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Permanece na pauta, bem mais do Congresso Nacional do que da própria sociedade, os temas atinentes à reforma política. Reformar é mais fácil do que construir algo novo, caso se imagine o exemplo de uma casa. Mas também sabemos que reformar a casa com todos os moradores dentro não é nada fácil. Isso talvez explique as dificuldades encontradas no caso da reforma política. Os atuais políticos são quase sempre receosos, para dizer o mínimo, quando se pode apresentar qualquer dificuldade para seu mandato ou para sua possível reeleição.

A política é por demais importante e séria para ficar tão-somente nas mãos dos políticos

Não faz muito, foi aprovada em primeiro turno o fim da reeleição para cargos do Executivo (presidente, governadores e prefeitos). Particularmente, não comungo da tese de que a reeleição é uma das principais causas da corrupção e da tentativa de partidos e políticos buscarem se perpetuar no poder. No Brasil, com problemas graves de desigualdade e de infraestrutura, bem como de educação, 4 anos são insuficientes para se pensar em ações de médio e longo prazo. É possível que esse tema volte à baila dado a conturbada reeleição de Dilma Rousseff, pois já caminhamos para o sexto mês de governo sem que nada de positivo possa ser apresentado à sociedade brasileira. No entanto, não nos esqueçamos de que ela venceu, e que se seu governo é pífio, cabe um aprendizado democrático: votar com mais consciência e não acreditar tanto em propaganda concebida pelos “gênios” do marketing político. Encerrar com a reeleição é, grosso modo, culpar o termômetro pela febre.

Outro tema sensível é o financiamento de campanha: público, privado ou misto. Não há fórmulas mágicas. Ao que tudo indica, é o sistema misto, com parte dos recursos públicos e parte privados (de empresas e de cidadãos) que deve prevalecer. O interessante seria limitar as doações a fim de inibir a força do poder econômico sobre o poder político. Acreditar que isso se encerre de vez é uma quimera. Também quimérico é crer que o financiamento público seja o mais justo.

No tocante à escolha dos deputados, temos o sistema proporcional. Esse sistema é muito criticado quando se vota num candidato celebridade e este acaba transferindo votos e elegendo outros candidatos de seu partido ou de partidos aliados que não seriam eleitos sozinhos. As alternativas são: a) voto distrital, b) voto em lista fechada, c) voto distrital misto e d) distritão. Simplificadamente, o voto distrital trataria, por exemplo, no caso de São Paulo, que tem 70 deputados federais, dividir o estado em 70 distritos, cada distrito elegendo um representante. Em tese, isso aproximaria o eleitor do deputado e baratearia os custos da campanha. Agora, o voto em lista fechada seria um voto numa lista já definida pelos partidos, em que os eleitores estariam escolhendo mais pela ideologia política do partido e menos pelo candidato. As críticas a este modelo vão no sentido de que o eleitor escolheria um desconhecido e este estaria distante do cidadão. A lista fechada daria muito poder aos líderes dos partidos.

O voto distrital misto, por sua vez, traria uma parcela sendo escolhida em parte pelos distritos e a outra em lista fechada. Conjugar-se-ia os benefícios do sistema proporcional e do voto distrital ao se fortalecer os partidos e, ainda, aproximaria os eleitos dos eleitores. Por fim, o chamado distritão seria a eleição dos deputados federais mais votados nominalmente. Tal sistema enseja a crítica de se dar visibilidade a quem já é conhecido e com poder econômico para bancar uma campanha muito cara. Particularmente, ficaria com o voto distrital misto, mas não sem antes pensar numa bem articulada campanha de educação cívica e política.

Outros temas também fazem parte da reforma política: o mandato para o Executivo de cinco anos – no caso do fim da reeleição; a obrigatoriedade ou não do voto; a possibilidade de candidatura avulsa e o recall. No primeiro caso, sou favorável a reeleição com mandatos de quatro anos, limitando o exercício de apenas dois mandatos, contínuos ou alternados. Em relação à obrigatoriedade do voto, penso que em nossa sociedade de frágil cultura política tornar o voto opcional seria complicado. Hoje, infelizmente, não imagino como seria uma eleição com voto facultativo. Já recall nada mais é do que a população poder revogar o mandato de um governante por meio de consulta popular.

Há aqui benefícios e riscos. Um candidato que diz algo e quando eleito faz justamente o contrário poderia ser “convidado” a se retirar e tentar a sorte noutra oportunidade. O risco, ainda numa sociedade de pouca cultura democrática, é se deixar seduzir por um discurso salvacionista ou autoritário, além de se tornar inviável a possibilidade de governabilidade.

Mas a sociedade brasileira está alheia a toda esta discussão. Os políticos, na grande maioria, vão discutir a reforma política e votarão guiados pela conveniência e não pela racionalidade e pelo espírito democrático e republicano. A política é por demais importante e séria para ficar tão-somente nas mãos dos políticos. A sociedade deve estar atenta e todos, indistintamente, devem se envolver nesta discussão.

Rodrigo Augusto Prando, mestre e doutor em Sociologia pela Unesp, é professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
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