aprendizagem que transforma conhecimento em pensamento e este em sabedoria, o que não é muito comum. Além dis­­so, tudo o que sabemos não é profético, quer dizer, não serve como uma profecia para a vida dos outros, por mais que possamos amar esses outros, sejam nossos filhos e nossos alunos.

A atitude da humildade é fundamental no amor. Permite-nos ouvir e sentir o outro, em vez de impor a ele nossas crenças, sentimentos, pensamentos e valores.

Lilian Anna Bendhack Wachowicz, pós-doutora em Educação, é professora.

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