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Decorrido mais de um ano desde a deflagração da retomada, a base de produção americana ainda opera de maneira anêmica, bastante aquém dos patamares apurados antes da crise

Passados mais de dois anos desde a concreta sinalização de deflagração de um quadro de grave instabilidade financeira em escala planetária, retratada na falência da instituição de investimentos norte-americana Lehman Brothers, um balanço sintético permite a identificação de passivos e ativos econômicos.

Essencialmente, observou-se um mergulho recessivo, acompanhado por ajustes e reações isoladas ou coordenadas e pela conformação de processos de saídas do fundo do poço e recuperações, de maior ou menor intensidade, nas diferentes nações, conforme o grau de envolvimento com a paralisação dos fluxos de crédito e de comércio ou com a produção de fundamentos macroeconômicos, nas duas décadas antecedentes.

Em um primeiro momento, os meios especializados apostavam no contágio ampliado dos países emergentes, de forma semelhante às turbulências fiscais e cambiais que acometeram a periferia capitalista, especificamente México, Ásia, Rússia, Brasil e Argentina entre 1994 e 1999. Todavia, a estratégia de acumulação de reservas internacionais, adotada por esses mercados durante a fase virtuosa do ciclo mundial, entre 2002 e 2007, permitiu a formação de colchões de liquidez em moeda forte.

Com isso, aquelas nações puderam abrandar os desdobramentos negativos do tsunami financeiro e comercial que atingiu o núcleo dinâmico do sistema e contribuir para o esboço de uma reanimação mais encorpada, ainda que localizada. Inclusive, tal episódio oportunizou a restauração da tese de crescimento disforme e descolado da economia mundial, capitaneado pelos emergentes, defendida pelo banco Goldman Sachs.

A respeito da economia dos Estados Unidos (EUA), o NBER (The National Bureau of Economic Research), Departamento Nacional de Pesquisa Econômica, por meio do Business Cycle Dating Comité, ou Comitê de Datação de Ciclos, definiu o mês de julho de 2009, como o marco do fim da recessão, iniciada em dezembro de 2007 e associada aos efeitos da hecatombe financeira, provocada pela insolvência do mercado hipotecário norte-americano de segunda linha, e o começo da reativação da produção e dos negócios.

Na verdade, tratou-se da contração econômica mais longa (um ano e meio) e acentuada vivida pelo país, desde a Grande Depressão verificada entre agosto de 1929 e março de 1933 (43 meses). Mais que isso, a baixa suplantou os 16 meses da retração constatada entre novembro de 1973 e março de 1975, efeito do primeiro choque do petróleo, e os outros 16 meses do recuo experimentado entre junho de 1981 e novembro de 1982, em resposta ao salto das cotações do óleo e dos juros e na dívida externa das nações do terceiro mundo.

Porém, decorrido mais de um ano desde a deflagração da retomada, a base de produção americana ainda opera de maneira anêmica, bastante aquém dos patamares apurados antes da crise. A condição de fragilidade pode ser comprovada pela perda do embalo expansivo de 5% do quarto trimestre de 2009, reproduzindo o fim do declínio do estoques. Depois disso, o produto interno bruto (PIB) dos EUA variou 3,7%, 1,7% e 2%, no primeiro, segundo e terceiro trimestre de 2010, respectivamente.

A morosidade revelada tanto na saída da turbulência quanto na recuperação deriva das características distintas dos episódios de crise e das medidas de superação aplicadas atualmente, quando cotejadas com as prevalecentes no passado, ligadas, fundamentalmente, à calibragem da curva de produção às expectativas de inflação. Já o estágio de instabilidade acontecido entre 2007 e 2009 possui raízes na avaliação equivocada dos riscos pelos agentes privados, materializada em excesso de endividamento das famílias e inflação de ativos, cujo estouro provocou a conjugação entre enormes prejuízos patrimoniais e default de instituições financeiras de grande porte.

Nesse particular, como a diminuição dos juros não provocou consistente reação dos níveis de atividades, o governo utilizou a política fiscal como válvula de escape, buscando elevar o consumo privado, inclusive com subsídio tributário especial para a aquisição do primeiro imóvel. Mas o pronunciado endividamento pretérito e o aumento do desemprego despertaram para a necessidade de impulsão dos níveis de poupança.

Gilmar Mendes Lourenço, economista, é diretor-presidente do Ipardes e coordenador do Curso de Economia da FAE.

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