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Na semana passada, o Programa das Nações Unidas para o Desenvol­­vi­­mento (Pnud) realizou um encontro no Cairo, capital do Egito, para discutir a importância das Políticas de Transferência de Renda – iniciadas em 1995, em Brasília, com a Bolsa-Escola e transformadas em Bolsa Família em 2004 –, na redução da pobreza no mundo. O encontro contou com a participação de representares do Pnud de 56 países. Durante o encontro, a ex-primeira-ministra da Nova Zelândia, atual administradora do Pnud, Helen Clark, disse uma frase surpreendente: "A África é um continente rico". Surpreendente mas correta, ao afirmar que a riqueza de um povo está na sua população.

Para Clark, o desafio de abolir a pobreza está na mobilização da população para produzir os bens de que os pobres necessitam. O caminho para essa mobilização está na transferência de renda para que os pobres sejam mobilizados a produzir aquilo de que precisam, criando a partir daí o excedente que caracteriza a riqueza no sentido tradicional.

Essa lógica vem sendo chamada de "pós-keynesianismo produtivo", cujo instrumento mais conhecido é a Bolsa-Escola: a mãe recebe para participar da produção da educação de seus filhos.

Quando a pobreza é tratada como falta de renda, o número de pessoas é visto como redutor da renda per capita, e não como indutor de produção. Com sua frase, a senhora Clark apresentou uma nova visão. Primeiro porque, se estiver produzindo, o pobre vira riqueza; segundo, porque afirmou que pobreza não é uma questão de renda, mas sim de oferta de bens e serviços.

No keynesianismo tradicional dos países ricos, os governos trans­­ferem renda para a população desempregada apenas para criar demanda e, com isso, dinamizar a economia, sem necessidade de produzir os bens públicos que atendem a população. Diferen­­temente, as Transferências Condicionadas de Renda geram um produto que aumenta a oferta dos bens e serviços de que os pobres necessitam. Transformam mão de obra ociosa em ativa, ampliam a oferta e transformam necessidade em demanda.

A Bolsa-Escola garantia renda criando uma Rede de Proteção So­­cial (RPS) e, ao mesmo tempo, colocava as crianças na escola, servindo de Escada de Ascensão Social (EAS). Esse também é o propósito da Bolsa-Família. O livro "A Segunda Abolição", publicado pela editora Paz e Terra em 1999, que foi distribuído no Cairo em sua versão em In­­glês, apresenta outros programas, muitos deles implantados no Dis­­trito Federal entre 1995 e 1998, tais como o emprego de mão de obra desempregada para produzir o que melhora as condições de vida da população pobre. Hoje é preciso acrescentar emprego para o plantio de árvores, enfrentando assim o problema ecológico.

Em resumo, é necessário que a transferência de renda seja condicionada ao trabalho do beneficiado, produzindo aquilo de que ele precisa. Sem isso, o recurso que ele representa continua inativo.

Além de produtivo, o novo keynesianismo é social e ecológico, e precisa ter responsabilidade fiscal. O financiamento das transferências deve ser feito com redução de gastos supérfluos do Estado, estancamento da corrupção e garantia de equilíbrio fiscal. Ao mesmo tempo, elas devem ser feitas democraticamente, o que exige a combinação dos recursos disponíveis com o tempo possível para a execução do programa. Quanto mais vontade social de fazer a transferência, menos tempo será necessário ao combate à pobreza.

O mais importante é a concepção levantada por Helen Clark de que a riqueza está nas pessoas: você é a riqueza.

Cristovam Buarque é senador (PDT/DF) e professor da UnB

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