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As manchetes alarmantes em jornais e emissoras de rádio e televisão de todo o país têm anunciado os mais violentos atentados contra a segurança pública e as forças policiais de São Paulo, com gravíssimos reflexos no cotidiano das pessoas.

Os criminosos bombardearam e metralharam bases e carros da polícia e até postos do Corpo de Bombeiros e da Polícia Rodoviária. Pelo menos 10 ônibus foram incendiados em vários locais do estado. A revolução civil em miniatura foi deflagrada pela organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) a partir da sexta-feira negra e se ampliou em motins no interior de presídios paulistas, do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraná, Pernambuco e Alagoas.

A crônica de uma tragédia anunciada expõe detalhes sangrentos que o país está vendo, ouvindo e sentindo através do grito desesperado das vítimas sobreviventes, das manifestações revoltadas dos cidadãos e – lamentavelmente – dos discursos enganosos de muitas autoridades que agora prometem agir quando durante anos produziram os frutos da violência e da insegurança pela semeadura da omissão.

Não é possível fugir de uma equação simples e deplorável: o crime organizado se alimenta da desorganização do Estado. A audácia e o triunfo daquele é conseqüência lógica da indiferença e da corrupção deste. Há vasos comunicantes entre esses dois mundos, tão fortes e permanentes que no Rio de Janeiro e São Paulo, de tempos em tempos, a comunidade de delinqüentes, com seus vários departamentos, compõem um estado paralelo ao interditar ruas, estabelecimentos comerciais, escolas e impor regras de conduta às pessoas de bem. Não foi assim, por exemplo, com a ECO 92 quando um acordo entre o Estado e os chefes de comandos criminosos "permitiu" a paz na Cidade Maravilhosa e a segurança de ilustres convidados estrangeiros?

Em março do corrente ano, o secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, Marcelo Itagiba, com a experiência também adquirida na superintendência da Polícia Federal, sustentou em artigo publicado na Folha de São Paulo que somente com a elevação da pasta – hoje Secretaria Nacional de Segurança Pública, subordinada ao Ministério da Justiça – ao patamar de ministério será possível implementar uma política nacional de segurança coletiva. Assim haveria recursos e agilidade administrativa do poder Executivo Federal e sinergia política. A proposta de Marcelo Itagiba é concreta e eficiente ao salientar que os estados e os municípios não têm condições, isoladamente, de planejar e executar uma política de segurança pública que enfrente a criminalidade organizada, os surtos de violência e as infrações do cotidiano. Tendo em vista que a União concentra quase 70% da arrecadação nacional, o Poder Executivo precisa propor a criação do Ministério da Segurança Pública. A pasta ficaria responsável por administrar os repasses das verbas do Fundo Nacional de Segurança Pública para os estados e fiscalizaria, com a aprovação da emenda constitucional proposta, a aplicação compulsória dos recursos públicos na área de segurança.

Antes do anúncio das medidas para o futuro é preciso admitir que o governo federal não adotou políticas criminais e penitenciárias adequadas para prevenir a crise que hoje ganhou repercussão internacional.

Na falta dessa prestação de contas, a sociedade ficará sem rumo, à mercê não somente do crime organizado mas também de medidas demagógicas e enganosas.

Uma legislação de pânico, agora prometida sob os holofotes da mídia, não irá recuperar a omissão de governantes e parlamentares que fazem do discurso político a máscara para esconder a prevaricação, a corrupção e outros males que pervertem a autoridade, esvaziam as leis e atormentam os cidadãos.

"Lutar" contra o crime organizado sem recursos humanos e materiais, sem armas, investimentos e inteligência, é o mesmo que enfrentar a seleção do Parreira com um time de fim de semana. (Segue.)

René Ariel Dotti é advogado e professor universitário. Foi presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, órgão do Ministério da Justiça.

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