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Para quem está acostumado com os carnavais brasileiros, a semana não carnavalesca foi um prato cheio: a renúncia do papa Bento XVI, a declaração de Obama a respeito de um tratado de livre comércio entre Estados Unidos e União Europeia e, aqui na terrinha, o estrondoso sucesso da carta pública do movimento "Fora Renan!", que superou em poucos dias o número de assinaturas obtido pela iniciativa da Lei da Ficha Limpa. Ou seja, em vez da chatíssima repetição da saga do carnaval baiano, com as peripécias de Daniela, de Ivete, de Gil e de Margareth Menezes no Circuito de Dodô, das dancinhas improvisadas com músicas e letras de grande profundidade como "o rebolation, ooô, o rebolation!", das jornadas épicas das madrinhas de bateria do carnaval carioca, há assunto à vontade para um comentário semanal.

A renúncia do papa é assunto para especialistas e vou esperar para ler e ouvir a opinião de Aroldo Murá, um dos maiores conhecedores da religião e da Igreja, a respeito das motivações e repercussões de um gesto inédito nos últimos sete séculos. Bento XVI teve um breve pontificado, sempre sob a sombra do grande papa João Paulo II, que o precedeu. Onde João de Deus esbanjava vitalidade e carisma, encantando os fiéis e confundindo e alarmando os não fiéis, Bento XVI se caracteriza pela sua capacidade intelectual e doutrinária e pela aparente fragilidade física. Vou aguardar opiniões como a do professor Murá.

O aceno de um tratado de livre comércio entre Estados Unidos e União Europeia tem um potencial estratégico colossal e mudará – se e quando concretizado – o equilíbrio estratégico do mundo. Ao fundo, muito mais que ampliar a corrente de comércio e de investimentos entre os dois continentes, trata-se de conter a China, que nos últimos 15 ou 20 anos estabeleceu as bases de uma dominância econômica e de influência capital no mundo exatamente pela miopia do mundo capitalista ocidental, encantado com os baixos custos de produção e o tamanho do mercado interno chinês até descobrir tardiamente que esse sucesso chinês trazia com ele vários acessórios não desprezíveis: US$ 3 trilhões ou US$ 4 trilhões de reservas financeiras, cujo manejo pode abalar e desestabilizar os mercados mundiais; um exército desproporcionalmente grande e bem equipado, especialmente quando se leva em consideração que o Japão só dispõe de uma minúscula força de autodefesa; e uma marinha crescentemente poderosa e cada vez mais disposta a mostrar presença nos mares orientais. Os Estados Unidos já haviam iniciado um redirecionamento de sua força militar para "conter" a China, como se lê crescentemente na imprensa especializada, mas um tratado que leva à consolidação de um superbloco econômico – com US$ 30 trilhões de PIB, facilidades para o desenvolvimento comum de ciência e tecnologia e para a circulação de capitais – é algo totalmente diferente e poderoso.

Resta o "Fora Renan!". De novo, a população dá mostras de que, sob uma capa de aparente apatia, ela tem uma vitalidade política crescente. Resultados práticos? Vamos esperar. Mas daqui para a frente, Renan Calheiros nunca mais poderá se livrar do vexame público de receber uma vaia monumental ou escutar um coro desrespeitoso de "Fora Renan, Fora Renan!" Já é um começo.

A propósito, quando constatei que Collor e Lobão (clone de José Sarney) apoiam vigorosamente Renan, lembrei-me do frei Valentim, meu professor de latim no Colégio Santo Agostinho: Asinus asinum fricat. O asno se coça no asno...

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

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