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Com a abertura, pelo Conselho de Ética, do processo por quebra de decoro parlamentar, o galante senador Renan Calheiros, presidente do Senado, não poderá renunciar ao mandato para escapar do risco da cassação com a perda dos direitos políticos por oito anos.

Fecha-se a última porta para a saída com um mínimo de compostura de um dos episódios, ainda inconcluso, dos mais humilhantes da nossa crônica parlamentar – um recorde a mais para a coleção presidencial dos maiores de todos os tempos.

É inacreditável a insensibilidade moral dos principais personagens da tragicomédia de pastelão que distrai a platéia e engulha os que não relaxam para gozar a pândega licenciosa.

A começar pelo ator principal. O senador Renan Calheiros, flor do buquê do PMDB de Alagoas, é advogado, com longa militância política desde o mandato de deputado estadual na legislatura de 1979–1983; deputado federal, senador, ministro, líder, com a bagagem e a experiência que torna incompreensível a cegueira e a incompetência com que vem se conduzindo na crise que acena com o corte da ambiciosa ascensão.

Desde que estourou há mais de um mês a denúncia do seu caso amoroso com a jornalista Mônica Veloso, que já festejou o terceiro aniversário e do qual gerou a filha de três anos, que se expôs a impossibilidade da sua permanência como presidente do Senado.

Não se trata da impostura de falsos melindres. Há um limite na flexibilidade dos frouxos costumes sociais. Certamente que não era segredo para a bisbilhotice brasiliense a sua ligação com a repórter. Até aí dava para tapar os olhos e fingir a cegueira. O escândalo engrossou, invadiu o noticiário com as investigações pela Polícia Federal da denúncia que o senador pagava a pensão mensal de R$ 12 mil à mãe de sua filha com recursos do lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior.

A repercussão na imprensa, na sociedade, repicou no Congresso com o mais baixo índice de confiança popular e empurrou o Senado a avançar na rota sinuosa das medidas parlamentares.

Enquanto parecia possível dar um jeito para inocentar o presidente do Senado, os aliados armaram o roteiro de fuga com todos os alçapões escancarados. Para presidir o Conselho de Ética, depois de várias manigâncias, foi laçado o senador Sibá Machado, do PT do Acre, suplente da ministra Marina Silva – um ilustre desconhecido dispensado do receio de desagradar o eleitorado, pois nunca teve um voto.

No bailarico da indicação do relator com a certeza do parecer pela absolvição, o comitê da patuscada pescou o senador Epitácio Cafeteira do PTB do Maranhão, um veterano disciplinado que deu conta do recado num piscar de olhos: recomendou o arquivamento da papelada e sumiu. Para substituí-lo na emergência, outro senador de curiosa estampa e longas madeixas, Wellington Salgado, do PMDB de Minas, suplente do ministro Hélio Costa, das Comunicações, e que durou menos do que uma flor: renunciou batendo o pé por não concordar com o adiamento da votação.

Fim do primeiro ato, arruma-se o cenário para o prosseguimento do espetáculo. Em inesperada cambalhota, o presidente do Conselho de Ética, senador Sibá Machado, designou uma comissão para elaborar novo cronograma de trabalho enquanto ganha tempo para que a Polícia Federal conclua o exame do encaroçado pacote de documentos apresentados pelo senador Renan Calheiros, com mais buracos do que sapato de mendigo.

Antes de correr o pano, o senador Renan Calheiros será convidado a apresentar a sua defesa. E as prováveis despedidas, com a renúncia do mandato, entregando os anéis para salvar os dedos na disputa de novo mandato nas próximas eleições.

O Senado igualou-se à Câmara na crise moral do Congresso.

VILLAS-BÔAS CORRÊA é analista político.

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