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A evidente consolidação do ciclo recessivo na economia brasileira que, na melhor das hipóteses, deve perdurar até o fim de 2016, tem levado as autoridades de Brasília e parcela expressiva dos meios especializados a anunciar, a partir da obtenção de saldos comerciais superiores a US$ 10 bilhões no intervalo de tempo compreendido entre janeiro e setembro de 2015, o surgimento de um novo esforço exportador. Ele representaria uma espécie de amortecedor, ou até válvula de escape, à contração dos negócios no front doméstico.

Sem querer desarmar esperanças e espíritos otimistas, é preciso esclarecer que a recente recuperação dos resultados positivos do comércio exterior do país decorre, essencialmente, do declínio mais acentuado do valor das importações diante do registrado pelas exportações (-22,6% contra -16,3%), por causa da pronunciada e generalizada retração dos níveis de atividade.

De fato, o poder de competição das vendas externas brasileiras trilha uma rota cadente, em destinos que se tornaram mais exigentes, seletivos e protecionistas, em um estágio de lenta superação da crise eclodida em 2008 nos Estados Unidos, com direito a um segundo turno na periferia europeia, entre 2010 e 2013. Isso foi agravado pela acentuada desaceleração do ritmo de expansão da economia chinesa, e a subsequente queda dos preços das matérias primas. Não por acaso, com exceção do agronegócio, o Brasil é um zero à esquerda no comércio mundial, respondendo por 1,3% das cifras comercializadas, praticamente a mesma participação observada três décadas atrás.

Com exceção do agronegócio, o Brasil é um zero à esquerda no comércio mundial

Ao adotar uma estratégia baseada no estímulo ao consumo interno desenfreado, movido prioritariamente a crédito caro, e na celebração de parcerias comerciais com nações irrelevantes nas cadeias planetárias de valor, agudizada pelo populismo cambial exigido pelo combate à inflação, a administração pós-2002 eliminou as chances de presença encorpada das empresas e produtos brasileiros nas trocas comerciais mundiais.

Mais que isso: desde 2003, a orientação econômica vem, de maneira intransigente, negando a necessidade de organização de incentivos perenes, absolutamente imprescindíveis a uma escalada exportadora, imaginando que a restauração de extraordinários desempenhos das vendas internacionais depende de retórica, torcida e sorte.

Ainda preso às lembranças do passado como “herança maldita”, o Executivo federal se recusa a enxergar que as duas grandes impulsões do comércio externo nacional, acontecidas entre 1983 e 1985 e 2003 e 2011, exigiram a deflagração de um conjunto articulado de mecanismos de incentivo às exportações, incluindo desvalorizações no câmbio.

O primeiro salto contou com o apoio da derradeira plataforma do modelo de substituição de importações, ou da maturação plena do bloco de investimentos em infraestrutura, insumos básicos e bens de capital, contido no II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), implantando pelo presidente Geisel, no interregno 1974-1979.

Já a segunda onda foi favorecida pelo boom do preço das commodities, precipitado com o ingresso da China na Organização Mundial do Comércio (OMC), pela colheita da safra de mudanças institucionais (abertura comercial e desinflação, principalmente) plantada na década de 1990, e pela instituição do câmbio flutuante, a partir de janeiro de 1999.

Considerando que, naqueles dois interregnos, havia clara inclinação oficial à inserção brasileira nas transações globais, parece oportuno especular a respeito da catapulta para 2015.

Gilmar Mendes Lourenço, economista, é professor da FAE Business School.
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