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O verdadeiro caminho da paz não está apenas na organização política do espaço urbano, não está apenas no sucesso profissional pessoal; está sim no fortalecimento da sensação de felicidade do social, na interface do ser de uma pessoa com a outra

Nunca se falou tanto em paz quanto neste momento. Hoje, o desejo pela paz se explica pela própria presença do medo do assalto, medo da morte, medo da droga, medo do trânsito etc. Vive-se um momento de grandes transformações sociais, do modelo familiar ao crescimento exagerado da urbanização. Tudo isso desencadeia mudanças repentinas de padrões culturais especialmente no que se refere a regras sociais, fazendo com que a noção e a adoção de limites se tornem questionados e relativizados. As novas gerações, as mais vulneráveis aos conflitos familiares e sociais, apresentam-se perdidas, sem parâmetros.

Como superar esse ambiente de conflito e assim encontrar os caminhos da paz? Alguns aspectos complicam ainda mais essa caminhada. O primeiro está relacionado à própria falta de clareza de qual paz se busca. O advento da sociedade moderna trouxe significativas conquistas, uma delas, a consciência do direito do cidadão diante do Estado. Isso traduz sim uma conquista, mas, neste caso, a paz passa a ser entendida como um direito do indivíduo perante o Estado, quando, na realidade, a busca da paz é algo mais complexo.

O segundo complicador, também produzido pelo advento da sociedade moderna, diz respeito ao afloramento da privacidade e da individualidade, fortalecida ainda mais pelo modelo social urbano, fazendo com que se viva em um ambiente congestionado de indivíduos solitários e muitas vezes infelizes. Assim, criou-se o pressuposto de que o comportamento solidário na busca de saber da vida da outra pessoa não é entendido como um bom modo de socialização.

O terceiro aspecto, as próprias más notícias de assaltos, mortes, separações conjugais, abandonos infantis, conflitos no trânsito, conflitos de trabalho etc., que a cada momento nos invadem o pensar, fazem com que a reflexão sobre a paz fique restrita à notícia da não-paz.

Portanto o verdadeiro caminho da paz não está apenas na organização política do espaço urbano, não está apenas no sucesso profissional pessoal, está sim no fortalecimento da sensação de felicidade do social, na interface do ser de uma pessoa com a outra, na conjugação das relações sociais, no ambiente de solidariedade como um todo. O ambiente de paz se conquista não apenas fazendo a "minha parte", mas me preocupando com a parte da outra pessoa, com a consciência de que a construção da minha felicidade depende da felicidade dos outros. A conquista da paz não pode ser entendida simplesmente como um direito individual ante o Estado. A paz é algo que se constrói coletivamente.

Para a conquista da paz neste momento, alguns caminhos se apresentam. O primeiro diz respeito a se criar um ambiente social de paz. É preciso salientar que essa experiência é algo que já está sendo feito por muitas cidades no Paraná. São experiências com as quais busca-se construir uma cultura de paz através de discussões, debates e manifestações públicas, envolvendo a sociedade civil como um todo, o poder político, a iniciativa privada etc. Torna-se importante promover discussões especialmente nas escolas e nas universidades sobre os conflitos sociais que afloram na sociedade atual na perspectiva da busca de suas soluções e assim a conquista da paz.

Também é necessário criar nas novas gerações o senso da solidariedade e do respeito às pessoas independentemente da cor, credo religioso, condições físicas e preferências sexuais. Mas essa mobilização coletiva somente terá efeito real quando se quebrar o gesso da cultura do individualismo, do despertar de que a presença da paz depende antes de tudo do agir do dia a dia de cada pessoa, e que este agir pode contribuir com o advento do ambiente social da paz.

É preciso perceber que as ações individuais produzem efeito de teias coletivas. Assim, uma pequena ação, como o cumprimento, a busca do dialogar e do ser solidário, pode reproduzir comportamentos similares. Esse é o verdadeiro caminho da paz.

Lindomar Wessler Boneti é professor de Sociologia da PUCPR.

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